Decisão sobre tutela dos filhos das uniões de facto vai ser igual à dos casamentos
A regulação das responsabilidades, por mútuo acordo, de casais separados sobre os filhos, pode agora ser feita em qualquer conservatória do registo civil sem passar por um tribunal. Este regime já era válido há sete anos para os casados e agora passa a ser estendida a todas as uniões (de facto ou outras) nos casos em que há acordo das partes sobre a forma como vão partilhar a guarda dos filhos. O projeto lei do PS foi ontem aprovado na especialidade, na primeira comissão (Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias).
Mas quem já trabalhou com com acordos de pais separados, quer em tribunal, quer na conservatória, não vê vantagens nesta última solução. "Os processos acabam por ter uma maior morosidade nas conservatórias. Primeiro que o Ministério Público (MP) se pronuncie...na prática, demora muito mais do que os 30 dias previstos na lei a pronunciar-se e muitas vezes opõe-se porque defende soluções diferentes das que os casais acordaram", comenta Fernando Silva, advogado especializado em Direito de Família e Menores.
O juíz de Família e Menores, António Fialho, foi chamado a dar um parecer a este projeto lei, o qual acabou por ser desfavorável. "A única entidade a dar parecer positivo foi o Instituto de Apoio à Criança", referiu o juiz (ver entrevista), que garante que as responsabilidades parentais por mútuo acordo "estão a ser resolvidas pelos tribunais em cinco dias" enquanto nas conservatórias podem demorar meses.
Depois da apreciação, pelo conservador, do acordo a que pai e mãe chegaram, o processo é enviado ao Ministério Público junto do tribunal competente, para que este se pronuncie sobre o mesmo em 30 dias. No espírito do legislador esteve a ideia de agilizar os processos e retirá-los dos tribunais, já tão entupidos com casoss. "Não raro, o Ministério Público opõe-se aos acordos a que chegam os pais em matéria de responsabilidades parentais. Às vezes os procuradores são defensores de uma determinada teoria, por exemplo a de alegar que a guarda partilhada é que é boa, e contestam o acordo", adianta o advogado. Fernando Silva garante que já passou por várias situações destas. "Lembro-me de um casal que representei que se entendeu perfeitamente quanto aos dois filhos. Um deles até comprou um apartamento na mesma rua em que o outro morava para que as crianças passassem facilmente 15 dias numa casa e 15 dias noutra. Quando o acordo chegou ao Ministério Público, este entendeu que as duas crianças, de cinco e sete anos, não podiam andar na casa de um e de outro. Modificou-se o acordo para satisfazer o MP e as crianças ficaram a viver com a mãe e a ir de fim de semana com o pai. Mas na prática o casal organiza-se como tinha decidido antes".
"A lei é boa se houver acordo"
Paula Ferreira, 38 anos, profissional na área da Comunicação, resolveu em tribunal a responsabilidade parental sobre o filho em 2008. "Fui dos últimos casos a apanhar a lei que estipulava a guarda das crianças apenas a uma das partes, normalmente à mãe, como foi o meu caso. Ainda assim, foi decidido pelo tribunal de Família e Menores de Lisboa que o poder paternal seria exercido em conjunto pelos progenitores". O filho de Paula tinha então dois anos, hoje tem 10. Se tivesse na altura a possibilidade de agilizar a responsabilidade parental na conservatória, Paula não teria usado essa via. "Eu não me dava bem com o pai do meu filho e só nos restou ir a tribunal. Hoje seria igual. Acho que essa lei é boa se os pais estiverem de acordo em tudo. Mas nem sempre estão. Acredito que essa lei vá facilitar a vida a uma pequena percentagem de casais separados".
Paula teve de contratar uma advogada na altura e pagou 300 euros em taxas de justiça. O tribunal de Família e Menores de Lisboa fixou um regime de visitas para o pai do seu filho.