Ursula enfrenta dia decisivo

Ursula von der Leyen vai esta terça-feira tentar convencer os eurodeputados das suas capacidades para presidir a Comissão Europeia.
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Se for eleita, Von der Leyen regressará à terra natal, de onde saiu há 47 anos. Mas, agora, para liderar a Europa. Nas últimas horas, a alemã nomeada pelo Conselho Europeu, para presidir a Comissão procurou seduzir os eurodeputados, numa altura em que as dúvidas sobre a sua eleição ainda não estão afastadas.

Em duas cartas que dirigiu a grupos políticos do Parlamento Europeu assume vários compromissos, incluindo o da defesa do aumento de poderes dos eurodeputados, manifestando o seu apoio ao direito de iniciativa legislativa. Ursula propõe até o modelo para colmatar o que até aqui tem sido apontado como uma das grandes lacunas da instituição com sede em Estrasburgo.

A ideia de Von der Leyen é para que uma maioria possa aprovar resoluções, solicitando à Comissão que legisle. Nesse caso, a provável futura presidente da Comissão Europeia compromete-se a avançar com um acto legislativo, tendo em conta a proporcionalidade, subsidiaridade, e eficácia legislativa.

Na sua corrida ao principal dos cargos de topo, em Bruxelas, Ursula von der Leyen propõe-se a fazer cumprir os princípios do Estado de Direito, como lhe foi solicitado dois dias antes pelos liberais, os quais exigiram "clareza e um compromisso inequívoco", com a defesa de um mecanismo europeu, que possa desencadear "sanções" aos Estados-Membros, que ponha em causa "os valores europeus, que são inegociáveis".

Na carta dirigida ao grupo dos Socialistas, Von der Leyen assumiu "compromissos bastante claros", como notou o primeiro-ministro português, António Costa, destacando "a defesa do Estado de direito", ou a "promoção da igualdade de género".

António Costa notou também que Ursula se compromete a "uma maior solidariedade na política migratória", sem esquecer aquela que tem sido uma das bandeiras dos Socialistas, nomeadamente "o pilar social", além da "reforma da zona euro".

No conjunto que o representante de Portugal no Conselho Europeu classifica como "muito positivo", consta ainda "o combate ao desemprego jovem" ou o "muito importante compromisso com a reforma da zona euro, recorrendo a toda a flexibilidade do Pacto de Estabilidade e Crescimento".

Para ser eleita, a candidata necessita de uma maioria absoluta no PE, ou seja, 50% dos eurodeputados mais um. Devido a várias ausências, a sessão desta terça-feira será composta por 747 eurodeputados, tendo em conta as notificações oficiais das autoridades dos Estados-Membros. Por essa razão, a maioria necessária será de 374 votos.

Indefinição

Ontem, parecia mais próxima a eleição de Von der Leyen. Contudo, o caminho percorrido até aqui deixa ainda alguma indefinição. Na semana passada, levou a cabo múltiplas reuniões com os membros dos diferentes grupos políticos.

Mas, as suas declarações ficaram "aquém das expectativas", como revelaram à TSF, membros de grupos políticos, dos quais depende a formação de uma maioria, como por exemplo, os Verdes e os Socialistas & Democratas, os quais não deram qualquer garantia de vir a aprovar o nome de Ursula von der Leyen, sem que haja "mais compromisso".

Os Socialistas exigiram, por exemplo, uma palavra sobre a proposta do Quadro Financeiro Plurianual, que tem de estar fechada até ao final do ano. Está em causa o aumento das contribuições dos Estados-Membros para o orçamento de longo prazo, numa altura em que há discrepâncias de largos milhões de euros, entre o proposto pela Comissão e o que defende o Parlamento.

Outras áreas, como "uma maior solidariedade na política migratória", ou "o pilar social", bem como a "reforma da zona euro" acabaram por ter eco, na carta que Ursula enviou ontem ao grupo dos Socialistas e Democratas.

Em termos ambientais, Ursula von der Leyen não chegou a convencer, embora tivesse falado daquilo que preocupa "as pessoas, especialmente os jovens", além de acrescentar várias promessas, sobre a descarbonização da economia, com "ações para o futuro do nosso planeta", prometendo "mais ambição" em matéria de ambiente. Contudo, "não concretizou", por isso, não contará com o apoio dos Verdes, que prometeram votar contra.

