A coluna de viaturas blindadas brancas já ia a caminho de Bokolobo para "a primeira ação ofensiva" dos capacetes-azuis na República Centro-Africana (RCA) quando chegou a ordem para parar. Embora estranha, por surgir após tomada a decisão de atacar, a ordem refletia a longa cultura de paz da ONU: "Dar ainda mais uma hipótese" ao chefe dos bandidos para negociar..Dentro da Pandur de oito rodas que funcionava como centro de comando e controlo estava o tenente-coronel paraquedista português Óscar Fontoura - que foi, até hoje, o comandante da quarta Força Nacional Destacada (FND) ao serviço das Nações Unidas na RCA (MINUSCA), e que chega nesta segunda-feira ao fim da tarde a Lisboa. Horas antes, ao princípio da manhã, partirá o contingente de comandos que substitui os paraquedistas como força de reação rápida da ONU em todo o país..As forças portuguesas tiveram o duro papel de ajudar a combater estes grupos armado em Bokolobo, o bastião dos ex-Selekas da União para a Paz (UPC), um grupo armado liderado por Ali Darassa, e, a cerca de 65 quilómetros, Bambari. Foi desta última localidade que as forças coordenadas por Portugal expulsaram grupos armados durante a Operação Bekpa II - bekpa significa trovão na língua Sango - em ações de combate com apoio aéreo de drones, helicópteros e aeronaves francesas guiados pelos controladores aéreos avançados da Força Aérea que integram o contingente português..Esses grupos armados "estavam a ter determinados comportamentos inaceitáveis para a MINUSCA" em Bambari, como "extorsão, ameaças e cobrança de impostos ilegais aos comerciantes" ou "a impedir a livre circulação" das populações, recorda o tenente-coronel paraquedista..Só que a UPC de Ali Darassa, recusando sentar-se à mesa das negociações, acantonara-se em Bokolobo e os portugueses tiveram mesmo de ir atrás deles, naquela que Óscar Fontoura diz ser "a primeira vez" que a MINUSCA adotou uma postura abertamente ofensiva..O tenente-coronel recorda aquele momento em que, parados, no meio do pó, e sob temperaturas elevadas, aguardavam por novas ordens: os paraquedistas sabiamm que iriam enfrentar um inimigo ainda mais aguerrido porque se defendia "no seu reduto". Era quase certo que esse interminável tempo de espera teria outro objetivo: criar corredores de fuga e dar tempo aos elementos armados da UPC de evitar ficarem encurralados, como acabaria por suceder. Apesar dos "combates muito intensos", Ali Darassa "fugiu horas antes com a sua guarda mais próxima para parte incerta" - aceitando finalmente negociar, pelo que os homens do tenente-coronel Fontoura recebem nova "determinação para parar", recorda o militar..Papel importante no planeamento e execução da operação foi dado pelas Pandur, salienta o oficial. São viaturas blindadas de transporte que garantem maior proteção aos soldados enviados para a zona de operações e permitem "maior flexibilidade para reagir aos combates"..Os drones de quatro rotores usados pela força portuguesa também foram outro elemento essencial para Óscar Fontoura. O oficial garante ter "o armamento e equipamento necessário e suficiente para cumprir" as missões num tipo de terreno com "imenso pó no ar que afeta a operacionalidade" dos veículos e das viaturas, obrigando "a uma manutenção mais frequente que o prescrito nos manuais"..Uma constante nestas operações é o "elevado consumo de água" devido às temperaturas altas e, talvez, também pela "intensidade dos combates", muitas vezes em ambientes urbanos "muito confinados" e com "campos de tiro muito curtos", onde "a chave [do sucesso] está no treino que se faz", destaca o oficial..A importância da Operação Ouaka.A ação militar portuguesa em Bokolobo deu nas vistas, teve destaque na imprensa e granjeou elogios como o do Estado-Maior General das Forças Armadas. O seu porta-voz afirmou ao DN que "foi com grande atenção e orgulho que acompanhámos a brilhante ação militar em Bokolobo no bastião e quartel-general de um dos principais grupos armados da RCA", onde "a ação competente, abnegada e corajosa como os militares portugueses alcançaram os objetivos militares atribuídos pelo comandante militar da MINUSCA contribuíram para devolver a paz e a tranquilidade à população indefesa de Bambari.".O comandante Coelho Dias considera que "o resultado destas ações só poderá ser melhor avaliado pelas Nações Unidas e pelas autoridades governamentais da RCA". Contudo, sublinha o oficial, "estamos convictos de que contribuíram decisivamente para o fortalecimento do diálogo político para a paz, que conseguiu no final de janeiro sentar à mesma mesa, em Cartum [Sudão], todos os líderes dos grupos armados ativos no país" - onde se chegou a "uma solução, mesmo que provisória, para a estabilidade