Isto era para ser uma visita mas nós vamos fazer o Macbeth, ok?
Inês Barahona e Miguel Fragata foram convidados pelo diretor do Teatro Nacional D. Maria II, Tiago Rodrigues, a criar uma visita encenada àquele teatro que está prestes a comemorar os 170 anos. Mas eles não gostam de visitas guiadas. O que queriam mesmo era fazer o Macbeth, de Shakespeare, e fazê-lo na sala principal, a Sala Garrett, com um grande elenco e tudo a que têm direito. "Faríamos o melhor Macbeth que já alguma vez foi feito." Mas como tal não é possível, Inês e Miguel lá aceitam fazer a visita guiada mas... apenas como fachada. "Vamos fazer o Macbeth quer eles queiram, quer não." E é aqui que a aventura começa.
Em vez da peça escocesa temos A Visita Escocesa. A história não aconteceu exatamente como descrita no parágrafo anterior, mas quase. A verdade é que Inês Barahona e Miguel Fragata, habituados a criar espetáculos para os mais novos, foram de facto convidados para encenar uma visita guiada ao teatro mas, como não são muito fãs do formato, decidiram criar algo diferente. Este é um espetáculo para escolas e para famílias (aos domingos) que é, ao mesmo tempo, uma visita guiada às entranhas do Teatro Nacional e uma encenação muito divertida do Macbeth.
Uma visita guiada
Antes de se meterem nesta empreitada Inês e Miguel fizeram as duas outras visitas que já existem ao teatro - uma com um guia turístico e que acontece todas as segundas-feiras às 11.00 e outra que é uma visita técnica e que só é feita por marcação. "Gostámos das duas, mas adorámos esta que é feita pela equipa do teatro, nas suas várias áreas, a explicar-nos como isto tudo funciona. Foi fantástica."
A partir daqui, pensaram como poderiam criar uma narrativa para uma visita guiada que fosse diferente das outras e facilmente chegaram ao Macbeth - afinal esta era a peça que estava em cena no Nacional quando, em 1964, um brutal incêndio destruiu quase todo o teatro. "E juntámos-lhe esta verdade ficcionada: fomos convidados para fazer uma visita guiada e nós não gostamos de visitas guiadas, por isso vamos fazer o Macbeth às escondidas da direção do teatro", explica Miguel Fragata.
"Lemos muitas vezes o Macbeth para encontrar as cenas estruturantes para contar a história, mas também o espaço ideal para cada cena e que ligação à história do teatro é que podemos encontrar." Do átrio à sala principal, do Salão Nobre ao sótão, passando por escadas grandes e pequenas, bastidores e camarins, a visita vai ser orientada por duas jovens guias vestidas como verdadeiras escocesas e que têm como missão ir contando o Macbeth às escondidas do vigilante, que aparece de surpresa e com cara de mau a dizer "Não brinquem com o fogo."
Uma tragédia sangrenta
Aqui não se brinca com o fogo. Estamos num teatro e nos teatros não se pode dizer a palavra Macbeth, a não ser que se esteja a representar essa peça. Esta é uma peça sangrenta, uma "história de traição, poder e cabeças cortadas".
Para fazer Macbeth, as duas guias vão usar aquilo que têm à mão. Por exemplo, os objetos que têm dentro da sua mala: um canivete a fazer de Macbeth, um tampão será Lady Macbeth, uma romã fará as vezes do rei, a carteira, os óculos, o telemóvel e os comprimidos para a alergia a serem as outras personagens todas. Mas à medida que a história se vai desenrolando e que a visita avança pelos bastidores, coisas estranhas começam a acontecer. Cabeças cortadas aparecem nas esquinas. Sangue a escorrer por uma porta. Será que há mesmo uma maldição? Em fila indiana, por espaços menos iluminados, é provável que haja sustos e alguns gritos entre os visitantes, quase como se estivéssemos num comboio fantasma.
"O objetivo era tentar passar a história e alguns facto sobre o teatro, mas sobretudo tentar criar uma relação emocional entre o público e este espaço, que também pode ser muito austero para quem visita pela primeira vez e sente o peso dos dourados e das alcatifas", explica Miguel Fragata. "A linguagem teatral vai aparecendo, explica-se o que faz o encenador, mostra-se o jogo teatral com aquele punhal falso, vemos o ator a vestir-se no camarim. Vamos levantando o kilt sobre alguns assuntos. Mas sem ser uma aula."