Regionalização: uma reforma adiada há mais de uma década

Os adeptos da regionalização apontam a proximidade das populações e uma maior eficácia do investimento local proporcionado por esta reforma administrativa. Críticos defendem que traria ainda mais Estado e burocracia. Certo é que o tema está em banho-maria desde o referendo realizado quase há 15 anos e, ao nível europeu, Portugal surge como o sétimo país menos descentralizado.
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"Concorda com a instituição em concreto das regiões administrativas?" Os 60,87% dos portugueses que a 8 de novembro de 1998 responderam "não" a esta pergunta do referendo sobre a regionalização arrumaram no fundo da gaveta dos sucessivos governos esta reforma administrativa. E se nestes quase 15 anos houve quem moderasse a sua posição crítica em relação a este assunto, o tema continua a ter militantes pró e contra.

Na análise feita ao Estado português em comparação com os parceiros europeus apresentada no estudo "25 anos de Portugal europeu", iniciativa da Fundação Francisco Manuel dos Santos, Portugal surge como o 7.º país menos descentralizado da União Europeia (UE), ainda a 27. No total da despesa pública, a despesa a nível local pesava 14,1%, em 2010 (ver gráfico).

No entanto, Fernando Ruas e Rui Solheiro não têm qualquer dúvida: Portugal só teria a ganhar com um maior investimento público local. "Tem sido esse o discurso da Associação Nacional de Municípios porque o dinheiro público aplicado com maior proximidade é mais reprodutivo", afirmou o presi- dente da Associação, Fernando Ruas. E reforça com um argumento: "As autarquias já são responsáveis por cerca de 50% do investimento público." Por isso, continua, "quanto mais dinheiro for transferido para o poder local, melhor. Com regras clara e bem definidas, claro".

Mas, apesar de considerar que "o País só tem a ganhar com essa maior transferência", o ainda presidente da Câmara de Viseu defende que esta não é a melhor altura para voltar a colocar o assunto na agenda política. "Mas é um dossiê ao qual teremos de voltar, mais dia menos dia, até porque há um conjunto de atribuições previstas na lei, desde 1999, que nunca foram regulamentadas, na área da saúde, da educação e do ambiente, entre outras."

A mesma opinião é expressa ao DN por Rui Solheiro, vice-presidente da ANMP: "Não tenho dúvidas de que o País ganharia com um maior investimento público local. Como o decisor está mais perto dos problemas, pode investir melhor e rentabilizar mais o investimento público." O também líder da autarquia de Melgaço realça outro aspeto: "Esse é o princípio de subsidiariedade proposto pela União Europeia e nós funcionamos precisamente ao contrário. Em muitos outros países, o investimento público regional e local ultrapassa os 50%. E Portugal, que nem tem poder regional, apenas local e central, apresenta um dos mais baixos níveis de investimento público local. É um centralismo exagerado que resulta num desequilíbrio de desenvolvimento regional em que dois terços da população estão num terço do território, com a consequente desertificação de muitas regiões."

E continua: "Só assim se compreende que após quatro quadros comunitários de apoio, que tinham como objetivo a coesão entre regiões, a região norte esteja ainda mais distante das outras regiões. O que demonstra que esta gestão centralizada do investimento público está a funcionar ao contrário do que se pretendia com os apoios comunitários, centrando as decisões na administração central e marginalizando o poder local, o que resulta num modelo de crescimento macrocéfalo que temos."

Mas para os críticos da regionalização, como Artur Santos Silva, "há Estado a mais e as regiões, que implicam uma estrutura pesada, iriam trazer ainda mais Estado, mais burocracia e um convite para a corrupção". Da mesma opinião é o advogado Daniel Proença de Carvalho que considera que as regiões seriam "mais uma instância de poder político e burocrático que, em vez de simplificar, iria complicar".

Os líderes das duas principais autarquias nacionais não falam em sintonia sobre este tema. Em fevereiro, na conferência "A Soma das Partes", da TSF, António Costa considerou que a regionalização podia ser um mecanismo importante na reforma que o Estado tem de levar a cabo nos próximos anos. No mesmo encontro, Rui Rio afirmou ainda ter algumas dúvidas sobre a regionalização, apesar de estar aberto a discutir a questão.

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