Marcelo Rebelo de Sousa vai voltar a dar aulas... em Angola. O professor fala aos estudantes da Universidade Agostinho Neto, em Luanda, e da Universidade Mandame Ya Ndemufayo, no Lubango, em encontros onde se espera que faça jus à alcunha de Tio Celito, como afetuosamente ficou conhecido em Angola após a visita de setembro de 2017 para a tomada de posse de João Lourenço. Então, Marcelo tornou-se um herói popular para os angolanos ao distribuir abraços, posar para selfies e não deixar mesmo de tomar um banho de mar na ilha de Luanda..Algo semelhante se espera que suceda agora, havendo mesmo a expectativa em Luanda de que o nível de adesão popular e interação entre o presidente português e os angolanos supere os níveis de entusiasmo verificados em 2017. Na cerimónia de tomada de posse de João Lourenço, Marcelo foi o único governante estrangeiro que não deixou o público indiferente, tendo sido saudado de forma ruidosa quando foi anunciada a sua presença..Nesta visita, uma atmosfera da mesma natureza contribuiria para reforçar a perceção de se estar perante umas relações luso-angolanas distendidas e em vias de total normalização..A própria forma como se inicia a deslocação de Marcelo a Angola sublinha este lado pessoal e afetivo. O presidente português chega a Luanda de forma não oficial na terça-feira, dia 5, para estar presente no 65.º aniversário do seu homólogo angolano..O programa oficial começa no dia seguinte, quarta-feira 6, e termina no sábado, dia 9. Logo na quarta-feira, Marcelo é recebido por João Lourenço na residência oficial, seguindo-se uma conferência de imprensa conjunta. A seguir, o presidente português discursa em sessão solene na Assembleia Nacional..Neste primeiro dia, Marcelo regressa então à vida académica, falando primeiro com estudantes da Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto e, mais tarde, tem outro encontro da mesma natureza, na Universidade Mandame Ya Ndemufayo, no Lubango..Normalização.A leitura em Belém é, precisamente, de que a "normalização corre a todo o pano" e que os quatro dias da visita oficial serão um espelho da visita "ótima sob todos os aspetos" do presidente angolano a Portugal, em novembro de 2018..Logo na primeira conferência de imprensa que o presidente angolano deu em Lisboa, a 23 de novembro, referiu estar-se perante um "novo ciclo" nas relações bilaterais e declarou terem ficado para trás as questões judiciais (o caso Manuel Vicente) e financeiras (as dívidas a empresas portuguesas) que suscitaram um ambiente de tensão entre Portugal e Angola..O próprio Marcelo antecipa aquela conclusão numa das entrevistas concedidas a órgãos de informação angolanos. Em declarações ao semanário Vanguarda, conhecidas ontem, o presidente português classifica como "momento motivador" o atual estado das relações luso-angolanas após "demasiados" anos de "compasso de espera, de adiamento, de falta de mais próximo contacto" entre os dois países. Esta visita, como "cada visita", deve ser "um começo de caminho, não um fim", salientou Marcelo..No momento presente, para o Chefe do Estado português são importantes "apostas mais a prazo, (...) económicas, sociais, culturais e administrativas e institucionais"..Na agenda do presidente constam várias situações a atestar estas apostas: Marcelo estará na quinta-feira, dia 7, num fórum económico luso-angolano em Benguela; na sexta-feira, dia 8, viaja de comboio no mítico caminho-de-ferro de Benguela, entre Lobito e Catumbela, num gesto em que se destaca a importância deste transporte no desenvolvimento de Angola e o papel da presença portuguesa nos seus aspetos positivos; e visita o laboratório de qualidade alimentar em Luanda, área prioritária para Angola e onde os dois países desenvolvem importante cooperação..É também na sexta-feira que Marcelo dá uma receção em Luanda, onde fez questão de integrar um espetáculo musical luso-angolano..Para o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola, João Traça, deve destacar-se "o facto de o ambiente institucional ser bom". Posto isto, "cumpre aos investidores (...) identificar as oportunidades" e partir para projetos específicos. Em paralelo com a distensão e convergência na esfera político-diplomática, como atestado pelas visitas de João Lourenço a Portugal e, antes dele, de António Costa a Luanda, em setembro de 2018, "os níveis de confiança dos empresários estão a melhorar", pensa João Traça, para quem "o amor e o carinho que o presidente Marcelo tem pelo povo angolano" terá equivalente na "forma de receber" de que será alvo na próxima semana. Neste quadro, a visita de Marcelo tem tudo para ficar memorável. Para o presidente... e para as relações luso-angolanas.