Tudo adiado, pelo menos uma semana. Ontem estavam para se iniciar na respetiva comissão parlamentar as primeiras votações indiciárias, artigo a artigo, da nova Lei de Bases da Saúde. Mas não..A pedido do PCP - que argumentou não ter havido tempo para analisar as muitas dezenas de propostas de alteração entretanto apresentadas pelos partidos - as votações que ontem se iniciariam foram adiadas uma semana..Este foi só mais um acontecimento na intensa trapalhada em que se tornou no Parlamento a discussão da nova Lei de Bases da Saúde. O debate está colocado no ponto em que o Bloco de Esquerda sempre quis que ele ficasse: devem ou não acabar as parcerias público-privadas no setor?.O Bloco diz que sim - devem acabar e ser expressamente proibidas na nova lei, deixando os contratos em curso expirar e depois não os renovar..Mas a primeira proposta do governo dizia que não: admitia a possibilidade de gestão privada (ou do setor social) em unidades do SNS. Dizia - mas deixou de dizer (no final de março, num segundo texto enviado tanto ao Bloco de Esquerda como ao PCP)..E depois, há dias, voltou subitamente à versão original, insistindo numa formulação que permite que as PPP continuem a funcionar..Era só um "documento de trabalho", dizem agora os socialistas, quanto ao articulado enviado aos partidos à esquerda em que se acabavam com as PPP. Sabe-se que esse articulado tinha a assinatura da ministra da Saúde, Marta Temido. E que o primeiro-ministro conhecia o seu conteúdo. Mas foi também do primeiro-ministro que veio a ordem para o volte face. Mas aí, a operacionalização da decisão já não coube à ministra da Saúde mas sim aos deputados do PS na respetiva comissão, coordenados por Jamila Madeira. Foram eles que assinaram as propostas de alterações que traduziram a ideia de que afinal o PS não é pela extinção das parcerias público-privadas..O que motivou então a cambalhota socialista? Aparentemente, segundo as fontes do DN, uma necessidade da direção do grupo parlamentar do PS - começando por Carlos César - de dizer à ministra da Saúde que nas negociações no Parlamento quem manda são os deputados e não o governo..Dito de outra forma: César não gostou de ver a ministra da Saúde enviar diretamente ao BE e ao PCP uma proposta de novo articulado - agora acabando com as PPP -, passando essa iniciativa à margem da bancada socialista. E mais irritados ficaram os deputados socialistas com o facto de o Bloco de Esquerda se ter apressado a cantar vitória (o que fez muito audivelmente) - algo que, segundo dizem, foi feito indevidamente porque desde o início o BE estava avisado de que a nova versão enviada pelo governo não era necessariamente a final..Ontem, falando com jornalistas na AR, Duarte Cordeiro, secretário de Estado adjunto e dos Assuntos Parlamentares, reconheceu abertamente as divisões internas entre socialistas: "Existiram várias versões de trabalho, algumas delas não foram consensuais dentro do governo e do PS e foi comunicado, nomeadamente aos parceiros, que essas posições tinham sido alteradas.".Para Costa tratou-se, então, simplificando, de escolher entre César e a ministra da Saúde. Não foi uma opção difícil porque o primeiro-ministro sabe que, incorporando a lei a manutenção das PPP, uma maioria de esquerda pode ser substituída por uma maioria com o PSD. Depois da cambalhota socialista, Rui Rio salientou, precisamente, que o PS e o governo estavam a ir de novo ao encontro das posições do seu partido..Quem também sorriu foi o Presidente da República. Marcelo defende que a nova lei deve permitir a possibilidade de PPP. E sempre pressionou para que a maioria de aprovação fosse entre o PS e o PSD e não à esquerda. Parece que a vontade lhe será feita..Entretanto, o PCP vai mantendo as opções em aberto. Sendo certo que o PCP é contra as PPP, também é verdade que acha que esse não é, como ontem disse Jerónimo de Sousa, "o alfa e o ómega" do problema do SNS.