Multas, despedimento ou prisão. O que espera quem não cumpre a requisição civil

"Dentro da medida do necessário e essencial para assegurar o cumprimento dos serviços mínimos consoante a relevância dos serviços afetados pela greve." É nestes casos que pode ser aplicada uma requisição civil, explica o advogado João Massano. Quem não cumprir pode ser multado, despedido ou incorrer numa pena de prisão.
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Esta quarta-feira, cumpre-se o terceiro dia da greve convocada por dois sindicatos dos motoristas por tempo indeterminado. Desde o primeiro dia que o Governo decretou uma requisição civil, parcial e progressiva, alegando incumprimento dos serviços mínimos decretados em algumas zonas do país. Mas quais são as implicações de uma requisição civil? O DN falou com o vice-presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados, João Massano, sobre o conceito, quem está abrangido por este mecanismo legal e quais as implicações de infringir os serviços mínimos.

O que é uma requisição civil?
"A requisição civil é a possibilidade de, em situações de greve, o Governo requisitar trabalhadores dentro da medida do necessário e essencial para assegurar o cumprimento dos serviços mínimos. É o que está aqui em causa", explica João Massano.

Esta figura só pode ser utilizada quando está em risco o funcionamento de atividades fundamentais. No Decreto-Lei n.º 637/74, que regula a requisição civil, pode ler-se que esta se destina a "perturbações graves da vida social, económica e até política em parte do território num setor da vida nacional ou numa fração da população". Já a cláusula E do artigo 3.º do mesmo documento indica que os serviços que podem ser objeto de requisição civil são os que englobam "a produção e distribuição de energia elétrica, bem como a exploração, transformação e distribuição de combustíveis destinados a assegurar o fornecimento da indústria em geral ou de transportes públicos de qualquer natureza".

Quem está obrigado a cumprir a requisição civil?
Todos os trabalhadores que forem indicados pelas empresas ou pelos sindicatos, independentemente, de estarem ou não em greve. "O que o Governo diz é: isto é o que queremos que seja feito porque entendemos que o interesse público se sobrepõe. Não há direitos absolutos, porque se houvesse a sociedade desaparecia. Nós não podemos fazer o que nos dá na cabeça, porque há limites sociais", refere o advogado.

"O direito à greve é um direito constitucionalmente consagrado, e muito relevante, mas tem limites que têm de ser impostos por alguém. Quem é esse alguém? Tem de ser alguém que zele pelo interesse público, o Governo. O direito será mais ou menos "comprimido" consoante a relevância dos serviços que serão afetados pela greve".

Se chegarmos ao ponto em que é decretada uma requisição civil de 100%, como fica a carga horária dos requisitados?
Durante o ponto de situação sobre a paralisação feito esta terça-feira, o ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Matos Fernandes, afirmou que "ninguém pode ser obrigado a trabalhar para além do seu horário de trabalho". "Aquilo a que chamam oito horas é que não são oito horas: podem ser até 60 horas por semana com uma média de 48 horas ao longo de 4 meses", acrescentou.

Sobre isto, João Massano, diz: "Há um limite máximo que é 200 horas. E esse limite não pode ser ultrapassado".

O que acontece a quem não cumprir a requisição civil?
"Um procedimento criminal por desobediência", interposto pelo Ministério Público, uma vez que se trata de crime previsto no Código Penal. De acordo com o Executivo durante o dia de ontem, foram notificados 11 trabalhadores por incumprimento dos serviços mínimos e outros três estavam ainda por identificar. "Todos alegaram baixa médica", revelou o ministro com a pasta do Ambiente.

As sanções possíveis
O Código Penal prevê uma multa até 240 dias, despedimento por justa causa ou uma pena de prisão até dois anos.

A requisição civil existe desde 1974
O decreto-lei do ministério da Defesa que define a utilização da figura da requisição civil existe desde 1974. "Foi feito em pleno período pós revolucionário, em que era primeiro-ministro o Dr. Vasco Gonçalves. Estamos a falar de algo que foi feito numa altura insuspeita quanto a limitações de direito à greve", refere o advogado.

Desde que existe, já foram decretadas 32 requisições civis em Portugal. A primeira aconteceu em 1976, na sequência de uma greve de enfermeiros. Este ano já foram feitas três requisições civis, contando com esta. As outras incidiram sobre os enfermeiros e sobre os motoristas, durante a primeira greve do setor, que aconteceu em abril.

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