A luta contra o cancro tem feito uma evolução notável, porém a doença continua a fazer demasiadas vítimas. Que falta para sermos mais eficazes?.Sendo uma doença crónica, que se prevê crescente nos próximos anos, é preciso educar a população sobre o cancro, potenciar a consciencialização social para sinais de alarme, fatores de risco, percursos de doente e cuidadores. São necessárias mais estratégias do serviço público e privado para diagnóstico precoce, mais recursos humanos, científicos, técnicos e logísticos, equipas multidisciplinares para lidar com a complexidade da doença e terapêuticas associadas..O investimento público e o privado são essenciais neste processo? .O tratamento do cancro é uma causa que deve ser de todos e todos somos poucos para o combater. Todas as entidades de saúde, públicas e privadas, devem investir na melhoria dos serviços, no reforço da qualidade clínica, em serviços complementares que continuem a apoiar o doente, mesmo depois do cancro. O investimento na investigação é fundamental, assim como a prevenção..O Instituto CUF de Oncologia (ICO), que dirige, tem investido fortemente na investigação e tratamento. .O cancro é uma doença muito complexa que necessita de investigação. É por isso que, a par de tendências atuais e guidelines internacionais, o ICO tem feito um grande investimento na investigação. Acreditamos que este é o caminho certo. Temos investido sobretudo em ensaios clínicos em áreas prioritárias como cancros do pulmão, mama, próstata, cabeça e pescoço. O objetivo é melhorar os resultados do tratamento destas doenças e procurar forma de as prevenir. É essencial que as pessoas tenham conhecimento destes ensaios clínicos e procurem saber, junto dos seus médicos, se podem e devem participar neles..As parcerias com universidades, sobretudo na investigação, podem crescer?.Os médicos devem estar lado a lado com os cientistas, não trabalhar isoladamente. Temos vários projetos de investigação a decorrer no ICO: uns da responsabilidade das nossas equipas clínicas, outros em parceria com instituições de investigação, nomeadamente com o CEDOC - Chronic Diseases Research Center, da Nova Medical School, o Centro Clínico Académico de Braga e a Universidade do Minho. Estas parcerias permitem criar conhecimento ao nível do diagnóstico e tratamento, gerador de alternativas diagnósticas e terapêuticas, como novos mecanismos da ação de fármacos. Mas também permitem a formação de profissionais diferenciados..Mais parcerias, nomeadamente em coordenação com o IPO, seriam vantajosas, até no que respeita a exames técnicos modernos não tradicionais?.As parcerias na investigação na área do cancro são vitais. As instituições que atuam no âmbito da doença oncológica, seja no tratamento seja na investigação ou a nível académico, devem trabalhar em conjunto para partilhar conhecimento e potenciar sinergias dos recursos existentes. O ICO está disponível para cooperar com o Serviço Nacional de Saúde. A nossa aposta na tecnologia e investigação trará todas as vantagens a doentes e entidades que nos procurem. Também ao nível da formação superior e da investigação, os investigadores do ICO, que desenvolvem projetos em universidades, trabalham em equipa com médicos da CUF ou do SNS..Que novos tratamentos estão em experimentação, em Portugal e lá fora?.Há cerca de 15 anos, fizemos novas descobertas sobre a biologia molecular dos tumores e isso permitiu-nos desenvolver terapias mais específicas, terapias dirigidas. Há dois anos percebemos que a célula tumoral não está sozinha nem atua isolada. A célula tumoral interage com todo o organismo, com todo o ambiente e até o sistema imunitário. E o conhecimento desta realidade abriu portas à era da Imuno-Oncologia. O conhecimento dos últimos anos mostra que os conceitos de multidisciplinaridade, multimodalidade, em associação com terapias dirigidas e a imunoterapia são os aspetos que realmente representam a inovação dos últimos anos na abordagem e conhecimento sobre o cancro. E são os aspetos que permitem melhorar o prognóstico dos doentes com cancro. Os ensaios clínicos mais promissores lá fora e em Portugal têm que ver com terapêuticas dirigidas - não de quimioterapia convencional, mas com fármacos da área da Imuno-Oncologia..A aposta na prevenção é prioritária..O diagnóstico precoce pode salvar os doentes. Os programas de prevenção e rastreio são muito importantes. O ideal seria detetarmos o risco de desenvolvimento da doença antes de ela estar presente. No entanto, a aplicação destes programas tem de ser analisada de forma sistemática. Há excelentes programas de rastreio em vários países, incluindo aqui, nomeadamente para o cancro do colo do útero, da mama e do cólon, da próstata e do pulmão. Todavia, não existem para outros tipos de tumores. Nos próximos anos, quando entrarmos na era do diagnóstico molecular, vamos conseguir antecipar o diagnóstico do cancro em muitos doentes. Contamos ter testes que nos permitam identificar células no sangue que sugerem maior propensão ou a presença de doença pré-maligna. A realização de testes genéticos permitirá identificar marcadores da doença antes de estar instalada..Há cancros mais agressivos ou simplesmente mais difíceis de detetar?.Há as duas coisas. Nos tumores mais agressivos é mais difícil criarem-se, à partida, programas de diagnóstico precoce, mas no caso de tumores biologicamente não agressivos, que se apresentam já em estádios avançados, o objetivo é cada vez mais investir no diagnóstico precoce para evitar o insucesso no tratamento.