O fantástico sétimo lugar alcançado ontem nos Mundiais de ginástica de Tóquio coloca Filipa Martins definitivamente na história da ginástica portuguesa. Ela já tinha feito história ao apurar-se para a final do all-around, mas conseguiu mais um grande feito ao terminar em sétimo lugar entre as 24 melhores ginastas do mundo..É o melhor resultado de sempre da ginástica artística portuguesa, que assim consegue um inédito diploma mundial. E é também o melhor resultado pessoal da ginasta do Acro Clube da Maia, considerada a melhor portuguesa de sempre nos quatro aparelhos e que participa nos sétimos Mundiais de uma carreira já com 13 anos..A portuguesa somou 52.199 pontos, apesar de um erro que lhe custou um ponto. Depois de começar com uma execução perfeita do "Martins" - movimento a que dá nome -, que mereceu muitas palmas por parte dos espectadores presentes no recinto, a acrobata cometeu uma falha numa passagem quase no final do exercício que a condicionou e penalizou, mas que não impediu de fazer história. Filipa tinha como melhor classificação no concurso completo (all-around) o 16.º lugar em 2014, em Nanning, na China..A prova foi ganha pela russa Angelina Melnikova, que se impôs a Leanne Wong e Kayla di Celo, segunda e terceira classificadas, respetivamente, na ausência de Simone Biles, que continua sem competir depois de desistir de várias finais nos Jogos Olímpicos em nome da saúde mental. A campeã olímpica Sunisa Lee e Jade Carey também optaram por não marcar presença nos mundiais de Kyatkiushu, no Japão..Filipa Martins, 25 anos, a mais velha entre as 24 finalistas em competição, irá ainda disputar amanhã a final das paralelas assimétricas, aparelho onde já tem um movimento com o seu nome. Um exercício que demora dois segundos a ser executado e que levou nove meses a ser pensado e treinado em plena pandemia. A ginasta não tinha a ideia de que era inédito quando "lhe saiu" e só depois percebeu que não havia nenhuma manobra registada da forma como o fazia. Estreou-o nos Europeus de Basileia, em abril, e apanhou as outras atletas de surpresa. Quando um ginasta apresenta um movimento novo fica ligado a ele, dando-lhe o nome. "O Martins" figura oficialmente no código de pontuação internacional de ginástica artística desde setembro..Filipa Martins começou a fazer ginástica aos quatro anos no Sport Club do Porto. A mãe de uma colega, que trabalhava numa faculdade de desporto, que a via brincar a fazer exercícios, perguntou aos pais se ela não gostaria de começar a fazer, uma vez que "tinha jeito". E assim começou um longa e feliz ligação com a ginástica artística..Compete desde os 12 anos, mas há 21 que a acrobata se sente "apaixonada" pela ginástica. E esse é, segundo ela, o ingrediente principal para se fazer carreira. Depois há "o treino sempre com alegria" - treina seis dias por semana, cinco horas e meia por dia -, "o foco, a determinação, a garra e a resiliência". Tudo isto somado ao talento coloca-a entre as melhores do mundo..Filipa gostava que a modalidade fosse mais conhecida e mediática para conseguir chegar mais às pessoas, motivar novos atletas, chamar patrocinadores e ter mais apoios... que só costumam aparecer depois dos resultados. O que implica fazer todo o processo praticamente sem ajuda e torna os bons resultados autênticos feitos históricos..Natural da Maia (9 de janeiro de 1996), Filipa representa o Acro Clube da Maia. Quando se fala em ginástica acrobática em Portugal é imperioso conhecer o clube que tem colecionado dezenas de medalhas numa modalidade com pouca expressão em Portugal e que ainda vive muito à custa da paixão e resiliência dos atletas e dos bolsos dos pais.."A ginástica não dá assim tanto dinheiro para que possa viver dela e de criar projetos para o futuro", diz Filipa. Por isso ainda vive com os pais e está a estudar Desporto na Universidade do Porto. Mas o futuro, segundo ela, passará pela ginástica. Aos 25 anos, as ginastas já são consideradas velhas para competir, mas há exceções e Filipa só sabe que o dia de amanhã lhe reserva mais uma final..isaura.almeida@dn.pt