Polícia Marítima. Associação impugna despacho que mexe nos salários dos agentes

Ex-secretário de Estado Marcos Perestrello aprovou, três dias antes de cessar funções, despacho sobre matéria estatutária sem intervenção dos representantes associativos da PM.
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A Associação Socio-Profissional da Polícia Marítima (ASPPM) vai impugnar esta semana o recém-aprovado despacho que altera os valores remuneratórios dos agentes, por essa ser uma questão estatutária, soube o DN.

Na base da providência cautelar a interpor junto da Procuradoria-Geral da República, está "a violação estatutária grosseira" de a ASPPM não ter sido ouvida pelo Ministério da Defesa - em rigor o então secretário de Estado Marcos Perestrello, com tutela delegada sobre a Autoridade Marítima Nacional (AMN) - na elaboração de um diploma que interfere com o sistema retributivo dos polícias marítimos, afirmou Aníbal Rosa, da comissão administrativa da ASPPM.

A lei relativa ao exercício de direitos do pessoal da Polícia Marítima (PM) diz expressamente que "as associações profissionais legalmente constituídas têm direito a [...] tomar parte na definição do estatuto profissional e nas condições de exercício da atividade policial, incluindo as condições de trabalho e o sistema retributivo".

Além de a ASPPM não ter participado na definição do novo modelo de redistribuição das verbas compensatórias para todo o pessoal em serviço na AMN, os dirigentes associativos também vão recorrer ao Ministério Público pela alegada ilegalidade que dizem ter sido cometida pelo então secretário de Estado da Defesa Marcos Perestrello.

O despacho em causa foi assinado três dias antes de Marcos Perestrello ter cessado funções devido à demissão do então ministro da Defesa Azeredo Lopes, evocando um episódio semelhante na anterior passagem pelo cargo. No final de março de 2011, semanas antes da posse do governo PSD/CDS e quando havia mais de 40 processos em tribunal contra o uso indevido de artigos de uniforme por militares da Marinha em serviço na PM, aquele governante alterou o respetivo Regulamento - o que extinguiu os casos, lembraram dirigentes da ASPPM.

Agora está em causa a alteração de uma norma cujo conteúdo remete para uma lei da Assembleia da República, uma vez que só o pode ser modificada depois de aprovado o sistema retributivo específico do pessoal militarizado da PM - uma lei da competência do Parlamento, observou a ASPPM.

O Regulamento do Horário de Trabalho do Pessoal Militarizado da PM determina que, enquanto não existir aquele sistema retributivo, as verbas compensatórias - leia-se emolumentos - recebidas pelos polícias marítimos fazem parte do seu salário, explicou Aníbal Rosa.

Dividir bolo com outros profissionais

O despacho de Marcos Perestrello deixa a definição do novo modelo de redistribuição dos emolumentos ao critério - algo que os dirigentes associativos da PM qualificam como arbitrariedade - do diretor-geral da Autoridade Marítima (DGAM) e comandante-geral da PM.

Os emolumentos são verbas recebidas por serviços prestados nas capitanias pelo pessoal em serviço nas capitanias dos portos e pelos polícias marítimos, revertendo uma parte para o Estado e sendo outra redistribuída pelos profissionais diretamente envolvidos nesse trabalho.

Daí que até agora estavam excluídos outros grupos que integram a AMN, como os faroleiros ou o pessoal do Instituto de Socorros a Náufragos (ISN) e das Estações Salva-Vidas - (ESV) mas que não é o caso da PM, por se tratar de uma força de segurança cujo comandante-geral depende diretamente do ministro da Defesa.

Ora uma das alterações do despacho de Marcos Perestrello é que os emolumentos passam a ser distribuídos por todos os profissionais da AMN - o que significa que aqueles cujo trabalho não produz receita passam também a receber desse bolo a partir do próximo dia 1 de janeiro de 2019.

Exemplo disso e que já sucede há algum tempo, segundo outra das fontes da PM, ocorre com os juristas em serviço na DGAM e que foram colocados a prestar serviço em acumulação nalgumas capitanias: o bolo dos emolumentos gerados e repartidos por quem estava em cada uma dessas estruturas passou a ser dividido também pelos juristas.

Embora os dirigentes associativos da PM se mostrem convictos que as novas regras vão implicar necessariamente uma redução dessa componente salarial auferida pelos polícias marítimos, a verdade é que o DGAM pode determinar que "os limites de compensação" a atribuir aos faroleiros e pessoal do ISN e ESV seja de zero em 2019.

Há ainda uma outra alteração que pode tornar nula ou hipoteticamente aumentar a percentagem até agora auferida pelo pessoal das capitanias e pelos polícias marítimos: o despacho aprovado por Marcos Perestrello deixou de qualificar como taxas algumas das verbas cobradas - passando tudo a ser designado como pagamento de "serviços", aumentando o bolo global cobrado aos utentes.

O significado desse pormenor reside no facto de as verbas cobradas a título de taxas não poderem ser distribuídas pelo pessoal - como é o caso dos faroleiros relativamente à taxa de farolagem aplicada aos navios estrangeiros ou embarcações de recreio.

Outra alteração complementar, mas constante de outro diploma aprovado no início de outubro, prende-se com o aumento dos valores que a AMN passou a cobrar desde 15 de outubro pelos serviços prestados e que, nalguns casos, duplica e triplica as verbas em causa.

Donde, aumentando o bolo dos emolumentos até agora repartidos entre o pessoal das capitanias e da PM, a sua distribuição por mais algumas centenas de profissionais ao serviço da AMN pode não reduzir o que os primeiros vão receber até ao final do ano - mas desconhecendo-se os critérios a definir pelo DGMA e eventuais estimativas quanto ao acréscimo global dos emolumentos a receber desde 15 de outubro, sobram as desconfianças dos dirigentes associativos daquela polícia.

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