Resgate animal nos planos de emergência? Na Amadora é assim desde 2005
O PAN quer a criação de um Plano Nacional de Resgate Animal a incluir no Plano Nacional de Emergência e Proteção Civil. A iniciativa já foi apresentada na Assembleia da República mas não colheu aceitação de todos os grupos parlamentares e caducou com o fim da anterior legislatura. "Agora, a necessidade mantém-se e é por isso que voltaremos a dar entrada com nova iniciativa, com vista a que seja apresentado um plano de resposta eficiente, de abordagem multidisciplinar, com implementação a nível municipal", disse ao DN fonte do grupo parlamentar.
Atualmente em Portugal quando há a necessidade de socorrer um animal a prática comum é acionar o gabinete veterinário do município. Mas há um município que já tem em prática desde 2005 o que o Partido das Pessoas, dos Animais e da Natureza quer ver aplicado em todo o país.
Na Amadora, mesmo não estando estruturalmente integrado na Proteção Civil, o gabinete de veterinária faz parte de uma resposta conjunta. "Quando fizemos o Plano Municipal de Emergência de Proteção Civil demos grande ênfase à parte veterinária", explicou ao DN o comandante da Proteção Civil da Amadora, Luís Carvalho, explicando que "ter um concelho densamente povoado e com um conjunto de situações periódicas que obrigam a acionar os meios veterinários ajudou nessa decisão".
O mapa animal urbano mudou nos últimos anos e houve necessidade de fazer ajustamentos na resposta pública a situações de crise. Os cenários reais, bem como os simulacros, contam sempre com chamado "resgate animal".
Esta doutrina de trabalho articulado ganhou nova importância com o aumento de casos de aparição das vespa velutina (asiática), segundo Luís Carvalho. E, no caso específico da Amadora, também com o elevado número de cavalos em terrenos baldios, que, por vezes fogem e ocupam a via pública tornando-se um perigo para eles e para os outros - e, por inerência, um caso de saúde pública.
Mas o resgate animal não se faz apenas em vida. Há casos em que a situação implica remoção de cadáveres de cães, gatos... ou mesmo um cavalo.
A história do desaparecimento de um cadáver de cavalo foi a que mais intrigou o comandante até hoje. Chamados a uma ocorrência no Casal de S. Vicente, quando chegaram ao local depararam-se com um cavalo morto, na berma da estrada. Por ser um animal de grande porte havia necessidade de acionar outros meios para fazer remoção: "Foi colocado um lençol a cobrir o cadáver e quando as equipas veterinárias voltaram para o remover ele já lá não estava. Nunca me tinha acontecido um cavalo desaparecer no espaço temporal de meia hora e numa zona residencial. E ninguém viu nada. O que nos intrigou, porque não era um gato, era um cadáver de um animal com uns 200 kg, que não dá para pegar ao colo e meter na carrinha. Só ficou lá o lençol. Foi algo muito bizarro."
Foi a natureza variada das ocorrências na zona da Amadora que levou os responsáveis da Proteção Civil municipal a "uma maior polivalência e coordenação com o gabinete veterinário municipal". Quando há um sinistro, "há necessidade de ter na equipa alguém que saiba lidar com os animais e que os socorra também".
Porém sem dúvidas quanto a prioridades: "Quando é preciso dar resposta a situações de catástrofe natural ou humana a prioridade é salvar vidas, mas os animais têm hoje uma visibilidade que não tinham há dez anos e os donos têm ligações afetivas com eles. Percebo que, para certas pessoas, o cão ou o gato seja equiparado a um familiar e, por isso, os meios de socorro são sensibilizados para isso."
Por exemplo, no dia 16 de maio, uma forte explosão num prédio de nove andares provocou o pânico na zona do Casal de S. Brás (Amadora), ficando o edifício inabitável para um ano e fazendo 16 feridos e 39 desalojados. Foram mobilizados 91 operacionais e 32 viaturas das forças de socorro e segurança, incluindo uma unidade de psicólogos do INEM, segurança social para realojar as famílias e um veterinário municipal para apoiar no resgate dos animais domésticos.
No improvisado centro de operações, num salão de festas para crianças, era visível um colete com as palavras "veterinária municipal". Da mesma forma que foi acionada a célula social, com a chamada de assistentes sociais e psicólogos, foi chamada também a veterinária. No caso, Susana Santos. "Havia animais perdidos, assustados, pessoas que não sabiam dos seus animais de estimação. O estrondo da explosão foi enorme e muitos animais ficaram atordoados e, com medo, esconderam-se. Tivemos de montar umas armadilhas com biscoitos para os recolher no dia a seguir", contou ao DN a veterinária municipal, que "felizmente" não teve de dar início a processos de remoção de cadáveres. Já teve de o fazer em outras ocasiões e não foi "nada fácil". A primeira vez que teve de preencher a ficha para uma cremação de um cadáver de animal foi "complicado", mas nada se compara ao cheiro.
Os animais resgatados vão para o Centro de Recolha Oficial de Animais do Município da Amadora , que funciona como lar provisório e só quando não há outra solução. Na maioria dos casos os familiares conseguem acolher também os animais, mas quando uma pessoa tem de ser realojada numa pensão, por exemplo, e não são permitidos animais, então o CROAMA passa a ser opção até ser encontrado um canil ou instituição para o acolher.
Quando as pessoas puderam voltar aos prédio e ir buscar pertences, uma das pessoas só quis trazer o aquário dos peixes. "Para ele tinha um valor inestimável".
"Temos conhecimento que existem municípios que têm equipas de resposta e de resgate de animais, existindo a adaptação de viaturas próprias para o efeito, mas o que se pretende é que exista um plano nacional e capacidade de resposta de todos os municípios, não deixando esta questão à discricionariedade", disse ao DN o PAN, defendendo que o sucesso do plano de resgate depende do planeamento, da formação dos agentes de Proteção Civil e de uma estratégia integrada de coordenação para uma resposta local célere.
Segundo o partido representado na AR pela líder Inês Corte Real, a urgência de um plano de resposta de emergência animal ficou evidente no caso da baleia que encalhou recentemente na Praia da Fonte da Telha: "Assistiu-se à morte terrivelmente lenta de uma baleia que arrojou na praia, sem que sequer estivesse um médico veterinário ou uma autoridade veterinária a acompanhar todo o processo, ou sequer que fossem deslocados meios para o local. Não existia qualquer plano de atuação e, mesmo sabendo que as expectativas de sobrevivência do animal eram baixas, não podemos deixar de perguntar se foi efetivamente feito tudo o que poderia ter sido feito para devolver o animal a águas mais profundas ou para minimizar o seu sofrimento."
isaura.almeida@dn.pt