A imolação do vendedor de rua Mohamed Bouazizi, a 17 de dezembro de 2010, desencadeou uma onda de protestos na Tunísia que culminaria, a 14 de janeiro de 2011, com a queda de Ben Ali e consequente fuga para a Arábia Saudita. Mas, uma década após o fim do regime que esteve 23 anos no poder, e apesar de a frágil democracia se aguentar, o descontentamento é crescente. E a celebração do aniversário do maior sucesso da Primavera Árabe deverá ser contido - até porque coincide com um novo confinamento devido à covid-19..Na Tunísia, o otimismo revolucionário do movimento pró-democracia, que derrubou Ben Ali (que viria a morrer em setembro de 2019 no exílio), deu lugar ao desespero. Um terço dos jovens não têm emprego e são muitos os que optam por partir, diante das dificuldades económicas. O turismo, já atingido fortemente por causa dos atentados de 2015, praticamente colapsou face à pandemia. No ano passado, os tunisinos representaram a maior fatia de imigrantes ilegais que chegaram a Itália (cerca de 12 mil), após arriscar a vida a cruzar o Mediterrâneo..Após um longo debate entre islamitas e oposição, o país aprovou a nova Constituição em 2014, realizando várias eleições consideradas livres pelos observadores - as últimas, em outubro de 2019, elegeram o atual presidente, o antigo professor universitário Kaïs Saied. A Tunísia já teve nove governos em dez anos, mas as transferências de poder foram sempre pacíficas, apesar dos problemas iniciais e dos ataques terroristas que abalaram o país. Ainda em dezembro, o presidente anunciou a extensão por mais seis meses do estado de emergência decretado após os ataques de 2015..Se para Síria, Líbia ou Iémen a Primavera Árabe foi sinónimo de guerra, na Tunísia esta trouxe mais liberdade. "Ter escritórios, uma equipa de jornalistas que trabalham livremente no terreno, era um sonho há dez anos e este sonho realizou-se", disse à AFP o opositor Sami Ben Gharbia, que voltou do exílio em 2011 e cujo blogue Nawaat se tornou um site de referência. A liberdade de associação permitiu também o nascimento de uma sociedade civil dinâmica, que se mobilizou face às tentativas de pôr em causa os avanços democráticos, mas a classe política, enredada em lutas pelo poder, tem sido incapaz de agir..No décimo aniversário da fuga de Ben Ali para a Arábia Saudita, há uma nostalgia crescente em relação ao antigo regime, personificada pela deputada populista Abir Moussi. "Não é nostalgia pelo ditador (os tunisinos ainda odeiam o regime falhado), mas é nostalgia da certeza que se perdeu", disse à AP Michaël Bechir Ayari, analista do Internacional Crisis Group. "As pessoas querem serviços públicos. Sentem que sob Ben Ali era mais fácil porque o sistema paternalista era mais confiável do que o atual.".Moussi é líder do Partido Destouriano Livre (herdeiro do partido de Ben Ali), que conquistou 17 lugares no parlamento em 2019 mas que, se as eleições fossem hoje, podia ser o vencedor (segundo sondagens). Moussi nega a legitimidade da revolução tunisina e diz que o movimento islamita Ennahda, que é atualmente o maior partido, é um grupo terrorista que devia ser proibido..Esta quinta-feira é feriado na Tunísia para assinalar o aniversário da queda de Ben Ali. Mas marca também o início de um novo confinamento, com recolher obrigatório das 16h00 até às 06h00 até pelo menos 24 de janeiro. O país já registou mais de 165 mil casos e mais de cinco mil mortes por covid-19.
A imolação do vendedor de rua Mohamed Bouazizi, a 17 de dezembro de 2010, desencadeou uma onda de protestos na Tunísia que culminaria, a 14 de janeiro de 2011, com a queda de Ben Ali e consequente fuga para a Arábia Saudita. Mas, uma década após o fim do regime que esteve 23 anos no poder, e apesar de a frágil democracia se aguentar, o descontentamento é crescente. E a celebração do aniversário do maior sucesso da Primavera Árabe deverá ser contido - até porque coincide com um novo confinamento devido à covid-19..Na Tunísia, o otimismo revolucionário do movimento pró-democracia, que derrubou Ben Ali (que viria a morrer em setembro de 2019 no exílio), deu lugar ao desespero. Um terço dos jovens não têm emprego e são muitos os que optam por partir, diante das dificuldades económicas. O turismo, já atingido fortemente por causa dos atentados de 2015, praticamente colapsou face à pandemia. No ano passado, os tunisinos representaram a maior fatia de imigrantes ilegais que chegaram a Itália (cerca de 12 mil), após arriscar a vida a cruzar o Mediterrâneo..Após um longo debate entre islamitas e oposição, o país aprovou a nova Constituição em 2014, realizando várias eleições consideradas livres pelos observadores - as últimas, em outubro de 2019, elegeram o atual presidente, o antigo professor universitário Kaïs Saied. A Tunísia já teve nove governos em dez anos, mas as transferências de poder foram sempre pacíficas, apesar dos problemas iniciais e dos ataques terroristas que abalaram o país. Ainda em dezembro, o presidente anunciou a extensão por mais seis meses do estado de emergência decretado após os ataques de 2015..Se para Síria, Líbia ou Iémen a Primavera Árabe foi sinónimo de guerra, na Tunísia esta trouxe mais liberdade. "Ter escritórios, uma equipa de jornalistas que trabalham livremente no terreno, era um sonho há dez anos e este sonho realizou-se", disse à AFP o opositor Sami Ben Gharbia, que voltou do exílio em 2011 e cujo blogue Nawaat se tornou um site de referência. A liberdade de associação permitiu também o nascimento de uma sociedade civil dinâmica, que se mobilizou face às tentativas de pôr em causa os avanços democráticos, mas a classe política, enredada em lutas pelo poder, tem sido incapaz de agir..No décimo aniversário da fuga de Ben Ali para a Arábia Saudita, há uma nostalgia crescente em relação ao antigo regime, personificada pela deputada populista Abir Moussi. "Não é nostalgia pelo ditador (os tunisinos ainda odeiam o regime falhado), mas é nostalgia da certeza que se perdeu", disse à AP Michaël Bechir Ayari, analista do Internacional Crisis Group. "As pessoas querem serviços públicos. Sentem que sob Ben Ali era mais fácil porque o sistema paternalista era mais confiável do que o atual.".Moussi é líder do Partido Destouriano Livre (herdeiro do partido de Ben Ali), que conquistou 17 lugares no parlamento em 2019 mas que, se as eleições fossem hoje, podia ser o vencedor (segundo sondagens). Moussi nega a legitimidade da revolução tunisina e diz que o movimento islamita Ennahda, que é atualmente o maior partido, é um grupo terrorista que devia ser proibido..Esta quinta-feira é feriado na Tunísia para assinalar o aniversário da queda de Ben Ali. Mas marca também o início de um novo confinamento, com recolher obrigatório das 16h00 até às 06h00 até pelo menos 24 de janeiro. O país já registou mais de 165 mil casos e mais de cinco mil mortes por covid-19.