Ruth Bader Ginsburg morreu e a batalha política já começou

Republicanos estão prontos para substituir Ginsburg no Supremo Tribunal o mais rapidamente possível, Democratas querem esperar pelas eleições presidenciais de 3 de novembro.
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Poucos dias antes de morrer, Ruth Bader Ginsburg disse: "O meu maior desejo é não ser substituída antes de um novo presidente tomar posse."

Infelizmente, o seu desejo pode não se concretizar. A juíza do Supremo Tribunal dos Estados morreu esta sexta-feira, aos 87 anos, devido a complicações do cancro no pâncreas, a um mês e meio das eleições presidenciais marcadas para 3 de novembro, nas quais o atual presidente republicano Donald Trump vai defrontar o democrata Joe Biden. E a sua substituição já constitui mais um motivo de discórdia entre os dois partidos americanos.

O Supremo Tribunal dos Estados Unidos é composto por nove juízes, nomeados pelo Presidente. Os cargos são vitalícios e os juízes têm o poder de mudar as leis do país. O seu papel é sobretudo notado pela opinião pública quando estão na mesa temas mais polémicos, como o aborto, os direitos dos imigrantes, a privacidade, a pena de morte ou a posse de armas.

Até aqui, a mais alta instância judicial dos Estados Unidos integrava quatro juízes progressistas e cinco mais conservadores. No entanto, o atual presidente, John Roberts, votou várias vezes ao lado dos liberais, por exemplo, para proteger pelo menos temporariamente os chamados DREAMers da deportação pelo governo Trump, para defender um precedente importante na lei do aborto e para defender a proibição de grandes reuniões da igreja durante a pandemia do coronavírus.

Mas se Ginsburg for substituída por um juiz ligado aos republicanos, a ala conservadora fica com uma maioria bastante confortável (6-3). Esse é o motivo pelo qual os democratas querem adiar a substituição para depois das eleições presidenciais, deixando assim em aberto a hipótese de a vaga ser ocupada por um juiz mais moderado.

Os magistrados do Supremo Tribunal são nomeados pelo Presidente norte-americano e devem ser confirmados pelo Senado. Atualmente, os republicanos detêm a maioria no Senado e o líder, Mitch McConnell, emitiu já um comunicado, no qual se comprometeu a submeter a votação o candidato que Trump escolher para o Supremo Tribunal.

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Já Joe Biden, o candidato democrata à Casa Branca, afirmou que deve ser o próximo Presidente dos Estados Unidos, eleito a 3 de novembro, a escolher o substituto da juíza do Supremo Tribunal Ruth Bader Ginsburg, que morreu na sexta-feira.

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"Esta noite e nos próximos dias, vamos estar focados na morte da juíza e no seu legado imortal. Mas para que não haja qualquer dúvida, deixem-me ser claro: os eleitores devem escolher o Presidente e o Presidente deve escolher o juiz para que o Senado o considere", afirmou Joe Biden, numa declaração emitida em direto de sua casa no estado de Delaware.

Biden lembrou que em 2016, na sequência da morte do juiz conservador do Supremo Tribunal Antonin Scalia, o líder da maioria republicana do Senado, Mitch McConnell, ignorou o substituto escolhido pelo então Presidente Barack Obama (2009-2017) e não submeteu a sua nomeação a voto, com o argumento que não fazia sentido uma aprovação em ano eleitoral.

Na altura, salientou Biden, faltavam quase nove meses para as presidenciais, enquanto agora faltam apenas 46 dias. "Estamos a falar da Constituição e do Supremo Tribunal. Essa instituição não devia estar sujeita à política", destacou.

Este ano e dada a maioria republicana na câmara alta do Congresso dos Estados Unidos, é possível que o candidato escolhido por Trump tome posse no Supremo Tribunal, se a votação se realizar antes das eleições de novembro.

No seu comunicado a propósito da morte de Ruth Bader Ginsburg, o ex-presidente Barack Obama recordou essa situação, esperando que os republicanos sigam hoje os mesmos princípios adotados em 2016 e não substituam a juíza antes das eleições presidenciais. Obama lembra que um princípio básico da lei e da justiça diária "é que se aplicam regras com consistência, e não com base no que é conveniente ou vantajoso no momento".

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Obama observou ainda que a votação antecipada na disputa presidencial já começou em alguns estados, acrescentando que as questões pendentes no tribunal e esperadas nos próximos anos, têm muitas consequências "para serem preenchidas por qualquer coisa menos do que um processo incontestável".

Por exemplo, logo uma semana depois das eleições, o Supremo Tribunal irá ouvir, pela terceira vez, uma contestação apresentada pelos republicanos ao Affordable Care Act, conhecido como Obamacare. Em 2012, o tribunal manteve a lei com uma votação de 5-4, com Roberts dando o voto decisivo. Mas desta vez, sem Ginsburg, o resultado pode ser diferente.

A notícia da morte de Ginsburg foi divulgada cerca de dez minutos antes de Trump iniciar um comício decisivo em Bedmidji, no estado do Minnesota. Aos jornalistas comentou apenas: "Ela era uma mulher incrível que teve uma vida incrível." O Presidente emitiu depois um comunicado em que elogiava a "mente brilhante" de Ginsberg":

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O Presidente e a magistrada mantinham uma relação difícil, uma vez que - para além de discordarem em muitos assuntos - durante a campanha para as presidenciais de 2016, Ginsburg acusou Trump de ser falso, comentário pelo qual a juíza pediu desculpa e que levou o atual chefe de Estado a pedir a sua demissão.

Bill Clinton, o presidente que indicou Ruth Bader Ginsburg para o Supremo Tribunal em 1993, recordou-a como "uma das juízas mais extraordinárias a exercer". Em comunicado, Clinton disse que Ginsburg era uma "advogada brilhante com um coração carinhoso, bom senso, devoção feroz à justiça e igualdade e coragem ilimitada em face de sua própria adversidade".

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Ginsburg foi a primeira juíza a ser escolhida para o Supremo Tribunal por um democrata em 26 anos, e Clinton disse que os seus anos no tribunal "excederam até suas mais altas expectativas" quando a nomeou. O ex-presidente norte-americano lembrou que as suas opiniões marcantes "promovem a igualdade de género, igualdade no casamento, os direitos das pessoas com deficiência, os direitos dos imigrantes e muito mais".

Também o ex-presidente Barack Obama se referiu à juíza do Supremo Tribunal do país Ruth Bader Ginsburg como uma "litigante implacável e uma jurista incisiva" que inspirou gerações, desde estudantes de direito a líderes. Nas suas palavras, Ginsburg deve ser lembrada por lutar até ao fim da sua vida com "uma fé inabalável na democracia norte-americana e nos seus ideais".

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