150 anos depois, a procissão de Nossa Senhora da Quietação volta a sair esta quarta-feira às ruas de Alcântara, por iniciativa da Real Irmandade de Nossa Senhora da Quietação, estabelecida na igreja com o mesmo nome, em Lisboa. Será precisamente a partir deste local de culto, popularmente conhecido por Igreja das Flamengas e situado na rua 1º de Maio, que se iniciará o percurso que vai passar pelas ruas centrais da freguesia de Alcântara. A Irmandade é uma associação pública de fiéis católicos, contando atualmente com 50 membros ativos e que promove atividades religiosas e culturais.."A ideia de recuperar esta tradição lisboeta surgiu há cerca de dois anos, quando se realizou a Procissão de Nossa Senhora da Conceição, que foi o incentivo para retomar esta procissão histórica da capital portuguesa, que tem o seu regimento descrito nos antigos estatutos da Irmandade", começa por dizer Eunice Costa, presidente da Direção da Real Irmandade de Nossa Senhora da Quietação, ao DN. "A ideia foi amadurecendo e fortalecendo e, este ano, finalmente, a Irmandade, com o imprescindível apoio do Grupo da Boa Vontade da Paróquia de São Pedro em Alcântara, dos Escuteiros de Alcântara e da Junta de Freguesia de Alcântara, conseguiu consolidar todos os aspetos logísticos necessários para efetivar esta iniciativa, essencial para a manutenção das tradições de Lisboa", congratula-se..A principal responsável desta Irmandade mostra-se muito satisfeita com o regresso desta antiga tradição. "Esperamos que se desloquem bastantes lisboetas a Alcântara e que, acima de tudo, cumpram as normas da DGS para ajuntamentos desta natureza. A procissão está a suscitar muito entusiasmo entre os membros da Irmandade e em muitos dos católicos de Alcântara, pois nenhum deles tem memória de ver a imagem de Nossa Senhora da Quietação em procissão ou de ouvir os sinos do Convento das Flamengas a repicar à saída de Nossa Senhora às ruas de Lisboa"..Eunice Costa não encontra uma justificação fidedigna pelo facto de a procissão não se ter realizado durante tantos anos, avançando com "o possível desinteresse das mesas administrativas e eventualmente devido à falta de recursos humanos e logísticos". Esta procissão remontará ao final do século XVI, aquando da instalação das religiosas em Alcântara, no ano de 1586. "A procissão era o testemunho público da devoção popular a Nossa Senhora, neste caso concreto com a advocação da Quietação, presumimos que título único em Portugal", refere..Em 1694, o rei D. Pedro II tornou-se juiz perpétuo da Irmandade, facto que lhe conferiu a condição de Real Irmandade. Em 1706, ano da morte do monarca, foi depositado o seu coração na igreja, em local assinalado por lápide. Após a morte da última religiosa, em janeiro de 1887, suprimiu-se o conjunto conventual e a Fazenda Nacional tomou posse dele..A 2 de abril de 1889, a Direção Geral dos Bens Nacionais concedeu a posse da igreja e dos respetivos bens à Real Irmandade de Nossa Senhora da Quietação, que assim o vinha pedindo desde 31 de janeiro de 1887, com a condição de manter o culto, o que fez até hoje. A 18 de maio de 1891, deu-se a entrega efetiva da igreja e das dependências ligadas ao culto à Irmandade..Nossa Senhora, sob a invocação da Quietação, é a padroeira da Irmandade, assim como do antigo convento que lhe serve de sede. A invocação remonta à fundação do convento. Fazendo jus a um tempo de paz, quietude e à segurança que as monjas flamengas encontraram em Portugal, escolheu-se Nossa Senhora da Quietação como protetora do novo instituto que se construía em Alcântara. A imagem de Nossa Senhora da Quietação que se encontra na igreja terá sido finalizada em 1590 e foi adquirida no momento em que as religiosas flamengas se transferiram do convento que o rei Filipe I lhes entregara na Calçada da Glória, em Lisboa..A procissão sai esta quarta-feira da capela do convento, na rua 1.º de Maio, ao Calvário, após a celebração da missa, às 16.00 horas, pelo padre António Borges, capelão da Irmandade e pároco de São Pedro de Alcântara. Da rua 1.º de Maio, a procissão segue pelas ruas Luís de Camões, Lusíadas, Leão de Oliveira, Calçada da Tapada, rua de Alcântara, Largo do Calvário e termina onde começou. É pedido aos residentes que adornem as suas janelas e varandas..De acordo com a presidente, a Irmandade tem como principal objetivo "promover, subsidiar e intensificar o culto público e solene da sua Augusta Padroeira, Nossa Senhora da Quietação, celebrando a sua festividade a 15 de agosto de cada ano, com a maior solenidade possível". E ainda "participar na procissão do Corpo de Deus desta cidade de Lisboa, bem como fomentar a vocação cristã dos seus membros". E existe sempre a preocupação de "socorrer os irmãos necessitados e os pobres da Paróquia, tanto quanto as posses da Irmandade o permitam"..Entre as dependências a cargo da Irmandade nos dias de hoje, "encontra-se a Sala do Rosário, atualmente Casa do Despacho da Irmandade, uma das mais notáveis sobrevivências da Lisboa do século XVII, uma sala integralmente revestida a azulejos, talha dourada, e um precioso conjunto de pinturas de Bento Coelho da Silveira"..As rainhas de Portugal eram as aias de Nossa Senhora da Quietação, a quem legavam vestidos que durante quatro séculos enriqueceram o enxoval da imagem. Porém este ano, para marcar o novo capítulo de restruturação da Irmandade, Eunice Costa revela que "a imagem sairá com um vestido realizado para o efeito, com rendas tradicionais portuguesas, e ornamentada como as grandes imagens de Nossa Senhora que existiam na Lisboa do século XVIII"..dnot@dn.pt