Trump e Kim não se zangaram! Apesar de se andarem a enganar
Antes devagar e bem do que à pressa e mal. Trump ter-se-á finalmente rendido a esta máxima que podia muito bem ser confucionista, filosofia tradicional chinesa que também influencia o pensamento coreano. E se muitos olham para a falta de acordo em Hanói entre os líderes americano e norte-coreano como um fracasso tendo em conta a ambicionada desnuclearização, a verdade é que talvez só agora comece a negociação a sério, a dos pequenos passos, e isso é positivo.
Depois da troca de ameaças de destruição mútua e de insultos pessoais que aconteceu ao longo de 2017 é inegável que a cimeira Trump-Kim do verão passado em Singapura e agora esta na capital vietnamita trouxeram um desanuviamento que o mundo agradece. Sobretudo os sul-coreanos, sempre em sobressalto com o irmão-inimigo a norte, passaram a viver melhores tempos. Aliás, o seu presidente Moon foi um parceiro essencial de Trump na construção do corrente diálogo, que visa também pôr fim formal à Guerra da Coreia de 1950-1953.
O problema desde o início foi que Trump entende desnuclearização como o fim das armas nucleares norte-coreanas, enquanto Kim usava a palavra para definir o fim do guarda-chuva nuclear americano sobre a Coreia do Sul. Pior ainda, nem Kim vai desistir do arsenal nuclear que o protege e até lhe dá palco internacional, nem Trump deixará sem proteção o aliado sul-coreano (e também o Japão).
Agora é claríssima essa divergência, mas ela não acabar com projetos futuros de diálogo é a boa notícia oculta desta cimeira em Hanói. Kim queria o fim imediato das sanções, Trump disse que não. As negociações pragmáticas, sem excesso de otimismo, poderão finalmente avançar e, por muito longas que sejam, trazer os tais pequenos resultados que evitam o conflito. A Coreia do Norte continuará sem fazer testes nucleares ou de mísseis, linha vermelha para os Estados Unidos insistirem nas conversações.
No fundo, o bom foi que Trump e Kim, depois de elogios mútuos abundantes, conseguiram não se zangar. Como disse o próprio presidente americano, perante a falta de acordo houve a decisão de sair da sala, mas os cumprimentos de despedida não faltaram. Pode até demorar muito uma terceira cimeira, mas ambos os líderes salvaram a face.
A pressão será agora maior para Kim, que além da arma nuclear precisa de desenvolvimento económico para garantir a sobrevivência da dinastia comunista fundada pelo avô no final da Segunda Guerra Mundial. Nos bastidores, haverá pressão, até da Coreia do Sul, para um certo alívio nas sanções.