da região".."Todos os portugueses devem sentir um grande orgulho por esta força de militares tão valorosos, esforçados, determinados e capazes", realça o porta-voz do almirante Silva Ribeiro (comandante operacional das Forças Armadas), lembrando que os primeiros três contingentes portugueses ao serviço da MINUSCA também já tinham entrado em confronto com grupos armados mas sem tanta intensidade..Crucial para o sucesso da Bekpa II foi a Operação Ouaka (nome de uma localidade na região de Bambari), realizada semanas antes do Natal e que visava precisamente "recolher informações sobre os grupos armados para preparar operações ofensivas destinadas a neutralizar" a sua atividade, refere o comandante Coelho Dias, que esteve vários dias na RCA..Nos 35 dias dessa operação - em que ficou ferido um sargento, com um tiro que lhe acertou no braço esquerdo e atravessou o corpo - realizaram-se "várias ações de reconhecimento aéreo, dezenas de patrulhas de reconhecimento e segurança". Mas houve também "situações de combate" que exigiram o apoio de helicópteros de ataque MI-35 do Senegal e de helicópteros MI-17 do Sri Lanka para reconhecimento, transporte e evacuação.."Esta operação expôs a situação de fragilidade da cidade" de Bambari - a 400 quilómetros de Bangui, distância que uma coluna militar demora três dias a percorrer - "face à atividade dos grupos armados e serviu de prelúdio para a ação decisiva que a força portuguesa viria a conduzir" no início de 2019, sublinha Coelho Dias..A verdade é que, no meio da tensão e das dificuldades operacionais, os militares também viveram momentos de alegria num país onde a situação social "é considerada como altamente deteriorada, as escolas estão sobrelotadas e têm poucas condições" para ensinar, diz Coelho Dias..Daí a alegria dos miúdos e o apreço dos responsáveis escolares pela entrega de material doado pelos portugueses, como mochilas, estojos, cadernos, arquivadores, kits de pintura, além de bicicletas para alunos que vivem mais longe das escolas - até onde "em média demoram duas horas a pé" a chegar e mais duas a regressar a casa - ou equipamentos desportivos e brinquedos..Outro episódio, contado por Óscar Fontoura, envolve "uma coincidência feliz" nos arredores de Bambari: uma criança com 7 ou 8 anos encontrada durante a primeira operação na zona com uma infeção numa perna e que exigiu tratamento por parte do médico da força portuguesa, voltou a ser vista no regresso a Bangui após a segunda missão - e que "já andava e estava muito melhor.".Bacalhau com arroz de tomate à despedida.No total e nos 65 dias que duraram as operações Ouaka e Bekpa II, os capacetes-azuis portugueses estiveram "mais de 70 horas em 11 ações de combate de alta intensidade", das quais cinco foram "ofensivas planeadas e executadas" pelos paraquedistas do Exército. O resto, acrescenta Coelho Dias, foram "reações a flagelações ou emboscadas levadas a cabo por elementos armados" - situações em que os outros três contingentes ao serviço da ONU na RCA já tinham andado aos tiros, embora sem a violência e a intensidade de agora.."Cada período tem as suas características próprias em função das circunstâncias no terreno" e a nível político, refere o tenente-coronel Óscar Fontoura, sem querer maiores louros do que os destacamentos anteriores. Agora, foram "várias operações deliberadas e planeadas pela MINUSCA para atingir uma determinada finalidade" - negociações de paz - que exigia "uma ação direta" sobre os grupos armados.."Os combates são sempre difíceis, várias vezes intensos e longos, mas os paraquedistas estão preparados para isso", acrescenta o comandante da força, dizendo ainda que "a grande dificuldade" na RCA reside na "identificação positiva do alvo" - pois o inimigo "mistura-se com a população e não anda fardado e nós não podemos causar vítimas civis ou colaterais"..Acompanhado do tenente-coronel comando Rui Moura, comandante do novo contingente português na RCA e que vai apresentar aos responsáveis da MINUSCA, Óscar Fontoura realça "o alto nível de treino" ministrado pelo Exército aos soldados que vão para a RCA. E "a forma como somos uma família é absolutamente determinante para que, em situações de crise, consigamos atingir o sucesso", enfatiza o militar paraquedista..Para o fim fica o elogio do tenente-coronel Fontoura - que o porta-voz do EMGFA qualifica como "um líder tático e operacional" - ao desempenho dos seus homens, com quem acaba de partilhar um almoço de "bacalhau com arroz de tomate" antes de falar com o DN (nas vésperas de regressar a Portugal): "O balanço é muito positivo e posso confessar que, ao fim de seis meses, estaríamos prontos e motivados para continuar mais seis meses se tal nos fosse pedido."
