"Portugal já atingiu uma situação confortável"
Portugal já atingiu uma situação confortável em relação à covid-19, dois anos depois de terem sido diagnosticados os dois primeiros casos no país. Quem o diz é o professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Carlos Antunes, ao analisar os dados divulgados ontem pelo Boletim diário da Direção-geral da Saúde (DGS). "Podemos dizer que o país atingiu uma situação relativamente confortável, tendo em conta que somos também dos países com menos restrições", referiu ao DN.
Segundo os dados oficiais, Portugal registou ontem 8833 novos casos de covid-19 e 25 óbitos. Carlos Antunes destaca que o número de infeções pode ter um défice de dois mil a três mil casos, dado que reportam a um dia de feriado, durante o qual podem ter sido feitos menos testes. No entanto, mesmo que os números sejam atualizados hoje ou amanhã, o analista considera que "a estabilização que já se atingiu está abaixo do que era previsto há duas semanas".
Recorde-se que a análise que o professor fez ao DN há duas semanas apontava para uma estabilização no final de fevereiro ou princípio de março entre os 10 mil e os 14 mil casos. Os dados registados a sete dias indicam agora que a "estabilização deve ser alcançada entre os oito mil e os dez mil casos, podendo ainda descer mais, até aos sete mil casos", mas tudo irá depender da subida do R (t), ratio de transmissibilidade, que o boletim de ontem indicava estar em 0,76 a nível nacional e em 0,75 no continente, embora a tendência seja para subir e aproximar-se mais de 1.
Contudo, sublinha Carlos Antunes, neste momento, há um fator que poderá ser muito positivo para a estabilização da doença. "Vamos entrar na primavera, as pessoas vão fazer mais vida ao lar livre do que em espaços fechados, e esta situação não é tão propícia ao desenvolvimento do vírus".
De acordo com o professor, a tendência de descida nas várias regiões mantém-se, sendo mais acelerada numas, nomeadamente no Norte, porque também foi aí que cresceu mais rapidamente, e mais lenta noutras, como em Lisboa e Vale do Tejo, Centro, Alentejo e Algarve. A mesma tendência observa-se também na desaceleração e na redução da incidência no indicador da idade, já que a redução mais acentuada em termos de número de casos ocorreu nas crianças dos 5 aos 11 anos, a seguir nos jovens e depois nos adultos.
Para Carlos Antunes, que desde o início da pandemia integra a equipa da Faculdade de Ciências que faz a modelação da evolução da doença, há apenas uma preocupação que deve ser monitorizada e vigiada por mais tempo, que é a evolução da doença e dos óbitos nas faixas etárias acima dos 65 anos. Segundo o professor, "ainda há um risco de óbito que tem de ser acautelado nestas faixas etárias".
Ou seja, "neste momento, Portugal está com uma média diária de 27 óbitos, o que corresponde a 43 óbitos por milhão de habitante a 14 dias e esta ainda é uma média elevada". Ainda está acima da média referenciada pelo Centro Europeu de Controlo e Prevenção de Doenças (ECDC, sigla inglesa), que indica que o risco referência para os óbitos deve ser uma média diária abaixo dos 20. Neste sentido, "ainda não podemos descansar".
Em relação ao dia de ontem, há a registar um aumento do número de internamentos, mais 42 do que no dia anterior, sendo agora o total de 1400. Destes, há 90 em cuidados intensivos, menos seis do que nas 24 horas anteriores. A incidência divulgada pelo boletim da DGS é de 1638,1 a nível nacional e de 1557,3 no continente, embora a tendência seja para diminuir ainda mais.
Numa entrevista ontem à Agência Lusa a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, confirmou que esta situação deverá levar ao "abrandamento de restrições na primavera". No entanto, alerta poder ser necessário, nos próximos invernos, "dar alguns passos atrás". "Pode acontecer que nos próximos outonos e invernos seja necessário adaptar medidas. Uns anos serão mais restritivas, noutros menos", admitiu. Mais tais comportamentos "não serão difíceis de adotar pelos portugueses", já que "o ser humano tem uma grande capacidade de adaptação e este será mais um fator que aparece nas nossas vidas e vamos aprender a lidar com ele quase instintivamente", concluiu Graça Freitas.