Trabalhos escolares nas férias? Sim, mas sem pressão

As opiniões dividem-se quase tanto como no tempo de aulas, no que respeita aos exercícios escolares. Há quem os defenda, mas com moderação, e quem os abomine
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"Férias são férias." A sentença é amplamente ditada pela maioria dos professores no que respeita aos trabalhos de casa durante a pausa escolar, num tema que deixa sempre os pais sem saber muito bem o que é melhor: dar largas ao descanso total dos filhos até chegar o próximo ano letivo, ou ir insistindo durante estes quase três meses para uma revisão de algumas matérias, evitando o choque de setembro?

"Nem oito nem 80. A partir do meio de agosto os miúdos devem tomar consciência de que as férias são a prazo, e os pais também. Dessa forma evita-se o choque maior, no início de setembro", assegura ao DN Isabel Sousa, professora do ensino básico. E como é que isso se consegue? "Nas semanas que antecedem o arranque da escola, os miúdos devem começar a fazer alguns exercícios, sem pressão. Isso depende muito dos níveis e dos miúdos, por isso é que alguns podem ser feitos sem eles notarem, como ler um livro, fazer um texto depois de um passeio, por exemplo", acrescenta Marco Ferreira, professor do ensino básico.

Foi esse meio termo que Isabel Mendes sempre tentou imprimir às férias das filhas. Gabriela, de 11 anos, e Filipa, de 7, testam neste verão em conjunto essa mesma "receita" da mãe. A mais velha vai para o 7.º ano de escolaridade, e por isso desde pequena está habituada a fazer "pequenos exercícios durante as férias. Não é uma rotina, é aproveitar um ou outro tempo livre para terminar as fichas dos livros escolares que ficaram por fazer. Entendo-o como uma forma de não se esquecerem dos conteúdos desse ano", considera Isabel Mendes, cuja filha mais velha revela algumas dificuldades na disciplina de Português, e por isso é uma das matérias em que mais insiste, de uma forma que pode nem parecer trabalho. "Pode ser apenas leitura, ou escrever pequenos textos. Nunca como rotina", sublinha. A mais nova, Filipa, vive as suas primeiras férias escolares, pois prepara-se para frequentar o 2.º ano de escolaridade, nos arredores de Leiria. "Com ela é completamente diferente. Nem preciso de a incentivar, porque ela toma a iniciativa de ir buscar os livros..."

Além dessa experiência de mãe, Isabel acumula outras, no apoio aos alunos que frequentam o ATL do infantário onde trabalha, ela que há alguns anos trocou o marketing empresarial por esta nova função. São crianças que vão agora para o 4.º ano de escolaridade, cujo registo deixa perceber claramente quais desligam completamente durante as férias, e quais fazem uma revisão da matéria dada, antes de entrarem num novo ano. "Noto perfeitamente a diferença entre ambos, quando chegam ao ATL, em setembro. Os que têm esses hábitos estão mais entusiasmados para trabalhar", sublinha.

Raquel Gandarez alinha na mesma ideia de incentivar a filha a ir fazendo alguma coisa de forma ligeira. "É recomendado pela professora! Um livro de revisões da matéria; leitura (um livro que ela goste) e escrita (de preferência alguma coisa inventada por ela). Tentamos levar isto na desportiva mas nem sempre é fácil", conta a mãe de Marta, de 8 anos, pronta para o 3.º ano.

Mas a maioria dos pais ouvidos para esta reportagem opta por deixar os filhos "de férias e em paz", tal como afirma Rui Pinhão, pai de três crianças em idade escolar. Também Susana Vigário, mãe de uma menina de 11 anos, está nesse grupo de pais. "Se encontrarem quem faça TPC com os filhos nas férias... ensinem-nos a jogar cartas! Ou esses pais vão trabalhar quando estão de férias?", questiona.

A médica Isabel Gonçalves, especialista em medicina familiar, tem uma opinião muito clara sobre o assunto: "No tempo de férias é para descansar. Fazer alguns trabalhos de casa para relembrar matéria, basta 15 dias antes de iniciar novo ano letivo. É muito mais saudável para todos", afirma.

Maior sucesso? Nem por isso

Não é quem mais trabalhos de casa faz que obtém maior sucesso escolar. As conclusões foram divulgadas na semana passada, no âmbito de um estudo do projeto aQeduto, apoiado pelo Conselho Nacional de Educação. O nosso país é apontado pela OCDE como um daqueles onde os alunos dedicam menos tempo aos trabalhos de casa: uma média de quatro horas semanais. Na base do estudo, intitulado "E os alunos, que responsabilidade", estão os dados do relatório PISA da OCDE, que visa avaliar a preparação dos alunos na fase final da escolaridade obrigatória. Com apenas três horas semanais de trabalhos de casa, a Finlândia é o país com a média mais baixa. A média mais alta pertence à Polónia e à Irlanda, com sete horas semanais.

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