Maria de Lourdes Sá Teixeira."Voei, voei enfim!" "Foi na linda manhã de 1 de junho do ano corrente, prestes a sumir-se nos umbrais do século XX, que fui largada na pista da Escola Militar de Aviação. Semelhante à avezita que subitamente se vê liberta de um cativeiro de longos meses, entre as grades da sua prisão, e que voa, voa, em pleno ar, respirando sofregamente a sua pureza na imensidade do espaço infinito, análoga sensação senti, ao ver abrirem-se para mim, de par em par, as portas do AR, e, sozinha, num à-vontade, alegre e confiante, a mão firme na 'manche', numa ânsia louca de subir, voei, voei enfim.".Em 1928, Maria de Lourdes Braga de Sá Teixeira tornou-se a primeira mulher portuguesa a ter o brevet de piloto. Tinha 21 anos. Numa entrevista ao jornal Actualidades, explicou como foi dura a batalha que travou para conseguir subir aos céus aos comandos de um Caudron G3. O seu instrutor foi o então capitão-aviador Craveiro Lopes..Toda a gente a tentava demover: o pai foi o mais resistente, a família inteira era contra tal atitude. Mas tal era a vontade e tão profunda a tristeza que lhe sumia pelo corpo por não poder voar, que conseguiu o seu objetivo.."Entristecia-me muito tanta oposição. Porquê? Que mal havia em querer voar? Parece que emagreci demais. Os meus chegaram a recear pela minha saúde. O médico surgiu na pessoa do pai, que me prometeu, que se eu me alimentasse e não me entristecesse - o que era inconveniente para a minha saúde -, procuraria obter a minha admissão na Escola. Cumpriu.". Cesina Bermudes.19 valores para o parto sem dor Em 1933 ainda não era propriamente comum - longe disso, aliás - ver uma mulher passear nos corredores da Faculdade de Medicina de Lisboa. Cesina Borges Adães Bermudes era, porém, uma das poucas que naquele ano ali concluíram o curso. O que Cesina fez antes de toda a gente foi conseguir obter o doutoramento em Medicina. Foi em 1947 e a prova foi superada com a nota final de 19 valores..Nasceu a 20 de maio de 1908, ainda vigorava no país a monarquia. Lisboeta, a mãe pariu-a na Freguesia dos Anjos, era filha do escritor de teatro e ensaísta Félix Bermudes e de Cândida Bermudes..Cedo se habituou a ser uma mulher entre muitos homens. No Liceu Camões era a única rapariga numa turma de 15 rapazes. E sozinha chegou ao doutoramento depois da especialidade em Obstetrícia..Esteve três meses presa em Caxias, porque integrava a Comissão Central do Movimento Nacional Democrático Feminino - era uma feminista fervorosa. Saiu da prisão mas ficou impedida de dar aulas na Faculdade de Medicina..Em 1954 decide ir para Paris, onde se especializou no chamado, na altura, "parto sem dor", um método da autoria do famoso Fernand Lamaze (que deu o nome às respirações que durante muito tempo se ensinaram às mulheres grávidas). Regressou a Portugal e ajudou a nascer mais de três mil bebés na Clínica Bensaúde, em Lisboa e Cascais, que recebia mães solteiras que não eram atendidas nos hospitais públicos. No meio disto tudo ainda praticava desporto: o ciclismo era o favorito - participava na Volta a Lisboa em bicicleta - mas ainda fazia ginástica, hipismo, tiro e dança. Era, talvez, uma supermulher.. Manuela de Azevedo.Escrever as misérias da ditadura Nasceu em 1911 e passou a adolescência em Viseu, onde fez o curso dos liceus e começou a dar aulas de Português e Francês. Mas em 1938 regressou à capital onde tinha nascido. Inspirada pelo pai, correspondente do jornal O Século, Manuela de Azevedo tornou-se a primeira mulher jornalista portuguesa ao serviço do jornal República..Em 1942 já era chefe de redação da revista Vida Mundial, mas não apreciava a lentidão das edições semanais. Por isso mudou-se para o Diário de Lisboa, até chegar ao Diário de Notícias, onde se tornou grande repórter..Escreveu sobre as misérias da ditadura, foi em reportagem aos bairros degradados de Lisboa, esteve nos campos de arroz do vale do Sado. Entrevistou Hemingway, Eva Perón e o rei de Itália. E foi autora de várias obras literárias. Reformou-se aos 85 anos, morreu aos 105. "Uma das razões por que pedi a reforma - a mais importante foi a vontade de sair pelo meu próprio pé - foi saber que teria de passar a escrever num computador. A minha imaginação era muito rápida, fluida, e só o pulso acompanhava a cabeça. Mas sempre me facilitaram a vida. No Diário de Notícias, designaram uma pessoa para passar os meus textos.". Maria Cândida, Maria Guardiona e Domitila.As primeiras deputadas 1934. Vigorava a Segunda República e em dezembro realizaram-se as eleições para a Assembleia Nacional, constituída por 90 deputados. Pela primeira vez na história de Portugal, três mulheres foram eleitas. Faziam parte de uma lista única nacional..A 10 de janeiro de 1935 tomaram posse. Maria Cândida Parreira tinha 58 anos. Era advogada licenciada em Direito pela Universidade de Lisboa. Segundo consta da sua nota biográfica, foi autora da proposta, aprovada por unanimidade, da primeira licença de maternidade: as mulheres empregadas ou assalariadas com mais de um ano de serviço podiam ser dispensadas do trabalho durante 30 dias em caso de parto, com um subsídio pelo menos igual a um terço do ordenado que auferiam..Maria Batista Guardiola, licenciada em Matemática e professora, chegou com 39 anos ao Parlamento. Próxima do Estado Novo, foi comissária nacional da Mocidade Portuguesa Feminina e vice-presidente da Obra das Mães pela Educação Nacional..Domitila Carvalho era médica e tinha sido a primeira mulher a frequentar a Universidade de Coimbra, onde se licenciou em Matemática, Filosofia e Medicina. Foi poetisa, socióloga, professora e deputada. Tinha 64 anos quando chegou à Assembleia Nacional. Era monárquica e conservadora e próxima de António de Oliveira Salazar. Interessava-a a questão da mortalidade infantil e da educação.