TC dá luz verde a Interpol e Europol fora da PJ. Marcelo promulga diploma

Marcelo Rebelo de Sousa afirma que com a decisão dos juízes "no sentido da não inconstitucionalidade" do decreto "ficam, deste modo, ultrapassadas as dúvidas quanto à certeza jurídica do regime aprovado, que estiveram na origem da ampla divisão na votação no parlamento".
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O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgou esta segunda-feira o decreto do parlamento que reestrutura o Ponto Único de Contacto para a Cooperação Policial Internacional, na sequência do acórdão do Tribunal Constitucional (TC), que dá luz verde ao diploma que retira Interpol e Europol da esfera da Polícia da Judiciária (PJ).

O presidente do Tribunal Constitucional, João Caupers, declarou, em conferência de imprensa, na sede do TC, em Lisboa, que analisadas as duas normas em causa, decidiu "não se pronunciar pela inconstitucionalidade".

Segundo adiantou João Caupers, os artigos analisados "alteram, respetivamente, a Lei de Organização da Investigação Criminal e a Lei de Segurança Interna".

"As mudanças mais significativas traduzem-se, por um lado, na integração das unidades de cooperação internacional dos órgãos de polícia criminal no quadro do Ponto Único de Contacto-Cooperação Policial Internacional, que passa a ser o centro operacional responsável pela coordenação da cooperação policial internacional. Por outro lado, as competências do Ponto Único de Contacto são alteradas e ampliadas", acrescentou o presidente do TC sem dar mais explicações.

Em causa estaria a separação de poderes, depois de vários partidos com assento parlamentar terem acusado o Governo de tentar controlar o aparelho do Estado, ao colocar a Interpol e a Europol sob a dependência do Governo.

A devolução do decreto ao parlamento foi anunciada através de uma nota no sítio oficial da Presidência da República na Internet logo depois de o Tribunal Constitucional ter divulgado que decidiu não se pronunciar pela sua inconstitucionalidade.

Marcelo Rebelo de Sousa afirma que com a decisão dos juízes "no sentido da não inconstitucionalidade" do decreto "ficam, deste modo, ultrapassadas as dúvidas quanto à certeza jurídica do regime aprovado, que estiveram na origem da ampla divisão na votação no parlamento".

"Na sequência da decisão do tribunal, o Presidente da República, que agradece a celeridade da decisão, decidiu, nos termos constitucionais, promulgar o decreto em causa", acrescenta-se na mesma nota.

Com origem numa proposta do Governo, o decreto que Reestrutura o Ponto Único de Contacto para a Cooperação Policial Internacional foi aprovado na Assembleia da República em votação final global em 27 de outubro com votos a favor do PS e votos contra de todos os restantes partidos: PSD, Chega, Iniciativa Liberal, PCP, BE, PAN e Livre.

O chefe de Estado anunciou o envio deste decreto para o Tribunal Constitucional em 17 de novembro, "dado tratar-se de matéria relativa a direitos fundamentais, que causou a divisão a meio do parlamento, por razões políticas e constitucionais" e "com o objetivo de certeza jurídica".

Na carta enviada ao Tribunal Constitucional, Marcelo Rebelo de Sousa pediu a fiscalização da constitucionalidade das normas deste decreto, que alteram o artigo 12.º da Lei de Organização da Investigação Criminal e o artigo 16.º da Lei de Segurança Interna, por violação "do princípio da separação de poderes" e "da autonomia do Ministério Público no exercício da ação penal" salvaguardados na Constituição.

Na fundamentação do seu pedido, o Presidente da República realçou que de acordo com este decreto o Ponto Único de Contacto para a Cooperação Policial Internacional (PUC-CPI), "fica concentrado na figura do secretário-geral do Sistema de Segurança Interna" - que nos termos da respetiva lei funciona na direta dependência do primeiro-ministro ou, por sua delegação, do ministro da Administração Interna.

"Na ausência de uma ressalva expressa, coloca-se a questão de saber, sem que isto implique qualquer juízo relativamente às personalidades que exerçam ou venham a exercer as funções de secretário-geral do Sistema de Segurança Interna, se uma tal concentração se pode traduzir, no futuro, no acesso a informações relativas a investigações criminais em curso e a matéria sujeita a segredo de justiça, o que violaria o princípio de separação de poderes", apontou.

Marcelo Rebelo de Sousa salientou que "a autonomia do Ministério Público em matéria de investigação criminal encontra-se constitucionalmente protegida no artigo 219.º da Constituição" segundo o qual "compete ao Ministério Público exercer a ação penal orientado pelo princípio da legalidade e defender a legalidade democrática".

Na opinião do chefe de Estado, "a concentração dos poderes" relativos ao PUC-CPI "na figura do secretário-geral" do Sistema de Segurança Interna "poderá vir potencialmente a atingir esta competência do Ministério Público, assim violando a sua autonomia constitucionalmente protegida".

O Presidente da República mencionou na carta ao Tribunal Constitucional que esta alteração legal surge na sequência de uma recomendação europeia sobre o intercâmbio de informações.

"Como se compreende, uma indefinição conceptual não pode manter-se numa matéria com esta sensibilidade, em que se exige a maior certeza jurídica possível, tanto mais que está em curso a quarta Avaliação Schengen ao Estado português, cujas missões programadas de avaliação decorrerão, previsivelmente, até março de 2023", considerou.

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