A audição no Parlamento Europeu de Maria Luís Albuquerque, nomeada comissária europeia dos Serviços Financeiros e da União da Poupança e dos Investimentos, vai implicar que a antiga ministra das Finanças responda nesta manhã de quarta-feira a perguntas dos eurodeputados da Comissão de Economia, bem como de comissões convidadas, incluindo cinco dos 21 eleitos portugueses. Há uma convicção generalizada de que a portuguesa escolhida para a segunda equipa de Ursula von der Leyen pouco terá a temer e deverá esperar mais perguntas acerca da missão que pretende desempenhar, ao longo dos cinco anos de mandato, do que sobre o seu passado, enquanto secretária de Estado do Tesouro e ministra das Finanças ou a trabalhar para o setor privado..Entre os que lhe farão perguntas está a social-democrata Lídia Pereira, para quem Maria Luís Albuquerque “aporta valor com o seu conhecimento técnico no domínio dos serviços financeiros” numa altura em que a União Europeia enfrenta “múltiplos desafios”. Quanto ao percurso da conselheira nacional do PSD, que junta experiências governativas a trabalho para instituições financeiras, a eurodeputada vê-o enquanto uma mais-valia. “Penso que tem uma vantagem competitiva em relação a outros comissários designados”, diz..Afastado por Lídia Pereira está um cenário de dificuldades na confirmação da escolha de Portugal para a Comissão Europeia. E, admitindo que entre os restantes “há quem tenha algumas fragilidades”, acrescenta que não é certo que sejam “suficientemente gravosas” para implicarem um chumbo. “O Parlamento Europeu quer perceber se os comissários designados estão fit for the job e têm capacidade de desempenhar as funções plasmadas no portfólio indicado pela presidente da Comissão”, conclui..Encarregue de fazer o encerramento da audição por parte do grupo dos Socialistas & Democratas, Francisco Assis diz ao DN que o mais importante a apurar é a “adequação do posicionamento político” de Albuquerque com “as expectativas que resultam do acordo que esteve na base da eleição de Ursula von der Leyen para a presidência da Comissão Europeia”. O eurodeputado socialista espera que a comissária nomeada manifeste “adesão integral” à carta de missão que a alemã enviou ao Parlamento Europeu. Algo que, na pasta dos Serviços Financeiros e União da Poupança e dos Investimentos, implica a captação e promoção de investimento, “que é uma questão vital quando a Europa é uma zona onde há mais poupança do que nos Estados Unidos, mas depois não tem capacidade de transformar esse enorme volume de poupanças em investimento”. As soluções para alterar essa desvantagem, mas também a defesa dos consumidores dos mercados financeiros, “que estão, como se viu nos últimos anos, bastante desprotegidos”, constam dos “temas fundamentais” que Assis antecipa para a audição..Pelo contrário, o eurodeputado socialista conta que o passado de Maria Luís Albuquerque não domine a audição. “Evidentemente que Maria Luís Albuquerque é de centro-direita, e nós somos um partido de centro-esquerda, e obviamente que não nos revemos no seu percurso, nem em muitas das suas ideias”, admite Assis, recordando que a Comissão Europeia “assenta num acordo de fundo entre partidos que têm divergências sérias, mas que convergiram neste acordo”..“Campeã das portas giratórias”.Já Catarina Martins vê Albuquerque como “a campeã das portas giratórias”, sendo claro para a eurodeputada do Bloco de Esquerda, que entre os comissários designados “ninguém girou tanto entre público e privado”. E, fazendo o balanço do percurso da nomeada, é peremptória: “Foi sempre lobista dos serviços financeiros contra o interesse público”..“Basta perguntar aos lesados do Banif, que foram prejudicados porque Maria Luís Albuquerque não fez nada e esperou até ao último momento, enquanto a Arrow ia ganhando com o Banif, e depois foi trabalhar para a Arrow Global. Ou aos portugueses, pois disse que a resolução do Banco Espírito Santo (BES) não iria custar um tostão aos contribuintes, mas vai diretamente em mais de oito mil milhões de euros”, diz Catarina Martins, que, embora suplente na Comissão de Economia, é coordenadora do grupo da Esquerda na audição, devido ao conhecimento que tem da ex-ministra de Passos Coelho..Além de questões relacionadas com o perfil da nomeada, a quem reconhece “conhecimento dos setores público e privado”, ressalvando que “o resultado de conhecer tanto é que foram sempre os contribuintes, os cidadãos e as empresas públicas que ficaram prejudicados”, a bloquista irá expressar preocupação com os planos da Comissão Europeia para a área tutelada pela portuguesa. “Há claramente um projeto de alterar o modelo europeu, que tem sido assente na banca e que, com todos os seus problemas, é mais estável do que o mercado de capitais, mais baseado em serviços financeiros que não a banca, que é mais o modelo americano”, diz Catarina Martins, antecipando um risco: “Nos fundos de pensões, pensamos que, tanto pelas opções da Comissão Europeia como pela comissária indicada e o seu currículo nesta matéria, os pensionistas têm muito a temer.”.Também presente estará o eurodeputado comunista João Oliveira, igualmente do grupo da Esquerda, na qualidade de membro da Comissão de Liberdades. Ao DN, começa por chamar a atenção para uma pasta que vê associada à “política de concentração do setor bancário e financeiro”, a uma “política de privilégio dos grupos financeiros e fundos de investimento pan-europeus e fundos privados de pensões” e à “defesa das políticas que promovem práticas com as quais ficámos escaldados na crise financeira de 2001”, como a titularização de ativos “que conduziu à crise do subprime”..Vendo as prioridades da nova Comissão Europeia e as opções de Maria Luís Albuquerque no Ministério das Finanças, João Oliveira diz que se “juntam ingredientes cuja combinação é particularmente explosiva”, fazendo desta audição “uma das mais relevantes” no Parlamento Europeu. Até por ser preciso esclarecer “como é que alguém que teve a responsabilidade de ser ministra das Finanças, e lidar com o escândalo do BES, vai sustentar políticas que deram o resultado que deram em Portugal”..Ao contrário dos eleitos da Iniciativa Liberal, que não intervirão na audição, por não terem assento nas comissões responsáveis - embora João Cotrim de Figueiredo vá assistir aos trabalhos - também Tânger Corrêa, do Chega, irá fazer perguntas a Maria Luís Albuquerque. No entanto, não quis antecipar ao DN o que conta ver esclarecido pela comissária europeia nomeada.