"Só disse que [um segundo resgate] seria o pior dos cenários"

Comissário alemão Günther Oettinger veio ontem a Lisboa falar de Mercado Único Digital. Antes alertou no Parlamento para os perigos de um segundo resgate. Conversa com deputados tornou-se pública porque passou na AR TV
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Queria perguntar-lhe sobre declarações que fez nesta manhã [ontem de manhã] acerca de um segundo resgate a Portugal. O Parlamento Europeu discute hoje [ontem] com a Comissão Europeia a possível suspensão de fundos ao país caso o governo português não respeite o Pacto de Estabilidade. Como comissário europeu, concorda com a aplicação deste tipo de sanções e acha que acabarão por ser propostas pela Comissão?

É um processo em curso. Não é nada contra Portugal. É um papel europeu há vários anos. Durante os anos da crise, criámos garantias, decididas por todos os membros do Conselho [Europeu], que disseram ser necessários instrumentos europeus para ter algum poder na verificação e no controlo das obrigações a serem cumpridas. A Comissão tem a obrigação de estar ativa. Até 15 de outubro todos os Estados deverão apresentar a sua proposta de Orçamento para 2017. Depois esperamos para ver, mas estou otimista pelos contactos aqui. Não foi isso que me trouxe aqui, mas como membro da Comissão isso faz parte do contexto entre os portugueses e as instituições da União Europeia [UE]. Estou otimista de que o governo tem vontade e será capaz de cumprir as suas obrigações e os compromissos para o próximo Orçamento. Não ambicionamos impor sanções.

Mas pensa que Portugal pode estar próximo de outro resgate?

Não. Só disse que esse seria o pior dos cenários. Estados membros como Portugal, Grécia ou outros, que estiveram sob resgate, criticam com frequência a Comissão. Ao mesmo tempo, ouvimos vozes críticas de outros Estados membros que dizem que não estamos a controlar de forma suficiente os Orçamentos de Portugal e de outros. Somos criticados por ambos os lados. Com argumentos diferentes. Então o que digo é que temos de fazer tudo para evitar qualquer desenvolvimento que pudesse levar a um segundo pacote. Todas as medidas precisam de um acordo com todos os membros da Zona Euro.

Durante a crise, vimos o problema do controlo dos Orçamentos, mas também o do controlo dos bancos. Olhando para o seu país, a Alemanha, acha que a situação do Deutsche Bank irá requerer uma intervenção do governo?

Acho que não. O CEO disse claramente que não é necessária ajuda do governo alemão. E eu acredito nele. O Deutsche Bank, um ator global, está numa situação difícil, mas o desfecho do caso nos EUA... ouvimos falar em 14 mil milhões [de multa] e agora em mais ou menos cinco mil milhões, o que pode ser um desenvolvimento positivo. Penso que o Deutsche Bank poderá equilibrar-se utilizando os seus próprios instrumentos.

Veio a Portugal falar sobre o Mercado Único Digital. Olhando para o brexit, que impacto teria aí a saída do Reino Unido da UE?

O nosso Mercado Único Digital é dirigido a todos, mas há regras importantes a cumprir: liberdade de circulação de produtos, de serviços, de capital e de pessoas. Não se pode dizer eu quero isto, isto e isto, mas não quero aquilo, aquilo e aquilo. Não. Ou se aceita todo o pacote ou se fica fora dele.

Disse no passado que o brexit será uma oportunidade para revitalizar a UE. Mas a verdade é que há muitos problemas na UE. Como comenta, por exemplo, o resultado do referendo de domingo na Hungria sobre as quotas dos refugiados?

Ficou claro: 40% não foi suficiente, logo não é vinculativo. Foi um referendo político, populista, talvez suficiente para Viktor Órban [o primeiro-ministro da Hungria] estabilizar a sua posição, mas não foi uma mensagem política para a UE. Viktor Orbán falhou.

Jean-Claude Juncker escolheu-o para substituir a comissária Kristalina Georgieva, agora candidata a secretária-geral da ONU. Acha-a melhor opção do que o português António Guterres?

Guterres é experiente e competente. Mas, numa dimensão global, há regiões e uma dessas regiões é a da ex-União Soviética e os seus aliados, ou seja, a região da Europa Central e de Leste. Ban Ki-moon e todos os seus antecessores foram eleitos numa base de competência e de enquadramento regional. Nenhum candidato dessa região conseguiu chegar a uma posição de sucesso, nem a candidata búlgara Irina Bokova nem ninguém. E cada vez mais os Estados membros dizem que devia ser uma mulher, para se enviar um sinal. O candidato de Portugal é perfeito, mas é um homem e Portugal está na fronteira ocidental da Europa...

Muita gente pergunta então porque Georgieva não se apresentou desde o início?

Porque é preciso ser um país a apresentar a candidatura. A Bulgária apresentou há muito a senhora Bokova, mas depois viu-se que ela não tinha hipóteses.

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