Tate: a "catedral do cool" cresceu
museu de arte moderna mais popular no mundo inteiro - a Tate Modern, em Londres - abriu ao público, ontem de manhã, um novo edifício. A extensão, de 11 pisos, é uma impressionante torre retorcida de tijolo que se desdobra desde o solo até se fundir no bloco principal do museu. O novo edifício, a Switch House, foi desenhado pelos suíços Jacques Herzog e Pierre de Meuron, os mesmos arquitetos que no final da década de 90 já tinham assinado a conversão da antiga central elétrica de Bankside, na margem sul do Tamisa, num museu de arte moderna que é uma verdadeira "Catedral do "Cool"", admirada no mundo inteiro.
A Switch House foi construída num terreno ocupado antigamente pelos reservatórios de petróleo da central. A extensão acrescenta cerca de 22 mil metros quadrados ao museu e faz aumentar a área global da Tate Modern em cerca de 60 por cento.
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Apenas quatro dos 11 pisos estão presentemente ocupados por exposições arrumadas em galerias, meias-galerias, salas ou antecâmaras. No piso 0, os três reservatórios foram convertidos em áreas enormes subterrâneas destinadas, sobretudo, à participação e interação dos visitantes com a arte. Os pisos estão ligados de forma surpreendentemente elegante por escadarias de betão, em espiral. As janelas muito grandes, o chão em carvalho tosco e os tetos muito altos transformam a Switch House num espaço estranhamente acolhedor. "Um dos objetivos [da Switch House] é tornar a arte mais participativa, proporcionando áreas para descansar, para colaborar, para interagir", explica Frances Morris, diretora da Tate Modern desde Janeiro passado. Existem ainda cafés, um restaurante, escritórios, centros educativos e um espetacular terraço panorâmico com vista sobre a cidade.
O museu tem em exposição, atualmente, 800 peças originais de 300 artistas. A lista de artistas expostos na Switch House e no bloco original da Tate Modern - agora rebatizado "Boiler House" - inclui um número recorde de mulheres. Elas ocupam, aliás, metade das salas dedicadas a um único artista. No piso 3 da Switch House, por exemplo, uma sala é ocupada pelas obras da alemã Rebecca Horn. Outra galeria mostra as esculturas surpreendentes da romena Ana Lupas. No piso 4, podem admirar-se alguns dos últimos trabalhos da artista plástica Louise Bourgeois, que morreu em 2010 com 98 anos. "Houve um esforço por reconhecer a contribuição das artistas [mulheres]. Agora há mais equilíbrio", diz ainda Morris.
A diretora sublinha, igualmente, o facto dos artistas expostos serem oriundos de mais de 50 países (infelizmente, nenhum português). "Londres é uma metrópole muito cosmopolita. E nos últimos 50 anos arte muito importante foi criada na América Latina, na Ásia, no Norte de África e no Médio Oriente. Queremos mostrar arte de todo o mundo e não só da Europa e da América do Norte", diz. Uma das peças mais interessantes expostas na Boiler House, por exemplo, é Babel, do brasileiro Cildo Meireles - uma enorme torre circular de rádios analógicos, cada um sintonizado numa estação diferente, criando uma cacofonia de sons contínuos e incompreensíveis.
Descansar na arte
A instalação Tropicália, Penetráveis PN 2 e PN3, de outro brasileiro - Hélio Oiticica (1937-1980) -, inclui um televisor e dois papagaios (vivos) e é uma das mais populares entre os visitantes mais novos. Quase todas as obras exibidas na Switch House foram adquiridas durante o século XXI. Uma parte significativa, aliás, foi criada nas últimas duas ou três décadas e inclui pouca pintura, muitas instalações, vídeos, fotografia e objetos vagamente esculturais. Entre estes contam-se, por exemplo, peças de Ricardo Basbaum onde as pessoas se podem deitar e descansar; uma escultura de Kader Attia feita inteiramente de couscous; e outra, de David Medalla, que produz uma substância que se parece com bolhas de sabão.
Nas galerias do edifício original - a Boiler House está ligada à Switch House por uma ponte -, ainda se podem encontrar, ocasionalmente, uma escultura de Constantin Brancusi, óleos de Mark Rothko ou mesmo um quadro com os nenúfares de Monet - obras que até há pouco tempo eram consideradas unanimemente como "arte moderna". Agora elas parecem ser exceções, em desalinho cronológico relativamente à esmagadora maioria da arte exibida.
Quando a Tate Modern foi inaugurada pela rainha Isabel II, em Maio de 2000, pouca gente sonharia, então, que este museu iria ser revolucionário. Nicholas Serota - mais tarde Sir Nicholas Serota -, o grande motor deste projeto gigantesco, desde 1995, achava que a Tate Modern poderia atrair, talvez, dois milhões de visitantes por ano. Esta estimativa foi furada - e de que maneira - logo no primeiro ano, com o registo de 5,25 milhões de entradas.
Joia da coroa cultural
Desde então, cerca de cinco milhões de visitantes passam todos os anos pelas portas da Tate Modern, enchendo a monumental Sala das Turbinas - uma área sem fim, com 155 metros de comprimento e 35 de altura - com uma multidão curiosa e cosmopolita. Nesta sala, onde antigamente se gerava a eletricidade que alimentava os candeeiros das ruas da capital - e as torradeiras e os televisores a preto e branco das casas dos londrinos, nas décadas de 50 e 60 -, pode admirar-se, agora, uma instalação do chinês Ai Weiwei, uma "árvore" de quase sete metros de altura construída com enormes pedaços de troncos, raízes e ramos secos e sem vida.
Iniciada no final do século XIX com a fortuna e com a coleção de quadros do magnata do açúcar Henry Tate, a Galeria Tate, em Millbank - na margem norte do Tamisa -, dedicou-se, originariamente, a reunir a melhor arte britânica produzida após o século XVI. Em 1916, a Tate estendeu os seus objetivos e começou a colecionar, igualmente, arte moderna estrangeira. Os primeiros anos foram tímidos, mas as aquisições, nas décadas de 80 e 90 fizeram duplicar o número de peças do século XX. A falta de espaço disponível no palácio oitocentista de Millbank despoletou o projeto de um grande museu nacional de arte moderna, que até 2000 nunca existira na capital britânica.
A escolha recaiu, então, sobre a central elétrica de Bankside - uma verdadeira montanha de tijolo, monolítica, comprida e escura, com uma enorme chaminé, no outro lado do rio -, desenhada em meados do século XX por Sir Giles Gilbert Scott, o arquiteto da ponte de Waterloo e da catedral de Liverpool (e, já agora, das famosas cabinas telefónicas vermelhas espalhadas pelo país). Essa montanha de tijolo, após duas conversões (2000, 2016) assinadas pelo génio dos arquitetos suíços Herzog e de Meuron, transformou-se, entretanto, numa verdadeira joia da coroa da vida cultural do país.