A coluna de viaturas blindadas brancas já ia a caminho de Bokolobo para "a primeira ação ofensiva" dos capacetes-azuis na República Centro-Africana (RCA) quando chegou a ordem para parar. Embora estranha, por surgir após tomada a decisão de atacar, a ordem refletia a longa cultura de paz da ONU: "Dar ainda mais uma hipótese" ao chefe dos bandidos para negociar..Dentro da Pandur de oito rodas que funcionava como centro de comando e controlo estava o tenente-coronel paraquedista português Óscar Fontoura - que foi, até hoje, o comandante da quarta Força Nacional Destacada (FND) ao serviço das Nações Unidas na RCA (MINUSCA), e que chega nesta segunda-feira ao fim da tarde a Lisboa. Horas antes, ao princípio da manhã, partirá o contingente de comandos que substitui os paraquedistas como força de reação rápida da ONU em todo o país..As forças portuguesas tiveram o duro papel de ajudar a combater estes grupos armado em Bokolobo, o bastião dos ex-Selekas da União para a Paz (UPC), um grupo armado liderado por Ali Darassa, e, a cerca de 65 quilómetros, Bambari. Foi desta última localidade que as forças coordenadas por Portugal expulsaram grupos armados durante a Operação Bekpa II - bekpa significa trovão na língua Sango - em ações de combate com apoio aéreo de drones, helicópteros e aeronaves francesas guiados pelos controladores aéreos avançados da Força Aérea que integram o contingente português..Esses grupos armados "estavam a ter determinados comportamentos inaceitáveis para a MINUSCA" em Bambari, como "extorsão, ameaças e cobrança de impostos ilegais aos comerciantes" ou "a impedir a livre circulação" das populações, recorda o tenente-coronel paraquedista..Só que a UPC de Ali Darassa, recusando sentar-se à mesa das negociações, acantonara-se em Bokolobo e os portugueses tiveram mesmo de ir atrás deles, naquela que Óscar Fontoura diz ser "a primeira vez" que a MINUSCA adotou uma postura abertamente ofensiva..O tenente-coronel recorda aquele momento em que, parados, no meio do pó, e sob temperaturas elevadas, aguardavam por novas ordens: os paraquedistas sabiamm que iriam enfrentar um inimigo ainda mais aguerrido porque se defendia "no seu reduto". Era quase certo que esse interminável tempo de espera teria outro objetivo: criar corredores de fuga e dar tempo aos elementos armados da UPC de evitar ficarem encurralados, como acabaria por suceder. Apesar dos "combates muito intensos", Ali Darassa "fugiu horas antes com a sua guarda mais próxima para parte incerta" - aceitando finalmente negociar, pelo que os homens do tenente-coronel Fontoura recebem nova "determinação para parar", recorda o militar..Papel importante no planeamento e execução da operação foi dado pelas Pandur, salienta o oficial. São viaturas blindadas de transporte que garantem maior proteção aos soldados enviados para a zona de operações e permitem "maior flexibilidade para reagir aos combates"..Os drones de quatro rotores usados pela força portuguesa também foram outro elemento essencial para Óscar Fontoura. O oficial garante ter "o armamento e equipamento necessário e suficiente para cumprir" as missões num tipo de terreno com "imenso pó no ar que afeta a operacionalidade" dos veículos e das viaturas, obrigando "a uma manutenção mais frequente que o prescrito nos manuais"..Uma constante nestas operações é o "elevado consumo de água" devido às temperaturas altas e, talvez, também pela "intensidade dos combates", muitas vezes em ambientes urbanos "muito confinados" e com "campos de tiro muito curtos", onde "a chave [do sucesso] está no treino que se faz", destaca o oficial..A importância da Operação Ouaka.A ação militar portuguesa em Bokolobo deu nas vistas, teve destaque na imprensa e granjeou elogios como o do Estado-Maior General das Forças Armadas. O seu porta-voz afirmou ao DN que "foi com grande atenção e orgulho que acompanhámos a brilhante ação militar em Bokolobo no bastião e quartel-general de um dos principais grupos armados da RCA", onde "a ação competente, abnegada e corajosa como os militares portugueses alcançaram os objetivos militares atribuídos pelo comandante militar da MINUSCA contribuíram para devolver a paz e a tranquilidade à população indefesa de Bambari.".O comandante Coelho Dias considera que "o resultado destas ações só poderá ser melhor avaliado pelas Nações Unidas e pelas autoridades governamentais da RCA". Contudo, sublinha o oficial, "estamos convictos de que contribuíram decisivamente para o fortalecimento do diálogo político para a paz, que conseguiu no final de janeiro sentar à mesma mesa, em Cartum [Sudão], todos os líderes dos grupos armados ativos no país" - onde se chegou a "uma solução, mesmo que provisória, para a estabilidade