Qual foi o acordo assinado entre Fectrans e Antram?
A Antram e a Fectrans, sindicato que não aderiu à greve dos motoristas, assinaram na quarta-feira à noite um acordo relativo ao contrato coletivo de trabalho numa reunião no Ministério das Infraestruturas e da Habitação, em Lisboa. "Construímos um memorando de entendimento relativamente a varias questões importantes para todos os trabalhadores do setor", afirmou o dirigente sindical José Manuel Oliveira. Salários aumentam pelo menos 266 euros para os motoristas de matérias perigosas.
O coordenador nacional da Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações (Fectrans), afeta à CGTP, esclareceu, esta tarde, em conferência de imprensa, alguns pontos do acordo assinado.
"Um trabalhador motorista de pesados que, por exemplo, transporte combustíveis e trabalhe com camiões cisterna, tem, por este acordo, pelo protocolo de 17 de maio e consolidado neste memorando, 266 euros de aumento por mês no mínimo. A acrescer a esta rubrica está o prémio de 125 euros de subsidio de operações. Isto, claro, no caso de um trabalhador sem diuturnidades", explicou.
Depois, há um conjunto de categorias profissionais, não referidas no protocolo de 17 de maio, que "vão ter aumentos de salários entre 4% e 6%, e é nesse contexto que estão as matérias salariais neste momento". O trabalho noturno passa também a ser pago à parte.
O responsável da Fectrans sublinhou que este "memorando de entendimento" melhora e valoriza questões como as diuturnidades e as ajudas de custo, altera o conceito da cláusula 61 e muda conceitos de atribuição de regras de ajudas de custo diárias no transporte ibérico e internacional.
No caso da cláusula 61 [que se refere a isenção de horário] frisou que esta "não pode ser lida sem uma outra cláusula que define os limites dos tempos de trabalho extraordinário", acrescentou ainda o coordenador da FECTRANS, referindo que "nenhum trabalhador que em situações excecionais tenha de fazer trabalho extraordinário pode fazer mais de duas horas por dia".
Já a Antram fez outras contas e apontou que a partir de 2021, se houver um aumento do salário mínimo nacional de 100 euros nos próximos três anos, os aumentos para os motoristas subirão "pelo menos" 350 euros.
José Manuel Oliveira disse também que será realizada uma "discussão interna" no âmbito da federação, com dirigentes e associados, para retomar as negociações na primeira semana de setembro e "concluir a revisão global do contrato coletivo de trabalho", para que este possa ser publicado este ano e entre em vigor a partir de janeiro de 2020.
Está ainda previsto que até final deste mês seja publicada a portaria, que está prevista no protocolo, da proibição de circulação dos camiões-cisterna aos domingos e feriados.
Explicando a razão por que a Fectrans e a Antram foram apresentar ao ministro o acordo a que chegaram, José Manuel Oliveira explicou que se deve a matérias em que "o ministério tem de intervir, nomeadamente as questões da fiscalização, das cargas e descargas e o acompanhamento que o Governo deve fazer daquilo que são os problemas no setor e intervir para resolver alguns problemas que existem, porque não tem havido fiscalização", como é o caso do incumprimento do contrato coletivo de trabalho.
Nesse sentido ficou já marcada reunião com o ministro do Trabalho, Vieira da Silva, no dia 30, designadamente para discutir o papel da Autoridade para as Condições do Trabalho e da Segurança Social.
Questionado sobre se considera este um "acordo histórico", como o designou a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (Antram), José Manuel Oliveira respondeu que para a Fectrans é o acordo possível.
"É a vitória da teimosia de quem entendeu que a luta se deve desenvolver na mesa de negociação, portanto é nesse contexto que fazemos a avaliação deste acordo, sabendo sempre que não era aquilo que gostaríamos de atingir", frisou.
O vice-presidente da Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (Antram) Pedro Polónio disse que "foi possível hoje concretizar, de uma forma um pouco mais fina, aquilo que tinham sido as grandes questões que ficaram acordadas em maio".
A Antram diz que o acordo foi conseguido na sequência de "uma dura negociação" e permite um aumento mínimo de 140 euros para motoristas de mercadorias gerais e de 266 euros para quem transporta matérias perigosas.
A estes valores "acrescerão os impostos que as empresas terão de suportar", sendo que, "no total, este aumento comporta um custo total de mais de 300 euros por mês por cada trabalhador", refere a Antram em comunicado hoje divulgado.
"O custo que as empresas suportarão por trabalhador por ano aumenta em mais de 4.000 euros através deste novo acordo", acrescenta a associação.
Considerando que 2020 será "um ano histórico" e que este foi "um dos mais bem conseguidos acordos de que há memória", a Antram adianta esperar que haja uma "alteração muito elevada no que respeita a tempos de espera/cargas e descargas destes trabalhadores".
O porta-voz do Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) reagiu, entretanto, ao anúncio do acordo, considerando que foi feito à revelia dos motoristas. Para o porta-voz do SNMMP, "a Fectrans deveria representar a vontade dos sócios e não foi aquilo que aconteceu".
"Fez aquilo que os dirigentes assim o entenderam e, ainda por cima, patrocinado, com pompa e circunstância, pelo ministério, que saiu para anunciar o acordo histórico", declarou.
"Hoje, estamos próximos da redação final daquilo que vai ser a revisão da convenção coletiva que vai entrar em vigor a partir de janeiro", acrescentou da Pedro Polónio, no final da reunião.
Considerando o acordo "algo muito relevante" para um setor que está "a viver dias difíceis", Pedro Polónio frisou que com esta decisão o patronato quer "passar uma mensagem de confiança aos trabalhadores, aos empresários".
"Não fomos além daquilo que é a sobrevivência das empresas, mas não podemos deixar de deixar esta nota de que vai ser com muito sacrifício", destacou.
Sobre se este acordo esvazia os fundamentos da greve iniciada na segunda-feira e por tempo indeterminado pelos motoristas, Pedro Polónio esclareceu que os motivos da paralisação não têm a ver com este acordo, que é um acordo de trabalho, de especificação de um acordo geral alcançado em maio, e em cima do qual vai ser feito ainda um trabalho de "redação fina das cláusulas".
"Os motivos da greve não se prendem verdadeiramente com o incumprimento do protocolo de 17 de maio", disse, acrescentando: "As razões das greves são diferentes, vão para lá do que está estipulado no protocolo, são questões em que nos estão a ser exigidas coisas que nós não protocolámos em maio e sobre as quais nós não temos capacidade".