Quem é o Carlitos, o novo piloto da Ferrari?

Filho de Carlos Sainz vai substituir Vettel na escuderia italiana. McLaren antecipou-se e anunciou contratação de Ricciardo para o lugar do espanhol antes da Ferrari oficializar acordo. Fisiologista português, Emiliano Ventura, trabalha com ele desde 2010 e conta ao DN como é o futuro piloto do cavalinho rampante e recorda estreia num F1.
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Carlos Sainz Jr. é o novo piloto da Ferrari. A escuderia italiana oficializou a contratação do jovem piloto espanhol para ocupar o lugar de Vettel. O alemão decidiu abandonar a marca italiana e abriu espaço à chegada do filho de Carlos Sainz, o antigo campeão do mundo de ralis e vencedor do Dakar. Sainz Jr. deixa assim a McLaren, equipa, que, já esta segunda-feira, anunciou a contratação de Daniel Ricciardo (Renault).

Sainz Jr. Cresceu no mundo dos carros e da velocidade. Desde os 8, 9 anos que se preparava para chegar à Fórmula 1. Depois de cumprido esse sonho (estreou-se em 2014), assina agora pela Ferrari, a histórica e tradicional escuderia italiana, onde competirá com Charles Leclerc, depois de correr pela Toro Rosso, Renault e McLaren. O piloto de 25 anos assinou por duas épocas (2021 e 2022) e passará a ser o terceiro espanhol a representar o cavalinho rampante, depois de Marqués de Portago (1956-1957) e Fernando Alonso (2010-2014).

"Estou muito contente por anunciar que vou correr pela Ferrari em 2021 e pelo futuro que me espera. Mas ainda tenho um ano importante com a McLaren e estou ansioso por voltar a competir com eles ainda esta temporada", escreveu Carlos Sainz Jr. no twitter, postando uma fotografia dele em criança num kart-ferrari vermelho.

O português Emiliano Ventura, diretor do Bio Performance do Motor & Sport Institute de Madrid, assistiu à progressão do Carlitos. Os caminhos do fisiologista e do jovem espanhol cruzaram-se em Londres, em 2010, quando o piloto integrou a Red Bull Júnior Team, que tinha o português no grupo de treinadores da parte física. Já lá vão dez anos e a ligação continua. "Estivemos sempre a treinar juntos desde aí. Acompanhei-o num campeonato da World Séries e num campeonato de GT3. Tem um passado de vitórias nas provas de promoção e um talento incrível", elogiou o fisiologista português.

Sainz Jr. mora perto do centro de treinos em Madrid, do qual Emiliano é diretor, e é um assíduo frequentador, uma vez que o seu personal trainer, Rupert Manwaring, faz parte da estrutura do centro. Uma ligação que se irá manter, esteja ele na Ferrari ou na McLaren, segundo o português. "Gosto muito do Carlitos. É uma pessoa muito honesta, muito trabalhador e muito empenhada. Quando vivíamos os dois em Milton Keynes era o atleta que mais horas passava a treinar comigo. Treina todos os dias. É um embaixador nato de qualquer marca, tem uma imagem fantástica enquanto piloto, mas também tem um caráter e uma personalidade que podem fazer dele um dos nomes mais sonantes da F1, que do automobilismo já é", elogiou o fisiologista, revelando que ele "não descarta" o mundo dos ralis do pai, mas prefere a pista e a velocidade.

A estreia de Sainz Jr. ao volante de um Fórmula 1 aconteceu em 2012 e Emiliano estava com ele. "Ele fez o primeiro teste de F1 comigo. A primeira vez que ele se sentou num F1 foi em Silverston (Inglaterra) e no final ofereceu-me as sapatilhas, com as quais fez o teste, e que guardo com carinho. Esse é um momento marcante para um piloto, é o atingir um sonho. Eles correm desde pequeninos para tentar chegar à F1 e a primeira vez que pegam num carro traz um conjunto de emoções. Preparamos o teste com algum afinco. Eu lembro-me de ele dar as primeiras voltas e quando foi à box virou-se para mim e disse: "Emiliano isto anda muito mais depressa do que eu julgava". Ele já conduzia um 3.5 na World Series, que andava uns três/quatro segundos abaixo do F1, mas dizia que nos esses (curvas seguidas de curvas apertadas) nem tinha tempo para pensar no que fazer, era deixar o carro fazer aquilo sozinho", contou o português, lembrando que ele "estava muito nervoso", mas acabou por ter "um teste muito bom porque o talento e a capacidade estavam lá".

O salto para a Ferrari é o "reconhecimento" da boa época que ele fez na McLaren na época passada: "O desempenho dele tem sido bastante elogiado por todos. O ano passado chegou a conseguir um pódio e fez uma boa dupla com o Lando Noris, ganhando a confiança e o respeito do paddock. Merece uma equipa que lute por títulos. Ser falado para a Ferrari é um elogio grande que podem fazer ao Carlitos e é com orgulho que o vejo no caminho certo em relação a um futuro na F1."

