"Vivemos uma perseguição ao nível das perseguições étnicas"

Almoço com o presidente da <a href="http://anpc.pt/" target="_blank">Associação Nacional de Proprietários Rurais, Gestão Cinegética e Biodiversidade</a> e da Plataforma Sociedade e Animais.
Publicado a
Atualizado a

António Paula Soares chega bem-disposto à soalheira esplanada do Populi, no Terreiro do Paço. O local foi escolhido pela proximidade do Ministério da Administração Interna, onde acaba de ter uma reunião com a secretária de Estado adjunta sobre as alterações que o governo está a preparar à Lei das Armas. Justifica o sorriso por ter conseguido sensibilizar a governante para uma realidade nem sempre muito visível: "Os caçadores não são bandidos ou criminosos."

Há seis anos à frente da Associação Nacional de Proprietários Rurais, Gestão Cinegética e Biodiversidade (ANPC), António lembra que "os caçadores estão legais, atuam perante a lei, mas a imagem que passa é errada". Uma realidade reconhecida pela própria Isabel Oneto, que ainda nesta semana rejeitou que as alterações à Lei das Armas possam resultar nessa adulteração, na associação dos caçadores aos crimes com armas de fogo. "Não há qualquer ligação entre os titulares de licenças de uso e porte de armas e a criminalidade", frisou, demonstrando entusiasmo em "manter e até fomentar a caça". Reconhecendo a "grande relevância económica e tradição cultural" da atividade, uma das medidas que o governo está preparado para tomar é permitir que portugueses ou estrangeiros que aqui venham para caçar não precisem de trazer as suas armas, permitindo-se o seu aluguer junto dos gestores da reserva, por exemplo.

"Há uma corrente antiarmas vinda de Bruxelas; a verdade é que em Portugal não há um problema com as armas de fogo" - nos crimes passionais, são usadas mais frequentemente facas de cozinha ou enxadas.

É por isso que António Paula Soares, que também lidera a Plataforma Sociedade e Animais - que senta à mesma mesa pessoas da caça, da tauromaquia, da agricultura, criadores de cães e de gado, "vertentes urbanas e rurais que percebem que ou defendemos o que gostamos de fazer ou arriscamos ser proibidos de o fazer, com danos graves para o mundo rural" -, está otimista, porque acredita que, embora haja ainda um caminho a percorrer, há também uma sensibilidade diferente.

"A ideia de limitar o número de armas por caçador trouxe alguns receios à associação, mas a proposta de dez carabinas e 15 caçadeiras por caçador é um número que já pode ser aceitável. Estamos a falar de cento e muitas pessoas que têm mais de 25 armas, mas muitas têm problemas patrimoniais, têm armas que foram herdando de familiares e agora podem vir a ter um problema, porque só como colecionador se pode exceder o limite legal, e nesse caso as armas não podem ser usadas na caça", têm de ser desativadas. Seja como for, animam-no as ideias para fomentar o setor cinegético, para potenciar a caça e a fatia de turismo que essa atividade pode engrossar. "Felizmente, estamos numa fase em que a tutela reconhece o nosso valor - isso traduz-se por exemplo nessa possibilidade de emprestar armas, que é uma inovação em Portugal -, mas há ainda muitas batalhas a travar."

Pedimos água para refrescar e deixamos o Planalto no gelo para acompanhar o almoço, enquanto António explica que o turismo cinegético (desenvolvido para caçadores/pescadores desportivos) tem muito a ganhar com a alteração prevista pelo governo. "Éramos dos poucos países na Europa em que não era permitido emprestar armas para caçar, o que limitava muito... uma pessoa não quer vir da Rússia ou dos Estados Unidos e ter de trazer as suas caçadeiras..." Destaca outro sinal do olhar diferente que sente da parte do executivo. "Não davam devido crédito ao que fazíamos no e pelo mundo rural. Isso mudou, fomos incluídos na luta contra os fogos, por exemplo, com o programa Em Cada Caçador Um Vigilante, promovido pelo ministro da Agricultura e pelo secretário de Estado das Florestas, porque a verdade é que os caçadores são dos poucos que estão no campo, são uma presença física ali."

Dispensamos entradas e pão e, à falta de carne de caça, que nesta altura do ano não há na ementa, escolhemos a vitela de bolota do Alentejo com puré de batata-doce e bok choy e o entrecôte com 30 dias de maturação, legumes na grelha e feijão branco à moda da Toscana.