da região".."Todos os portugueses devem sentir um grande orgulho por esta força de militares tão valorosos, esforçados, determinados e capazes", realça o porta-voz do almirante Silva Ribeiro (comandante operacional das Forças Armadas), lembrando que os primeiros três contingentes portugueses ao serviço da MINUSCA também já tinham entrado em confronto com grupos armados mas sem tanta intensidade..Crucial para o sucesso da Bekpa II foi a Operação Ouaka (nome de uma localidade na região de Bambari), realizada semanas antes do Natal e que visava precisamente "recolher informações sobre os grupos armados para preparar operações ofensivas destinadas a neutralizar" a sua atividade, refere o comandante Coelho Dias, que esteve vários dias na RCA..Nos 35 dias dessa operação - em que ficou ferido um sargento, com um tiro que lhe acertou no braço esquerdo e atravessou o corpo - realizaram-se "várias ações de reconhecimento aéreo, dezenas de patrulhas de reconhecimento e segurança". Mas houve também "situações de combate" que exigiram o apoio de helicópteros de ataque MI-35 do Senegal e de helicópteros MI-17 do Sri Lanka para reconhecimento, transporte e evacuação.."Esta operação expôs a situação de fragilidade da cidade" de Bambari - a 400 quilómetros de Bangui, distância que uma coluna militar demora três dias a percorrer - "face à atividade dos grupos armados e serviu de prelúdio para a ação decisiva que a força portuguesa viria a conduzir" no início de 2019, sublinha Coelho Dias..A verdade é que, no meio da tensão e das dificuldades operacionais, os militares também viveram momentos de alegria num país onde a situação social "é considerada como altamente deteriorada, as escolas estão sobrelotadas e têm poucas condições" para ensinar, diz Coelho Dias..Daí a alegria dos miúdos e o apreço dos responsáveis escolares pela entrega de material doado pelos portugueses, como mochilas, estojos, cadernos, arquivadores, kits de pintura, além de bicicletas para alunos que vivem mais longe das escolas - até onde "em média demoram duas horas a pé" a chegar e mais duas a regressar a casa - ou equipamentos desportivos e brinquedos..Outro episódio, contado por Óscar Fontoura, envolve "uma coincidência feliz" nos arredores de Bambari: uma criança com 7 ou 8 anos encontrada durante a primeira operação na zona com uma infeção numa perna e que exigiu tratamento por parte do médico da força portuguesa, voltou a ser vista no regresso a Bangui após a segunda missão - e que "já andava e estava muito melhor.".Bacalhau com arroz de tomate à despedida.No total e nos 65 dias que duraram as operações Ouaka e Bekpa II, os capacetes-azuis portugueses estiveram "mais de 70 horas em 11 ações de combate de alta intensidade", das quais cinco foram "ofensivas planeadas e executadas" pelos paraquedistas do Exército. O resto, acrescenta Coelho Dias, foram "reações a flagelações ou emboscadas levadas a cabo por elementos armados" - situações em que os outros três contingentes ao serviço da ONU na RCA já tinham andado aos tiros, embora sem a violência e a intensidade de agora.."Cada período tem as suas características próprias em função das circunstâncias no terreno" e a nível político, refere o tenente-coronel Óscar Fontoura, sem querer maiores louros do que os destacamentos anteriores. Agora, foram "várias operações deliberadas e planeadas pela MINUSCA para atingir uma determinada finalidade" - negociações de paz - que exigia "uma ação direta" sobre os grupos armados.."Os combates são sempre difíceis, várias vezes intensos e longos, mas os paraquedistas estão preparados para isso", acrescenta o comandante da força, dizendo ainda que "a grande dificuldade" na RCA reside na "identificação positiva do alvo" - pois o inimigo "mistura-se com a população e não anda fardado e nós não podemos causar vítimas civis ou colaterais"..Acompanhado do tenente-coronel comando Rui Moura, comandante do novo contingente português na RCA e que vai apresentar aos responsáveis da MINUSCA, Óscar Fontoura realça "o alto nível de treino" ministrado pelo Exército aos soldados que vão para a RCA. E "a forma como somos uma família é absolutamente determinante para que, em situações de crise, consigamos atingir o sucesso", enfatiza o militar paraquedista..Para o fim fica o elogio do tenente-coronel Fontoura - que o porta-voz do EMGFA qualifica como "um líder tático e operacional" - ao desempenho dos seus homens, com quem acaba de partilhar um almoço de "bacalhau com arroz de tomate" antes de falar com o DN (nas vésperas de regressar a Portugal): "O balanço é muito positivo e posso confessar que, ao fim de seis meses, estaríamos prontos e motivados para continuar mais seis meses se tal nos fosse pedido."