Dos karts à F1 com o peso do apelido Sainz, mas sem a pressão do pai

A paixão automóvel corre nas veias do espanhol. Nasceu com o pai campeão do mundo de ralis e aos quatro anos já andava de kart. A família tinha pistas espalhadas pelo país e rapidamente ele se iniciou na competição. "Quando eu tinha 8 ou 9 anos e comecei nas corridas de karts, o Alonso ganhava tudo. Foi aí que comecei a sonhar ir para a F1", confessou em tempos o piloto, que em 2019 ocupou o lugar do ídolo no MCL35 da McLaren.

"Ser filho do Carlos Sainz é uma coisa natural para ele, não o vê como um peso ou fardo. Foi uma fonte de inspiração. O pai sempre o deixou à vontade para fazer o caminho dele e nunca colocou pressão ou se intrometeu na sua preparação. É alguém que está lá se for preciso, mas ele tem o seu manager, o seu treinador, a sua entourage e tem feito uma carreira bastante independente. O pai não aparece a falar da carreira do filho, por exemplo, o que poderia colocar alguma pressão pública sobre ele", revelou Emiliano. Uma versão que vai de encontro ao que o jovem piloto disse numa entrevista ao El País: "Ele [pai] não fala comigo sobre os dados de telemetria nem me diz como devo abordar determinada curva. Às vezes faz-me críticas, mas são relacionadas com a falta de atitude ou relaxamento. Como ele diz, "ou mordes, ou mordem-te'."

Se o apelido lhe abriu portas, foi o talento que as manteve abertas. Com 15 anos sagrou-se campeão nos karts no campeonato Ásia-Pacífico, passando a integrar a equipa júnior da Red Bull. Participou depois na Fórmula BMW, na Fórmula Renault e na F3 britânica, até que em 2014, com 19 anos, tornou-se o mais jovem de sempre a ganhar a Fórmula Renault 3.5. Chegou à F1 em 2014 com a Toro Rosso e em 2019 passou a integrar a equipa de pilotos da McLaren, equipa onde voltou a encontrar o fisiologista português.

A Ferrari parecia estar no destino do espanhol. Uma opção precipitada pela saída de Vettel. O anúncio da saída do alemão campeão do mundo surpreendeu pelo timing, embora no bastidores dos Circo já todos soubessem que ele estava saturado e desanimado com a F1. Uma fuga de informação da parte do piloto levou a Ferrari a precipitar o anúncio de saída, numa altura em que o futuro da competição ainda é incerto devido à pandemia do coronavírus. Só assim se explica que uma equipa escolha um piloto para a nova temporada (2021) sem que a de 2020 ainda ter sequer começado.

O receio de propagação do vírus e a salvaguarda da saúde dos envolvidos levaram ao cancelamento de três os grandes prémios (Austrália, Mónaco, França) e adiaram sete (Bahrein, Vietname, China, Holanda, Espanha, Azerbaijão e Canadá). A competição devia ter começado no dia 15 de março na Austrália e, neste momento, prevê-se que a F1 volte às pistas a 5 de julho na Áustria, sem público e com duas corridas no mesmo circuito, uma delas em sentido inverso. Este é o mais recente plano do promotor do circuito mundial de Fórmula 1 para colocar as escuderias de novo em pista. O objetivo é fazer, pelo menos 15 corridas até dezembro e cumprir contratos sob pena de ter de devolver verbas

Quem é Emiliano Ventura?

Antigo atleta dos 400 metros barreiras, Emiliano Ventura dedicou-se ao treino, especializando-se em alta performance no automobilismo. O fisiologista trabalhou na empresa Hintsa Performance, em Genebra, responsável pela preparação física de mais de cem medalhados olímpicos e de grande parte dos atuais pilotos da F1. Chegou a treinar Obikwelu, a quem iniciou nas lides do treino, além de ter trabalhado na Fórmula 1 com Daniil Kvyat e Daniel Ricciardo, que agora vai voltar a encontrar, uma vez que o piloto australiano assinou pela McLaren, equipa com a qual o português trabalha.

Emiliano foi responsável pela preparação física dos pilotos da RedBull Junior Team, um projeto onde conheceu Carlos Sainz Jr. Foi ainda Performance Coach da Honda na WTCC, onde lidou com os portugueses Tiago Monteiro, António Félix da Costa ou Lourenço Beirão da Veiga. Um cargo que mantém no Intercontinental GT challenge e na Hyundai WTCR, onde no ano passado ganhou o Campeonato do Mundo de Turismos com o Norbi Michelisz. Além disso faz parte da equipa de performance da Mclaren e é diretor do Bio Performance do Motor & Sport Institute de Madrid.

E porquê o automobilismo? "O piloto chega a uma corrida e tem 10/12 mecânicos, dois engenheiros e mais não sei quantas pessoas para tratar do carro e nós somos os únicos responsáveis pelo piloto. E se algo não corre bem a responsabilidade é sempre do preparador físico. Estamos a falar de carros que exigem muito do piloto fisicamente. Um carro com ground force, um travão que pesa 120 kg, com uma aerodinâmica que mete uma força G cinco vezes o peso do corpo... e um piloto não pode chegar a meio de um dia de treinos em que faz cem voltas a um circuito e já estar cansado..."

Ele controla tudo. O que comem, bebem, quando e como o fazem, o descanso, a preparação física, tudo é estudado e pensado para que o piloto tire "o maior rendimento possível das suas capacidades".

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