Os 41 anos de vida de António foram passados no campo, entre toda a espécie de animais. Sabe-lhes o modo de vida e o que lhes dá conforto, lê a natureza com a facilidade de quem toma um copo de água. E por isso tem ainda mais dificuldade em entender que haja quem olhe para a vida animal a partir de um ecrã num apartamento de uma grande cidade. A conversa segue por esse trilho da luta que tem levado a cabo para mitigar a "gritante invisibilidade do mundo rural" e pela artificialidade introduzida por uma "uma ideologia de humanização dos animais", potenciada pelas redes sociais.

"Há movimentos e partidos animalistas eleitos por 1% da população que ganham uma proporção que muitas vezes é apenas virtual mas acaba por ser suficiente para causar pressão juntos dos deputados." Preocupa-o que nos últimos três anos tenham passado pelo Parlamento muitas ideias que estão longe da realidade, mas sente-se satisfeito por o trabalho da Plataforma Sociedade e Animais ter contribuído para que não passassem disso mesmo. "Se tivessem sido aprovadas, estávamos em sérios sarilhos." E nos sarilhos inclui-se o perigo de acabar com espécies vegetais e animais, algumas delas protegidas, mas também com os meios de subsistência daqueles que ainda fazem do campo vida.

"Felizmente, nos últimos anos conseguimos criar esse lóbi construtivo em Portugal, que junta 20 entidades do mundo rural (não exclusivamente de animais) e consegue ter outra voz no Parlamento. Por outro lado, numa altura em que a esmagadora maioria do Parlamento é eleita por círculos urbanos, temos a sorte de haver um conjunto de deputados de vários partidos que são sensíveis à questão da ruralidade e que têm sido fundamentais para defendermos o mundo rural português." Reconhece que isso nem sempre é fácil, porque é a esses poucos que cabe a missão de recolher apoios para transmitir às hierarquias dos seus partidos o que apenas eles verdadeiramente conhecem. E por isso sabe-os de cor: "Pedro do Carmo, que foi presidente da Câmara de Ourique e faz um trabalho extraordinário lá dentro para explicar aos deputados do nim que é preciso defender o mundo rural, Nuno Serra (PSD), Patrícia Fonseca (CDS) e vários deputados do PCP têm batalhado e o resultado do seu trabalho é que das centenas de projetos antimundo rural que chegaram ao Parlamento pelas mãos do PAN, do PEV e do BE poucos foram aprovados ou sequer votados."

Recordo dois que tiveram luz verde: a lei que permite aos restaurantes escolher receber animais e a que, a partir de setembro, proíbe o abate nos canis. Classifica a primeira como "um golpe publicitário" e quanto à última prevê que o que foi uma "grande vitória do PAN se transformará rapidamente numa grande derrota". "Não fomos contra a lei dos animais nos restaurantes porque não seguia a tendência proibicionista que é assinatura do PAN. Eu gosto imenso de ir com os meus cães a esplanadas - temos 14 e todos eles fazem parte do nosso dia-a-dia, são um acrescento da família e são tratados como príncipes, mas têm a sua vida de cão. Mas esse projeto foi tão mal feito que nem sequer define quais são os animais que podem entrar; por isso é que ainda só 50 restaurantes aderiram no país inteiro. Quanto aos canis de abate, fez-se uma lei à pressa, sem preparação cuidada e sem ver se existiam as ferramentas necessárias e agora vamos chegar ao dia e não há condições para aplicá-la." A frase premonitória tem sido repetida nesta semana por veterinários e associações, que sublinham haver um risco real num momento em que o número de animais abandonados cresceu 22% (em 2017), em que há na cidade matilhas que chegam a ter 30 cães e muito poucos acreditam que seja viável aplicar a lei.

A comida chega à mesa e é óbvio que não ficámos nada mal servidos. Bom conversador e genuinamente preocupado com o que está a acontecer no seu mundo, António diz que este distanciamento entre o Parlamento e o campo é trágico e entende a urgência de alertar para os riscos da desertificação e da falta de aposta nestas áreas. "A invisibilidade do mundo rural é um grave problema. Com 250 km do litoral à fronteira do interior, não se entende... Só investindo aqui será possível minimizar o impacto dos fogos rurais e outros efeitos da desertificação. Em 2050, a capacidade de produção de alimentos para a humanidade vai atingir um ponto de não retorno. Tem de se criar condições para produzir mais com menos e com maior qualidade e isso só se consegue investindo no mundo rural."