Quem é Ursula

Ursula nasceu em Bruxelas e, até aos treze anos, teve um trajecto de vida comum ao de inúmeras famílias de expatriados, que gravitam em torno das instituições europeias. Fez a primeira parte do ensino numa escola belga francófona, razão pela qual fala fluentemente francês.

Ursula von der Leyen é filha de um antigo funcionário europeu. O seu pai chegou a Bruxelas em 1954, como adido do Conselho de Ministros da então Comunidade Europeia do Carvão e do Aço. Dois anos mais tarde Ernst Albrecht ascendeu ao cargo de chefe da secção do Mercado Comum da Conferência Intergovernamental, que viria a elaborar o Tratado de Roma.

Em 1958, assumiu funções como chefe de gabinete do Comissário do Mercado Interno e da Política Regional, Hans von der Groeben, um dos nomeados pelo chanceler alemão, Konrad Adenauer, na entrada em vigor do tratado de Roma, em 1958. Naquela altura, a Comissão Europeia foi liderada por outro alemão, Walter Hallstein.

Ernst Albrecht ainda foi director-geral da Concorrência, antes de regressar ao seu país. Ursula, a terceira de oito irmãos, deixaria a capital belga, quando o seu pai rumou novamente à Alemanha, onde chegou a primeiro-ministro da região da Baixa Saxónia.

Concluiu os estudos na Alemanha e iniciou a vida académica na prestigiada London School of Economics. Porém, bastaram dois anos, para que a frustração com o curso falasse mais alto, e ditasse a mudança para outra área: medicina. Especializou-se em ginecologia, ainda chegou a exercer, mas por pouco tempo.

Aos 28 anos, mudou-se para os Estados Unidos, acompanhando o marido, Heiko von der Leyen, professor de medicina. Mãe de sete filhos, entrou na política aos 45 anos, tendo sido ministra em todos os mandatos de Angela Merkel.

Termina esta terça-feira o seu mandato como ministra da Defesa, "qualquer que seja o resultado" da votação no Parlamento Europeu, como fez questão de anunciar ontem. Foi ministra da Família e Ministra do Trabalho e Solidariedade Social.

Eleição

Este é o grande dia para Ursula. Se tiver sido bem sucedida, está a poucas horas de alcançar a presidência da Comissão Europeia.

A eleição decorrerá esta terça-feira, em Estrasburgo. 9:00 (8:00 em Lisboa), von der Leyen apresentará novamente os seus argumentos, num derradeiro discurso no parlamento europeu. Segue-se o debate dos eurodeputados, até às 12:30. A votação será realizada às 18:00 (menos uma hora em Lisboa).

Von der Leyen trabalhou num tempo recorde, para preparar uma base para um mandato de cinco anos, em que a União terá de fechar um acordo sobre as perspectivas financeiras de longo prazo, durante a fase transitória em que o bloco deixará de contar com um dos seus membros. A este respeito, Ursula já afirmou que tudo fará para manter o Reino Unido na União Europeia, aprovando todos os adiamentos necessários. Além de deixar entender que o o acordo de saída não será reaberto.

A alemã foi indigitada no início do mês, no final de uma cimeira que se prolongou por três dias, em que foi definida uma distribuição para os cargos de poder institucional, na União Europeia. A chave encontrada, no meio de controvérsia e grande tensão, depois de um grupo de países terem chumbado um acordo que estava praticamente fechado, permite, ainda assim, colocar duas mulheres em funções de liderança.

Além da alemã, na Comissão Europeia, a conservadora francesa Christine Lagarde assumirá a presidência do Banco Central Europeu. O cargo de Alto Representante da UE para a Política Externa e de Segurança será ocupado pelo ministro cessante dos Negócios Estrangeiros, do governo socialista espanhol, Joseph Borrel. A presidência do Conselho Europeu será entregue ao Liberal belga, Charles Michel, ao passo que a presidência do Parlamento Europeu foi ocupada na semana passada pelo socialista Italiano, David-Maria Sassoli, depois de ser escolhido por maioria, na câmara de Estrasburgo.

A decisão dos líderes europeus fez cair por terra o prometido processo do Spitzenkandidat, de acordo com o qual, o nome do presidente da Comissão Europeia terá de ser eleito, nas listas de candidato ao Parlamento Europeu.

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