Choram em silêncio. Sorriem com raiva contida. Contam como passaram o desespero da noite marcada por atentados, ao lado da porta de casa, ao lado do café que frequentam diariamente, ou no caminho que sempre percorrem no regresso a casa. É assim que em Paris se procurou viver um dia seguinte "normal", mas com "dor"..Dizem que "a vida continua. Sem medo", mas com uma "compressão" difícil de "relativizar". São palavras de Martine, uma parisiense que veio com o marido e o filho de 3 anos à porta da sala de espetáculos Bataclan, para homenagear as vítimas dos atentados. Acenderam velas junto a outras que já ardiam, num memorial improvisado ao longo do dia. Mora no quarteirão ao lado, mas é "tão perto do Bataclan", que ouviu "os estrondos" que vinham do auditório onde morreram 89 pessoas, durante a atuação dos Eagles of Death Metal..Ontem, o toldo amarelo por cima da porta do auditório ainda mantinha o anúncio do concerto. Ainda era possível ler Eagles escrito em letras negras. Por baixo daquele toldo passaram os terroristas e por ali fugiram os sobreviventes. "Desesperados. A pedir socorro", relata Imene Ahmed, que tinha descido do prédio onde vive para "tomar uma bebida" com a mãe, no bar Baromètre, situado perto da sala de espetáculos.."Tínhamos acabado de chegar e a minha mãe disse-me: são só petardos e eu disse: não, não são petardos. São mesmo tiros", relata a estudante de 21 anos, que testemunhou a fuga de dezenas de pessoas "ensanguentadas". "Vimos as pessoas começarem a correr desde o Bataclan até aqui. Depois começámos a ver a polícia a chegar. Depois fomos barradas. Ficámos cercadas pela polícia, que dizia para nos escondermos. Todos no chão! Todos no chão", recorda. "Escondemo-nos na cozinha. A proprietária escondeu-nos. E, assim que libertaram os reféns do Bataclan, trouxeram-nos para o bar e fomos nós que nos ocupamos deles. Demos-lhes de beber, acolhemo-los com cachecóis, emprestámos-lhes o telefone para ligarem para a família", conta Imene..Socorrer jovens feridos.Uns metros mais à frente, "uns 40 jovens" entraram por um prédio dentro a "pedir socorro". Foi Margarida Sousa, emigrante portuguesa que é porteira no prédio, quem lhes abriu a porta. Ao DN, contou que viveu "uma noite horrível", com "os jovens a pedir socorro, cheios de sangue e cinco deles com balas no corpo". O tom calmo e sereno com que Margarida Sousa recorda a noite dos atentados contrasta com o "pânico" que lhe entrou pela casa, quando "estava sentada ao telefone" a falar com a filha. "Acolhi na minha casa uma jovem com balas nas costas, outro jovem com balas nos braços e uma jovem com uma bala no braço, mesmo ao lado do peito", relata a portuguesa, dizendo que "não podia virar as costas àquelas pessoas"..[twitter:665504575428894720]."Eles queriam esconder-se porque estavam com muito medo. Sabiam que estavam a correr muito perigo depois do que já tinham vivido no Bataclan. Tentaram esconder-se nas escadas e gritavam: fechem as portas, fechem as cortinas. E pediam para apagar as luzes, para que ninguém se apercebesse de que estavam aqui em minha casa", conta Margarida Sousa..A emigrante portuguesa que diz ter feito "o que tinha a fazer" na noite de sexta feira prestou-lhes os primeiros socorros "dando copos de água, café, chá, comida e qualquer coisa que os acalmasse". Enquanto o fazia ouviu relatos de verdadeiro terror, como o de "uma jovem, a Juliette, que passou por cima de corpos mas tinha de tentar fugir"..Enviado especial a Paris