Fala com conhecimento de causa, não só pela formação como pela experiência diária. "Há uns anos passei três meses na Austrália a aprender nas 12 melhores propriedades de gado. Viver no campo tem de ser rentável e é preciso incutir isso cá. A ruralidade não vive das casas de férias de alguns lisboetas. Temos restrições enormes de agricultura, falta de água, condições climáticas adversas, mais dificuldade e custos em produzir o que outros produzem mais facilmente e temos a questão da floresta, que ou é produtiva ou ninguém vai apostar nela. Esta ideia de ter só espécies autóctones é fantástica, mas se eu plantar um sobreiro tenho algum rendimento dele daqui a 35 anos e nada garante que não morram todos antes..."

Lamenta, por isso, que não haja consistência no interesse que é dedicado à ruralidade: no ano passado, falou-se muito, problematizou-se durante o horrível fogo de Pedrógão, mas depois tudo passou. Neste ano voltou a acontecer com Monchique. E a história vai continuar a repetir-se, acredita, enquanto não se entender que tem de haver mais deputados que deem importância à agricultura, à floresta, à caça, à pecuária.

Pergunto se estaria disposto a assumir esse papel, a entrar na política para ocupar o lugar que um dia foi do MPT. Admite que há quem fale nisso, mas defende que não é prioritário, enquanto se mantiver ou, idealmente, se conseguir reforçar as vozes do PCP, dos partidos de direita e da maioria do PS, que têm alguma ligação ao mundo rural.

Quanto aos restantes deputados, justifica o que defendem com um desconhecimento que tenta combater. "Tivemos o cuidado de falar com todos os grupos parlamentares, convidámos deputados a vir conhecer o campo, e tivemos situações em que nos disseram que até entendem mas que aquela é a ideologia deles, a que os apoiantes lhes pedem e que não mudarão porque a doutrina é aquela." Diz que muitos projetos do PAN sustentam essa visão. "Apresentam, por exemplo, projetos que dizem querer criar melhores condições para o setor da caça, mas na verdade têm uma iniciativa escondida porque no seu programa eleitoral é expresso que querem acabar com a caça. As ideias parecem inócuas mas se transformadas em lei seriam base para que se criasse jurisprudência para a agenda escondida que o PAN e o BE têm. E são ideias que, inclusivamente, trariam problemas gravíssimos ao nível da conservação da natureza e da pouca economia das áreas rurais."

Dá como exemplo as pragas de javalis, raposas e saca-rabos, predadores de topo que se não fossem controlados fariam desaparecer o coelho, a lebre, a perdiz - que são sustento do lince-ibérico, da águia-real, do abutre. "A natureza não tem capacidade de se autorregular de forma concertada; rapidamente chegaríamos a uma situação como a que temos hoje no Parque Nacional da Arrábida, onde os javalis estão a destruir espécies de fauna e flora - plantas bulbosas únicas, espécies de pássaros protegidas que têm o ninho mais perto do solo - que não existem em nenhum outro lugar de Portugal. Ao contrário do que se apregoa, não há mortandade nas zonas de caça, há gestão."
Garante que o sucesso do lince-ibérico se deve precisamente à caça - "o lince foi solto e teve condições para isso, é um feliz caso de sucesso único no mundo por causa da gestão da zona de caça em Mértola e no vale do Guadiana. Caso contrário, não haveria a gestão de habitats e consequente fornecimento de água e comida. A zona histórica do lince é a Malcata e por lá não há nenhum porque não há um coelho na Malcata - porque não há gestão cinegética." Como é que a natureza pode precisar de mão humana para se regular? Porque a esmagadora maioria da área rural portuguesa é privada, a caça potencia a biodiversidade. Aliás, mesmo nos Estados Unidos, onde há uma gestão pública das áreas protegidas, "a caça é utilizada para fazer uma gestão que a natureza sozinha não consegue".

