Tim Etchells vai questionar convenções em Lisboa
A segunda edição da Bienal Artista na Cidade, dedicada à obra do encenador e artista britânico Tim Etchells, começa na quinta-feira no Teatro Maria Matos, em Lisboa, com a peça As Festas de Amanhã.
Contactado pela agência Lusa, o artista e encenador, que dirige a companhia Forced Entertainment há três décadas, confessou-se "surpreendido" por o grupo fundador continuar junto há tanto tempo.
"Desconstruir e construir é o centro daquilo que temos feito. Questionar o que é o teatro, o que é a performance, tem sido parte principal da nossa atividade. Ao longo de trinta anos tentámos encontrar respostas, e continuamos a fazê-lo", apontou.
Com este coletivo Tim Etchells "gosta de abrir a máquina do teatro, ver como todas as partes funcionam, para depois voltar a montá-la, mas de maneira diferente", explica ao DN Mark Deputter, diretor do Teatro Maria Matos. Já Francisco Frazão, programador de teatro da Culturgest, que em março recebe duas peças dos Forced Entertainment, salienta como Tim Etchells, nas últimas décadas, "tem posto à prova as convenções do teatro". E acrescenta: "É uma atitude quase científica, de testar os limites da forma, de tentar perceber o que é estar em palco, o que é um espectador, o que é um adereço ou um cenário. Não toma por adquirido o que outros encenadores tomam".
Entre janeiro e novembro deste ano, cinco obras de Tim Etchells, duas delas em estreia mundial, e um festival, vão constituir o programa da bienal promovida pela Câmara Municipal de Lisboa e organizada pela Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural (EGEAC), em parceria com oito entidades culturais da capital.
Etchells foi escolhido para apresentar o seu trabalho na Bienal em 2014, após a coreógrafa belga Anne Teresa De Keersmaeker ter recebido o mesmo convite em 2012. "São artistas da mesma geração, o que faz com que tenham um lugar na histórias das artes performativas contemporâneas, não são uma coisa do passado, estão em plena laboração e em períodos muito interessantes do seu trabalho", referiu ainda Francisco Frazão ao DN.
O artista britânico tem vindo a apresentar em Portugal - sobretudo em Lisboa, mas também no Porto - cerca de uma dezena de trabalhos entre 1999 e 2012, o último deles The Quiet Volume/O Volume Sossegado, em maio e junho de 2012, no Alkantara Festival e na Culturgest.
Para Etchells, o convite de Lisboa "é uma oportunidade para apresentar trabalhos durante um ano e desenvolver um diálogo mais profundo com os públicos" em Portugal.
A relação do artista com o teatro é explicada pelo próprio criador através da imagem da criança que, "quando recebe um brinquedo, tanto quer brincar com ele como destruí-lo para ver como funciona".
Esta atitude de desconstrução e construção tem a ver com testar os limites: "Sou fascinado pelo potencial do teatro e em ver como as coisas acontecem através dele. Há uma atração intensa, um abandono, mas também uma desconfiança", disse à Lusa.
Com o título original Tomorrow"s Parties, o primeiro espetáculo da Bienal vai estar em cena no Maria Matos amanhã, sexta-feira e sábado, com dois atores da Forced Entertainment. Em As Festas de Amanhã, dois personagens que conversam sob as luzes de uma feira popular em declínio criam cenários para futuros hipotéticos, construindo pequenas narrativas, ora otimistas ora desesperadas. "A peça tem um esquema extremamente simples. São apenas dois atores, inventando histórias, imaginando como o futuro poderia ser. É quase como stand up comedy, porque é extremamente cómica", explica ao DN o diretor do Teatro Maria Matos.
A peça resulta de uma coautoria de Tim Etchells, Richard Lowdon, Claire Marshall, Terry O"Connor, Cathy Naden e Robin Arthur, com encenação de Tim Etchells e interpretação de Cathy Naden e Robin Arthur.
Questionado sobre a atualidade deste espetáculo, Tim Etchells comentou à Lusa que "na atual conjuntura de crise política e económica, e com as possibilidades tecnológicas, as pessoas estão mais nervosas sobre o futuro".
"As pessoas sentem-se sem poder, frustradas. A combinação de democracia com o capitalismo não oferece as oportunidades para imaginar um futuro. Há uma falta de esperança", concluiu.
A Bienal Artista na Cidade conta, em 2014, com nove parceiros: o alkantara festival, o British Council, o Carpe Diem Arte e Pesquisa, o Centro Cultural de Belém, a Culturgest, a EGEAC, a empresa municipal de Lisboa responsável pela Gestão de Equipamentos e Animação Cultural, o Teatro Maria Matos, o Teatro São Luiz e o Temps d'Images.