Regime saudita é insensível aos direitos humanos, acusa Amnistia
O secretário-geral da Amnistia Internacional (AI), Salil Shetty, considerou hoje que "o regime saudita é insensível aos direitos humanos" e manifestou preocupação pela situação do bloguista Raef Badaui, condenado a mil chicotadas.
"Não quero especular sobre o que se vai passar politicamente, mas na perspetiva da AI, a questão é a total ausência dos direitos humanos no país. É a nossa preocupação", declarou Shetty, no dia seguinte à morte do rei Abdullah da Arábia Saudita.
"O caso de Raef Badaui é um dos mais trágicos. Nada mudou e legalmente vai ser castigado todas as sextas-feiras. E a única razão que os leva a parar é para que melhore e ser chicoteado de novo", afirmou Shetty, à margem do Fórum Económico Mundial, em Davos (Suíça).
Esta forma de punição "é a mais terrível e medieval. A Arábia Saudita também realiza decapitações públicas. Criticamos o movimento extremista Estado Islâmico, mas aqui, é um governo que permitiu mais de 60 decapitações públicas nos últimos meses", acusou o responsável da organização não governamental de defesa dos direitos humanos.
As autoridades sauditas adiaram a aplicação do castigo de Raef Badaui, de 31 anos, por razões médicas.
A 09 de janeiro, Badaui recebeu as primeiras 50 das mil chicotadas a que foi condenado por "insultos ao islão". Previsto para ser retomado hoje, o castigo voltou a ser adiado, tal como na semana passada, porque as feridas ainda não tinham sarado, de acordo com a mulher do bloguista, refugiada no Canadá.
"O regime saudita é insensível aos direitos humanos e à dignidade humana e, infelizmente, é protegido por vários países ocidentais por ter petróleo e por ser visto como aliado na luta contra o terrorismo. De facto, quando se violam os direitos humanos, como faz a Arábia Saudita, alimenta-se o terrorismo, não se combate", sublinhou.
Shetty afirmou "estar preocupado" com as medidas tomadas em França, na sequência dos atentados terroristas e antissemitas, que causaram 17 mortos entre 07 e 09 de janeiro.
"É evidente que os atentados não podem ser justificados, sejam quais forem as circunstâncias, mas a preocupação vira-se agora para a reação dos governos francês e ocidentais", disse.
"Não devemos esquecer o que se passou depois dos atentados de 11 de setembro [de 2001]. Tivemos o 'Patriot Act', Guantanamo, a tortura (...) e as informações que vêm de França são preocupantes", advertiu.
Desde os atentados em Paris, foram aplicadas várias condenações e dezenas de acusações foram pronunciadas por "defesa do terrorismo", pelas autoridades judiciais francesas.
"As novas medidas antiterroristas, que estão a ser aplicadas, vão demasiado longe, na nossa opinião. Não correspondem aos critérios internacionais. Já foram detidas cerca de 70 pessoas, sob acusações muito vagas", acrescentou.
Shetty denunciou ainda "as formas extremas de brutalidade", cometidas pelo Estado Islâmico na Síria e no Iraque, "que não podemos compreender ou justificar de maneira alguma".
Mas sublinhou ser necessário perceber as causas. Estes dois países registaram "décadas de violações dos direitos humanos, perpetradas pelo Estado, e no caso da Síria, os ocidentais observaram sem fazer nada, ao princípio, quando as manifestações eram pacíficas".
Shetty teceu as mesmas considerações sobre o movimento islamita armado Boko Haram, responsável por vários massacres no norte da Nigéria.
"A violência e o terrorismo não podem ser justificados, mas sabemos que o norte e o leste do país foram sempre excluídos, historicamente. Não tiveram uma palavra a dizer no plano político, não tiveram escolhas económicas, e os jovens são excluídos. Mas a principal razão, é a ação dos militares nigerianos que mataram milhares de civis no último ano", nas operações contra o Boko Haram, afirmou.