Salários e estatuto da nova Agência de Migrações motivam críticas da oposição

O constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia considera que os dirigentes da APMA "não terão um trabalho de risco e complexidade superiores aos cargos nas Polícias". Entende por isso que uma remuneração superior "é inconstitucional no plano da violação do princípio de igualdade".
Publicado a
Atualizado a

O estatuto de "gestor público" para os dirigentes máximos (diretor e dois vogais) da futura Agência Portuguesa para as Migrações e Asilo (APMA), que vai herdar as funções administrativas do SEF, merece o chumbo de partidos à esquerda e à direita da oposição.

Conforme o DN noticiou, segundo uma proposta de decreto-lei que está a ser debatida no Governo, a APMA será um "instituto público equiparado a entidade pública empresarial" e aos "membros do conselho diretivo será aplicável o estatuto de gestor público, para efeitos remuneratórios".

Quer isto dizer que o salário do presidente pode chegar aos 8000, bastante superior (não o dobro, como o DN tinha erradamente noticiado) aos dos diretores nacionais da PJ (mais 25%), da PSP (mais 37%) e do comandante-geral da GNR (mais 56%) -as forças de segurança que vão cumprir todas as funções policiais do SEF.

O constitucionalista e presidente do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), Jorge Bacelar Gouveia, mostra-se surpreendido com as opções do executivo. "Primeiro, a nova entidade é administrativa e não pode ser empresarial. Segundo, os seus dirigentes não terão um trabalho de risco e complexidade superiores aos cargos nas Polícias. Logo essa remuneração é inconstitucional no plano da violação do princípio de igualdade".

O BE, único partido que votou ao lado do PS a "reestruturação do SEF", que ditou a extinção desta polícia, diz que aguarda o "diploma oficial para a criação da APMA". No entanto, salienta o porta-voz da bancada parlamentar, considera que "seria incompreensível que o Governo usasse a APMA para a criação de mais salários milionários de gestores, num contexto em que recusa fazer o aumento que os trabalhadores da Administração Pública exigem".

Também à esquerda, o PCP é veemente na crítica: «Independentemente da posição que se possa ter em relação à criação de uma agência para as migrações, não há razão nenhuma para que esta função seja desempenhada por uma entidade de natureza empresarial nem que os seus dirigentes tenham um nível salarial diferente do que se aplica à generalidade dos dirigentes da Administração Pública. A confirmar-se a notícia do DN de que o governo tenciona aplicar a esses dirigentes o Estatuto Remuneratório do Gestor Público, o PCP manifesta a sua oposição a esse propósito", assinala fonte oficial do grupo parlamentar.

O PSD aprofunda as críticas e classifica de "uma falta de respeito incompreensível" a criação de "uma entidade que soçobra dos despojos do SEF, entidade essa que assegura tão somente o alcance administrativo do SEF e atribuir aos seus dirigentes condições remuneratórias muito superiores do Diretor Nacional da PSP, do Comandante Geral da GNR ou do Diretor Nacional da PJ".

O deputado André Coelho Lima assinala que estes "que vão ficar com a "parte de leão" do trabalho policial do SEF valem, aos olhos do Estado, menos que os dirigentes da nova estrutura (pelo menos em termos remuneratórios que é a expressão da valia que se atribui a um agente público) ".

No seu entender, isto "é de uma falta de bom senso primária, demonstrativa da desconsideração que o Governo manifesta perante aqueles que, desde sempre, têm sido os responsáveis pela segurança do nosso país e dos nossos cidadãos e que agora assumem as competências do SEF. Aqueles que dizem sempre presente como mais uma vez o fizeram na questão do SEF, todos se disponibilizando para assumir as competências que estavam atribuídas ao SEF. E a gratidão que têm do Governo é esta: remunerar superiormente os dirigentes de uma estrutura que ainda nem nasceu, em amplo desrespeito por aqueles que sempre têm estado ao nosso serviço".

Coelho Lima, que é membro efetivo da 1ª Comissão da Assembleia da República, lembra que "o Sistema de Segurança Interna (SSI) é, como do próprio nome resulta, um sistema: um conjunto encadeado e o mais possível harmonizado de estruturas" e "com esta decisão insensata, o Governo demonstra que é o principal responsável por ver o SSI não como um sistema orientado e estruturado mas como uma manta de retalhos. Quando é a própria tutela que desestrutura o sistema, não pode ser exigido esse cuidado dos seus agentes".

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt