Temer é acusado de corrupção e está nas mãos dos deputados
Tal como há um ano e meio, a Câmara dos Deputados do Brasil vai voltar a decidir se derruba ou não um presidente da República. Michel Temer, do PMDB, foi na madrugada de ontem formalmente acusado pelo procurador-geral da República (PGR), Rodrigo Janot, de corrupção passiva por ter recebido através de um dos seus assessores, Rocha Loures, "vantagem de 500 mil reais" do empresário Joesley Batista. O processo, entretanto entregue no Supremo Tribunal Federal (STF) ao relator do caso, Edson Fachin, passa depois para a Câmara dos Deputados, onde o governo tem de convencer 172 (um terço) dos 513 deputados a arquivá-lo. Caso contrário, pode cair.
É a primeira vez na história do Brasil que um presidente no cargo é acusado de cometer um crime comum - Collor de Mello também foi denunciado por corrupção em 1992 mas já depois de ter sido afastado.
De acordo com Janot, o presidente recebeu o dinheiro "consciente" e "valendo-se de sua condição de chefe do poder executivo". Diz também o PGR que Temer e Loures "ainda aceitaram vantagem indevida no montante de 38 milhões de reais", razão pela qual pede que sejam condenados a pagar dez e dois milhões de reais, respetivamente, por danos morais ao país. O PGR deve acrescentar nos próximos dias denúncia por obstrução à justiça e organização criminosa, tendo em conta o relatório da Polícia Federal (PF) nesse sentido.
Janot baseou-se em provas de áudio e vídeo: Loures, ex-assessor especial do presidente, apareceu numa filmagem a transportar uma mala com dinheiro entregue por um executivo da JBS, empresa cujo dono, Batista, foi recebido na residência oficial de Temer para tratar da negociação do silêncio de um deputado e contar que subornou um juiz, entre outros crimes, numa conversa gravada.
Horas antes de o PGR apresentar a acusação, o presidente da República dissera estar firme. "Nada nos destruirá, nem a mim nem aos nossos ministros."
Na Câmara dos Deputados, para onde o foco se desloca a partir de agora, Alessandro Molon, do oposicionista Rede, considerou "muito consistentes" as acusações contra o presidente. Pauderney Avelino, do DEM, da base aliada do governo, disse que Temer "está ansioso para mostrar a sua inocência".
O editorialista da TV Globo Alexandre Garcia notou que o governo tem pressa de votar porque "à medida que o tempo passa, vai perdendo votos". Em causa, a pressão da opinião pública contra o presidente mais rejeitado desde José Sarney, no final dos anos 1980, com apenas 7% de aprovação, a aproximação de eleições diretas (outubro de 2018) quando estar atrelado ao governo e às suas reformas impopulares pode custar votos.
Em tese, a base de apoio de Temer na Câmara supera os 172 votos necessários para interromper o processo. Mas na prática, o PSDB, no poder, por exemplo, divide-se. Fernando Henrique Cardoso, presidente de honra do partido, assinou artigo no jornal Folha de S. Paulo em que pede a Temer para ter "a grandeza de abreviar o seu mandato". Cardoso foi criticado pelo Planalto e por membros do seu partido, uma vez que uma renúncia precipitaria eleições diretas e, nesse caso, os maiores beneficiados seriam Lula da Silva, do PT, Jair Bolsonaro, do PSC, e Marina Silva, do Rede, que lideram as sondagens.
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