Sérvios elegem Presidente com o Kosovo à espreita

Hoje, votam todas as Sérvias; não só Belgrado
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"5 de Outubro - 3 de Fevereiro", em letras gigantes. A faixa, comparando o dia da queda de Milosevic a este domingo, é a frase que resume uma das metades da campanha para a segunda volta. "Nunca mais, nunca mais", e - repetiu o actual Presidente, Boris Tadic - "nunca mais a Sérvia pode ser o país da guerra, do isolamento e do ódio. A Sérvia é um país maravilhoso nos Balcãs e na Europa". Entre as bandeiras, vi apenas uma da União Europeia e meia dúzia da "Otpor" (o antigo movimento "Resistência", anti-Milosevic). Aleksandar segura uma delas. Aos 30 anos ele vê "dois caminhos, como em 2000. Não sei o que aconteceu às pessoas, parece que estão adormecidas".

Há também quem metaforize que este 3 de Fevereiro é um referendo de adesão à UE. Entre jovens apoiantes de Nikolic, à entrada da enorme Beogradska Arena para o último comício, a pergunta não faz sentido: "Com qualquer dos candidatos vamos para a União Europeia. Porque é que eles não falam com o Partido Radical? Na Croácia têm o HDZ (partido no poder) que é igual". "Não, é pior", acrescenta outro apoiante. Dentro do recinto, muita música, o hino, Marija Serifovic cantando a molitva (pregão de amor) que ganhou o Festival da Eurovisão, "Tomo! Tomo! Tomo!" e, na euforia, Tomislav Nikolic pergunta: "Será que eu não quero o investimento? Os valores europeus? Só exijo uma pequena coisa à União Europeia: não toquem no Kosovo e Metohija". Entre as palmas ouviu-se "porque somos um povo orgulhoso". E continuou: "Vamos abrir as portas da nossa casa. Não preciso de assegurar-vos que a Rússia está connosco!". No fim, caíram centenas de balões azuis, vermelhos e brancos sobre a fotografia gigante de um sorridente Nikolic. Muita arte de campanha, que teve conselhos de uma empresa… americana, Queen Gilespi. Conta-se que a primeira coisa que disseram ao candidato foi para sorrir, tirar o crachá de Seselj (preso em Haia e ainda líder do partido) e para trazer a família para a campanha. Assim foi. Os balões rebentavam e, lá fora, alguns homens já desmontavam as bancas onde se vendiam, entre bandeiras e outros símbolos, T-shirts com Mladic e Karadzic e calendários com os "heróis de guerra".

Hoje, votam todas as Sérvias, não só Belgrado: "Aqui metade do gás já é russo", aponta Radoslav para a janela, em Gorni Milanovac, enquanto na TV passa imagem de Tadic com Putin. "Nacionalismo e identidade nacional não são o mesmo", diferencia Olga, na vizinha Kragujevac, cidade da "falecida Zastava", a fábrica de automóveis da velha Jugoslávia , onde trabalha o marido, Marko, que explica: "Os Balcãs são um cruzamento. Os russos tanto gostaram de nós como sempre tiraram partido disso. Eles têm medo que o Ocidente tome o controlo". E o Kosovo? "Está perdido, os vencedores escrevem a história" diz Olga. "Não, não está", responde Marko. "Só queremos que a nossa filha possa viajar livremente pela Europa", conclui Olga: "Tenho medo que Tadic seja demasiado aberto para o Ocidente e Nikolic é um lobo que muda o pelo mas não muda a cabeça".

Na corda bamba do empate técnico das sondagens, o primeiro-ministro, que venceu Milosevic em 2000, declarou que "cabe a cada eleitor decidir". Assim, o conservador Kostunica tornou-se no joker de hoje.

O ás de trunfo que os dois candidatos queriam era Novak Djokovic, o primeiro sérvio a vencer um torneio de ténis do Grand Slam, na Austrália. O jovem tenista de 20 anos adiou o regresso ao país para ontem, para evitar colagem. "Nole, Nole!" (alcunha), gritavam milhares de pessoas. Uma multidão assim justifica-se num país carente de notícias positivas, sublinha Milos, da geração de Nole: "Ele fez um excelente trabalho pela Sérvia. Fomos famosos nas notícias, por coisas más, como a guerra, e ele faz-nos famosos por uma coisa boa, como o desporto. Há cinco anos não sabia as regras do ténis". E vocês foram a algum comício? "Não ligamos a política", responde Milos. O resultado "é imprevisível, depende de cem mil votos", remata Dusan. "Vamos à Kladionica apostar…". Estas casas de apostas multiplicaram-se, muitas vezes associadas à lavagem de dinheiro. Dusan serve a última sondagem, sem empate técnico: "Um euro em Tadic, em caso de vitória, vale 1,40 euros. E um euro em Tomo vale 2,50". Aceitam-se apostas…

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