António não tem dúvidas de que é falsa a ideia de que a maioria da sociedade portuguesa apoia as causas animalistas. A começar por quem realmente conhece o campo. "Há diferentes conceitos de bem-estar animal e o que está legislado quer por diretivas nacionais quer pelas europeias é adequado. A definição de bem-estar de um animal de pecuária não pode ser igual à de um de companhia. Mas essas políticas ditas animalistas - que animalistas somos nós, que convivemos diariamente com os animais no campo - olham para todas as espécies como um todo, que equiparam os animais aos humanos. Entendo que haja quem prefira a companhia de um animal e o trate como família, mas isso não pode ser transversal a todos os tipos de animais e imposto. Não podem vir dizer que a vaca que vive no montado com enorme qualidade de vida que não a tem porque apanha chuva." Recorda o caso da recente recomendação da provedora do animal da Câmara de Lisboa, que chumbou a corrida entre um burro e um Ferrari (ideia de António Costa quando era autarca e que o CDS queria agora repetir) porque "uma iniciativa desta natureza, para além de ridicularizar o animal, sujeita-o às intempéries que se preveem para esse dia e ao stress da cidade" (sic).

Há no entanto consequências ainda mais graves deste afastamento do campo do que a tendência para humanizar os animais. "Estamos a pagar a desertificação do mundo rural. São dezenas de anos de governos sucessivos em que a aposta no mundo rural não existia, as pessoas saíram para as cidades e hoje, à exceção de Alentejo e Ribatejo, as terras estão abandonadas. Em Portugal, a área média de uma propriedade é inferior a um hectare. Não há cantoneiros, pastores, guardas-florestais; no campo, restam os velhinhos e à exceção do verão, quando vêm os emigrantes (e vêm cada vez menos), é um deserto. Há um afastamento cada vez maior dos jovens do meio rural."

Especializado em Gestão das Florestas, rejeita a diabolização que se faz do eucalipto, porque não é na espécie que reside o problema mas na gestão. "Há é eucaliptos mal geridos, os que são bem geridos raramente ardem. O problema é que não resta ninguém para limpar as matas. É fácil estar aqui no Terreiro do Paço a dizer o que as pessoas devem fazer, sem fazer contas. E aqui é que está a questão. Era preciso uma estratégia nacional antidesertificação para incentivar regresso, mas estamos a passar por uma mudança de quadros comunitários e o que vemos é que há mais desinvestimento nacional na agricultura, na floresta, na pecuária, na caça. Quando devíamos estar a apostar na profissionalização dentro dos meios rurais, a cativar investimento, a garantir mais-valias - isso só é possível havendo apoio do Estado que o potencie. E só assim vamos conseguir ter incêndios rurais menores."

A minha vitela, macia como manteiga, já quase se foi. António demora-se no entrecôte, entusiasmado com o que o turismo cinegético aqui tem a ganhar, depois dos anos de crise que afastaram muitos caçadores e das grandes dificuldades que as mudanças agrícolas e as alterações climáticas trouxeram à capacidade cinegética. Explica-me que os hábitos agrícolas, antes muito adaptados à caça, se perderam e o que hoje se planta não é tão adaptável à vida das espécies. Por outro lado, há pragas e doenças e vírus decorrentes das mudanças que o clima vem tendo e que têm causado problemas com o coelho e a perdiz - espécies preferidas dos caçadores portugueses.

"Com a habitual resiliência do mundo rural, tem-se vindo a estagnar a diminuição do número de caçadores e a aumentar a vitalidade do setor, mas não é fácil tentar criar estas condições e em simultâneo combater na Assembleia", admite. É essa uma diferença de peso entre quem vive do campo e essas novas vertentes políticas: "Eles batalham por algo que não é deles, enquanto nós temos de estar no campo a trabalhar, a tratar dos animais e andamos aqui a ter de fazer pressão política para defender as nossas atividades, que são legais. Eu não tenho nada contra vegans, animalistas ou que as pessoas queiram ter a sua ideologia de vida. O que não admito é que tentem modificar a minha maneira de ser em nome da ideologia deles." E sublinha: "Vivemos uma perseguição ao nível das perseguições étnicas."

Acredita que o apoio real à causa de PAN, PEV e BE está longe de ter a dimensão que aparenta. Mas teme que, no dia em que se proibir algo importante, seja na caça, na pecuária ou na agricultura, os portugueses percam as estribeiras.

