Usar a BD para tentar explicar a Revolução que depôs Ceausescu

Até 5 de dezembro, o Instituto Cultural Romeno em Lisboa mostra Histórias de 89 em Bandas Desenhadas. Um projeto lançado pelo Museu de História de Brasov, e que tem também versão em livro.
Publicado a
Atualizado a

Não posso esquecer a surpresa com a arquitetura de Timisoara, cidade com imponentes igrejas e também teatros e museus, aquando da minha primeira visita à Roménia. Para mim, aquela que este ano é capital europeia da cultura, era sobretudo a cidade-mártir que em dezembro de 1989 se tinha revoltado contra Nicolae Ceausescu, o último ditador comunista romeno. Se o imparável impacto dos acontecimentos revolucionários em Timisoara depressa se fez sentir em Bucareste, a capital - e no final do dia de Natal Ceausescu e a mulher já tinham sido fuzilados -, foi todo o país que entrou então numa mudança acelerada, com avanços e recuos. Ora, é esse 1989 de todas as transformações que inspira um livro de BD de vários autores romenos nascido da iniciativa do Museu de História de Brasov, bela cidade da Transilvânia, injustamente famosa sobretudo pela proximidade do Castelo de Bran, conhecido como "o Castelo de Drácula" por ter ilustrado a capa da edição original do romance do irlandês Bram Stocker inspirado em Vlad Tepes, um príncipe valáquio que combateu os turcos no século XV.

Até 5 de dezembro, o Instituto Cultural Romeno (ICR) de Lisboa mostra algumas das pranchas desse Histórias de 89 em Bandas Desenhadas, traduzidas para português. Tive oportunidade de ler a edição em francês, que me foi oferecida pelo diretor do Museu de História de Brasov, Nicolae Pepene, que estava no final da adolescência quando se deu a queda de Ceausescu e que foi o grande impulsionador do projeto, que juntou vários desenhadores romenos. O próprio Pepene participou como argumentista da pequena história "Rambo", desenhada por Puiu Manu. Dinu Gindu, diretor do ICR de Lisboa, apresentou-me também Octav Ungureanu, artista que era uma criança no momento do fim trágico do casal Ceausescu e que me contou como ficou surpreendido por o ditador afinal não ser imortal, tal era a imagem de poder que passava na televisão romena. A sua BD intitula-se "Mas o que fizemos, camaradas?"

Bastião da língua latina na Europa Central e Oriental, culturalmente muito orientada para a França, a Roménia tem péssima memória da era Ceausescu, um ditador comunista visto com certa benevolência pelo Ocidente por não ser 100% obediente a Moscovo (por exemplo, enviou atletas aos Jogos de Los Angeles de 1984, desafiando o boicote olímpico decidido pela União Soviética). Nestas três décadas e meia pós-comunismo o país tem feito uma caminhada notável, em especial depois da adesão em 2007 à União Europeia. E só se escandaliza quem ouve dizer que os romenos se aproximam dos portugueses em termos de riqueza média por desconhecer a pujança de uma nação que até teve a primeira cidade da Europa Continental com iluminação elétrica - Timisoara, a tal onde começou a Revolução Romena (ou foi um golpe de Estado?) que este livro em BD e esta exposição dão a conhecer.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt