Foi por volta de 2015, quando estava a estudar na ESMAD - Escola Superior de Media, Artes e Design, no Porto, que Dinis Leal Machado ouviu pela primeira vez a música de José Pinhal. "Foi um colega meu que nos mostrou José Pinhal e aquela música tornou-se quase um hino do nosso curso, eu fiquei fascinado com a obra dele." Temas como Tu És a Que Eu Quero e Não Prendas o Teu Cabelo tocavam nas festas dos estudantes em momentos de grande diversão, ainda que na altura ninguém soubesse muito bem quem era aquele músico nem o que lhe tinha acontecido. "Falámos logo dessa ideia de um dia fazer um filme sobre ele." Por isso, quando, após terminar a licenciatura, Dinis teve de ficar praticamente um ano parado antes de prosseguir para o mestrado, decidiu que essa era a oportunidade para ir à procura de José Pinhal..O resultado é A Vida Dura Muito Pouco, o documentário que agora se estreia no festival IndieLisboa - a sessão é no dia 28, sexta-feira, às 19.00, no Cinema São Jorge, em complemento a Ricardo, documentário de Luís Sobreiro (secção IndieMusic)..Tal como o realizador Dinis Leal Machado, muitos jovens, sobretudo do norte do país, descobriram a música de José Pinhal em meados dos anos 2000. Tudo aconteceu depois de, em 2001, Paulo Cunha Martins ter encontrado duas cassetes de Pinhal, entre muitos outros materiais, numa casa que tinha sido a sede da empresa de espetáculos de Cipriano Costa. Paulo mostrou essas cassetes aos amigos e percebeu imediatamente, pela sua reação, que a música de José Pinhal, apesar de feita nos anos 80, poderia agradar aos jovens do século XXI. As cassetes foram digitalizadas e a música espalhou-se, através de pens e CD. "E aos poucos começou a criar-se um burburinho, a música de José Pinhal começou a ser passada em várias festas", conta Paulo Cunha Martins no documentário..Em 2015 surgiram os José Pinhal Post Mortem Experience, uma banda de tributo composta por um grupo de jovens músicos da editora Favela Discos e dos Equations, que começou a atuar um pouco por todo o país e a divulgar a música de José Pinhal. "É um gajo que não esconde a paixão, não esconde o sotaque, tu sentes mesmo ali uma genuinidade imensa", diz o músico Rui Fonseca, tentando explicar o fascínio por esta música popular que, de uma maneira geral, se poderia integrar no género "pimba".."Sabia-se muito pouco sobre o José Pinhal", conta Dinis Leal Machado. Sabia-se que era um músico de Matosinhos que fazia música de baile e que tinha lançado, através da editora Nova Força, de São João da Madeira, três cassetes (Volume 1, 2 e 3, em 1984, 1985 e 1991) e um single chamado Infância (1979), que foi o vencedor do 1.º Festival da Canção do Norte. A sua música era muito ouvida no norte de Portugal, mas, para o resto do país, José Pinhal era um desconhecido..O realizador conseguiu encontrar a filha de José Pinhal e falou com a mulher do dono da Nova Força - ambas contribuíram com materiais preciosos para este filme. E falou ainda com Manuel Eduardo, o arranjista que fazia as versões das canções estrangeiras para Pinhal. "Reunimos algum material. Só tínhamos um vídeo dele, mas temos as músicas e várias gravações da rádio", explica o realizador..José Pinhal era trabalhador metalúrgico, mas, como tinha perdido uma perna na tropa, tinha uma prótese, vivia praticamente da sua pensão de invalidez. Foi também isso que lhe permitiu dedicar-se à música. "Foi engraçado perceber como é que funcionava esta indústria nos anos 80. Há uma desilusão quando descobrimos que as músicas de José Pinhal eram versões de músicas estrangeiras, nada foi escrito por ele, mas depois também percebemos que ele procurava músicas diferentes, não se ficava pelos sucessos que todos conheciam. E havia as rádios locais e todos aquele circuito dos clubes noturnos, as boîtes onde José Pinhal atuava", conta o realizador. Pinhal trabalhou praticamente até morrer, em 1993..Para Dinis Leal Machado, atualmente com 24 anos, esta revelar-se-ia uma experiência muito pessoal e diferente daquilo que tem sido o seu trabalho: "O meu cinema fala muito da minha geração", diz. Em 2017 ele ganhou o Prémio Sophia Estudante com Snooze, uma "comédia ligeira" sobre o modo como os jovens usam as aplicações de encontros para conhecer pessoas. Depois disso, fez a curta-metragem Cringe e neste momento está a desenvolver o argumento para uma série de televisão, também sobre o mundo dos jovens de hoje.."Como gosto muito de escrever o argumento e de controlar a estrutura narrativa, o documentário pode ser um bocadinho penoso para mim", admite. "Nunca sabemos o que vamos encontrar." Apesar disso, Dinis Leal Machado considera que foi uma experiência importante: "Este filme é mesmo uma homenagem ao José Pinhal. Esta história estava a pedir para ser contada.".Depois da estreia no IndieLisboa, o filme A Vida Dura Muito Pouco (título retirado de uma música de Pinhal) irá estar no próximo Curtas Vila do Conde. "A nossa ideia seria fazer algumas apresentações do filme com a banda de tributo mas, por causa da pandemia, não sabemos se será possível", explica Dinis Leal Machado. "Todos estes movimentos de revivalismo têm um prazo de validade, porque não há material novo, mas penso que ainda podemos mostrar a obra de José Pinhal a muitas pessoas que não a conhecem. Penso que o clímax do movimento será a reedição da obra, era o que gostaríamos que acontecesse."