Casado e pai de duas raparigas, de 6 e 9 anos - "meninas do campo que adoram cavalos e cães"; a mais velha já o acompanha quando sai em caçadas -, António Paula Soares vive entre Alcácer e Setúbal, "rodeado de animais (faz criação de gado, cavalos, cães, e ainda agora veio de Amesterdão com um springer spaniel campeão do mundo), numa propriedade inserida numa área protegida", que tem pecuária, floresta, vinha, arrozais, caça, criação de gado e de cavalos. Trabalha noutra quinta e diz que tem o privilégio de "fazer umas escapadinhas à cidade". Nascido em Évora, onde tirou o curso de Engenharia Biofísica, Organização do Território e Gestão Ambiental, tendo chegado a dar aulas na universidade até acabar a especialização na componente florestal e passar a dedicar-se a 100% à propriedade rural, o campo é a sua vida e garante que não a trocava por nada.

"Temos uma família muito forte de tradições, todos fomos forcados, somos caçadores e estamos profundamente ligados ao campo." Entre as duas irmãs, foi em António que o bichinho do campo se fez mais forte, uma vocação que quer passar para as filhas, como as gerações anteriores lhe passaram a ele. "E é giro que as miúdas, com todos os apelativos dos amigos menos rurais, adoram esta vida. Gostava que quando crescessem mantivessem as mesmas ideias de campo, da caça, dos animais, da família. Tento mostrar-lhes tudo, viajamos muito para saberem o que existe e fazerem uma escolha informada." Defende que cada um tem o direito de educar a prole de acordo com seus princípios e no futuro os filhos decidirão o que querem. "Aí é que está a falta de democracia dessas vertentes políticas animalistas: tentam impor a sua visão sobre todos."

Quanto a António, tem um grupo de amigos com quem se junta para sair em caçadas. "A caça não é o ato de matar, é o convívio, o contacto com o campo, a calma da natureza. Juntamo-nos umas 30 vezes por ano para passar o dia em ambiente rural com os nossos cães, que são muito bem tratados", sublinha. Saem de madrugada e voltam ao fim do dia e nos dias seguintes comem o que caçaram. "Além de saudável, é uma forma de nos abstrairmos da correria do dia-a-dia e pouca coisa cria uma ligação tão forte como passarmos aquelas horas todas juntos no campo."

Tudo isto faz também mexer a economia, "desde que saímos a porta de casa: pagamos combustível, hotéis, restaurantes e ainda ajudamos a que o mundo rural tenha alguma vida em sítios onde o solo não dá para mais." Por isso, agora está focado em trazer mais estrangeiros para engordar esse efeito. "Em Espanha, o turismo cinegético é fortíssimo e nós só temos de replicar o modelo, agora que temos alguma abertura do governo para criar essas condições."

Passada à frente a sobremesa e com avanço direto para cafés, a conversa flui para a crescente procura dos melhores chefs por carne de caça - o que para António faz perfeito sentido: "É das melhores carnes para a saúde, porque os animais são mais saudáveis, vivem do que o campo lhes dá e com o máximo bem-estar, sem antibióticos, hormonas ou ração."

Ele aprendeu a caçar com familiares, que lhe ensinaram tudo: como gerir uma zona de caça, como é importante respeitar e conservar a natureza, etc. Agora, através de uma iniciativa inédita da ANPC, quer fazer o mesmo por outros miúdos. Para a primeira semana de setembro, organizou por isso um campo de férias para mostrar às crianças (dos 6 aos 14 anos) a realidade da caça - não o ato de caçar, frisa, mas o que envolve a realidade cinegética, a biodiversidade, a natureza. "Não há armas nem morte. É um campo de férias em Alcochete que tem desde aulas de treino de cães para caça a veterinários a ensinar-lhes sobre as espécies, especialista de observação de aves para saberem reconhecer sons e pegadas de aves de caça que depois vão identificar no campo e até uma aula prática de falcoaria." A iniciativa foi tão bem recebida que excedeu o número previsto de 30 inscrições - incluindo quatro miúdos espanhóis.

Despedimo-nos porque se faz tarde, mas com pena pelo muito mais que deixo de aprender - pelo menos para já. Fica o convite para visitar António no campo e conhecer melhor aquilo de que ali estivemos a falar, para entender um pouco melhor o mundo rural e o muito que o distingue da cidade. Um olhar que ao menos quem toma decisões devia fazer questão de aprender.

Populi

Água sem gás

Vinho branco Planalto

Vitela de bolota do Alentejo com puré de batata-doce e bok choy

Entrecôte com 30 dias de maturação, legumes na grelha e feijão branco à moda da Toscana

Cafés

63,70 euros

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt