Um parêntesis nas divisões após apuramento da Bélgica
"Ainda falta a França. É apenas mais um obstáculo, no meio de outros", frisou Ernesto, um italiano "nascido na Bélgica", acreditando que a passagem à final não é mais do que um jogo de probabilidades, num "50 - 50" por cento para cada uma das equipas, embora considere que a habilidade dos jogadores, desequilibra a balança, a favor da Bélgica.
"Aquilo que vimos, até agora, nós temos o melhor ataque e eles ainda não provaram grande coisa, até agora", comentou com DN, Frederick, um belga da Flandres , numa curtíssima pausa dos cânticos que soaram até altas horas, nas ruas da capital belga. "Come on Belgium, come on Belgium", cantaram num inglês, que simplifica as frases de apoio à selecção de um país dividido em quase tudo, a começar pela língua.
A festa desta madrugada foi, porém, um momento agregador das diferentes culturas do país. As várias nacionalidades cruzaram-se, como habitualmente, mas ontem num clima extraordinariamente fraterno.
"Estou muito contente [com a vitória]. Mas, o melhor é que as pessoas se juntam e se misturam para fazer a festa. É isso o que pretendemos", afirmou Michaël De Borman, um belga que abriu a porta de casa, colocou a televisão na rua e, à semelhança do que tinha feito no Euro2016, os vizinho juntaram-se, "porque Bruxelas é muito internacional".
"Cada um traz o que pode. Cadeiras, comida do seu país ou bebidas. O importante é fazermos a festa todos juntos, porque quando vim morar para esta rua, há 12 anos, não havia nada e as pessoas não falavam umas com as outras. Memos entre os belgas. Agora todos nos conhecemos", disse De Borman.
"Eu sou italiana, mas temos aqui todas as nacionalidades. Espanhóis, portugueses, italianos, belgas, sírios", contou, uma mulher que está imigrada à décadas, em Bruxelas, onde se instalou e é proprietária de um apartamento que arreda "a uma senhora portuguesa que trabalha na Comissão [Europeia]".
Em apoio de Les Diables Rouges
Na rua, enfeitada com bandeiras de várias nacionalidades, vivem também outros portugueses, que se juntaram à festa, quase intimista, organizada pelo vizinho Michaël. "Gostei que a Bélgica ganhasse, já que Portugal saiu [eliminado pelo Uruguai]", confessou Regina, uma portuguesa que foi celebrar, esperando que "Les Diables Rouges" "cheguem até à final e ganhem o campeonato do Mundo".
"A Bélgica é, há três anos, o meu segundo país. É aqui que nos sentimos bem, já que não temos lugar no nosso país e tivemos que vir para outro", confidenciou, já no final do jogo, no meio do som de buzinas e "vuvuzelas".
Num raro momento, por ventura até inédito, na rotina de uma cidade movimentada, com um trânsito habitualmente caótico, em que os condutores (talvez injustamente) são muitas vezes apelidados de inexperientes ou pouco habilitados, ontem à noite jogava-se futebol no meio da rua.
Entre as várias crianças, há uma ainda de mochila nas costas. Esteve a ver o futebol com os vizinhos e agora brinca com as outras. Evic chegou a Bruxelas há cerca de quatro anos, com os pais, quando a instabilidade e a guerra os obrigaram a fugir da síria.
"É muito "fixe" estar aqui. É verdade que a Bélgica é um pequeno país. Mas, para nós está muito bem. Eu estou pela Bélgica [neste mundial]. Agora é o meu país. A devoção que tenho pelo meu país continua dentro do meu coração, mas estou pela Bélgica", disse ao DN.
The Brave Little Belgium
O percurso extraordinariamente marcante da equipa de futebol amada da mesma maneira na Flandres e na Valónia, que veste com as cores da bandeira de um país dividido, parece traduzir um pouco da mentalidade que, a par da cerveja e do Rei, também é comum a todo o território.
Este ano passam 100 anos sobre o fim da primeira Guerra Mundial e há um episódio desse tempo, que flamengos e valões gostam orgulhosamente de relatar.
Muita gente saberá que os belgas contrariaram as expectativas da Alemanha e em vez de deixar que o seu território fosse utilizado como uma plataforma alemã resistiram fortemente. Este episódio fez com que fossem apelidados pelos americanos como: "The Brave Litle Belgium". Os Bravos Pequenos Belgas.
Pequenos por serem poucos e com um exército da uma era pré-industrial e bravos por terem atrasado o avanço alemão, dando um contributo importantíssimo para o desfecho final. Porém, neste mundial, pelo que se tem visto, talvez se possa apenas dizer os "Bravos Belgas".
"Da Alemanha" nem bom vento nem bom casamento
A confiança num desfecho bem sucedido, na final do campeonato, está presente nas conversas com as pessoas por aqui, especialmente depois da selecção número 1 do ranking da Fifa ter sido afastada do mundial, com a derrota da Alemanha, com a derrota frente à Coreia. Agora que o número 2 dessa classificação foi afastado, resta a Bélgica como a selecção teoricamente mais forte.
A expectativa está no máximo. Em Bruxelas, todos parecem querer estar ao lado do que em teoria será o campeão. "Eu sou alemão. Mas, hoje gritei pela Bélgica. E, adoraria que chegassem até à final", confessou ao DN um dos animadíssimos adeptos da noite, na capital belga.
Em Bruxelas