Pessoas afetadas pelo incêndio "estão revoltadas"

"As pessoas mais lesadas" são idosas, "perderam barracões, alfaias" e "continuam sem saber" como fazer, afirmou o presidente da Junta de Freguesia de Vila Facaia
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A Casa Municipal da Cultura de Pedrógão Grande foi pequena para as centenas de pequenos agricultores que procuravam explicações. Durante a sessão de esclarecimento, deu-se voz à frustração contra um processo que dizem ser demasiado exigente.

As queixas começaram antes de a sessão sequer arrancar, que a sala estava apinhada e havia quem não conseguisse ouvir.

Numa plateia composta maioritariamente por idosos, cedo se começaram a ouvir os protestos contra um processo de apoio demasiado complexo e exigente para várias das pessoas afetadas pelo incêndio de Pedrógão Grande, especialmente para quem perdeu mais de 5.000 euros - é exigida uma candidatura a fundos para poder receber apoio.

Quando uma das pessoas afetadas pediu à plateia para levantar o braço quem tivesse na agricultura uma forma de subsistência e não um negócio, a maioria dos participantes acedeu.

"É esta a realidade", apontou um membro da plateia.

O presidente da Junta de Freguesia de Vila Facaia, José Henriques, foi uma das pessoas que deu voz ao descontentamento, recordando que estava a ser exigido demasiado a pessoas que, na sua maioria, são idosos.

"Pessoas de idade, que têm bens para consumo próprio e agora têm de se coletivizar?", disse o autarca à agência Lusa, sublinhando que "as pessoas mais lesadas" são idosas, "perderam barracões, alfaias" e "continuam sem saber" como fazer.

José Henriques, que todos os dias recebe queixas, recordou que para apoios acima de 5.000 euros apenas é dado 50% do valor perdido.

"Algumas pessoas não têm hipótese de fazer um empréstimo. Se for assim como está, desistem de fazer qualquer coisa e os terrenos vão ficar abandonados", realçou, considerando que seria preferível recorrer a outros fundos que não comunitários para garantir mais apoio e dado de forma mais célere e sem tantas exigências.

"As pessoas estão revoltadas", vincou.

A revolta ouviu-se durante a primeira sessão (foi criada uma segunda, face à afluência) e houve até quem nem esperasse pelo fim das explicações da Direção Regional de Agricultura e Pescas do Centro (DRAPC) e saísse a meio, barafustando: "isto é uma palhaçada".

"Nós não somos empresários", realçou um dos participantes - ideia partilhada por muitos.

João Mendes, que ia em representação de familiares, explicou que a maioria "não tem conhecimentos" para fazer uma candidatura a fundos comunitários, criticando o processo por estar desenhado para empresários e não para pessoas que praticam agricultura de subsistência.

"Mesmo para mim, que tenho uma licenciatura, isto não é fácil", vincou.

Nelson Peixoto, da aldeia de Outão, em Pedrógão Grande, contabiliza um prejuízo de "30 a 40 mil euros" e sai com as mesmas dúvidas com que entrou.

"Não percebi absolutamente nada", disse à Lusa Nelson Peixoto, sublinhando que, se lhe derem apenas 50% daquilo que perdeu, não vai conseguir recuperar do prejuízo.

"É pior a emenda que o soneto. Se é para estar a endividar-me, mais vale ir recuperando gradualmente", defendeu Custódio Rosa, de 45 anos, que perdeu árvores de fruto, oliveiras e animais na freguesia da Graça.

Já Domingos Coelho, de 54 anos, sublinha que a agricultura não lhe dava qualquer rendimento e que encontrava no campo um entretém e uma forma de "manter as terras minimamente limpas".

Caso o apoio não seja dado, Domingos antecipa que muitos dos afetados acabem por desistir da produção agrícola, aumentando a área de mato inculto - um dos sinais do abandono a que esta região tem sido votada.

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