Piloto "capturado na Líbia" nunca esteve na Força Aérea
Não há registo físico na Força Aérea nem memória visual, entre os seus pilotos dos caças F-16, que o piloto alegadamente capturado terça-feira na Líbia tenha estado nas fileiras, garantiram fontes militares ao DN.
Mais de 24 horas depois da divulgação, pelas forças do Exército Nacional Líbio (LNA, sigla em inglês), da captura de um piloto ao serviço do governo de União Nacional (GNA) após abaterem o seu caça Mirage F-1ED, são ínfimas as possibilidades de o indivíduo em causa ser português.
Esta quarta-feira, em Braga, o ministro da Defesa frisou que o alegado piloto abatido na Líbia "não é das Forças Armadas" portuguesas. Citado pela Lusa, João Gomes Cravinho acrescentou: "Não tenho mais nenhuma informação sobre esse problema".
As dúvidas sobre a veracidade da história têm vindo a crescer face à ausência de imagens do caça alegadamente abatido ou do paraquedas do elemento apresentado como o seu piloto, que se identificara como sendo português e se presume ter ejetado face à ausência de ferimentos compatíveis com a sua presença no cockpit aquando do embate no solo.
Note-se que a Reuters, citando habitantes da cidade de Gharyan (a cerca de 80 quilómetros a sul de Trípoli), noticiou terça-feira ter havido uma explosão causada por disparos da defesa antiaérea do LNA contra um aparelho que sobrevoava o local. "O caça foi abatido na cidade de Al-Hira [a 10 quilómetros de Gharyan] e vi tropas do LNA capturarem o piloto", disse uma dessas fontes.
No passado dia 25 de abril, quando o porta-voz do LNA anunciou via Twitter que dois dias antes tinha sido abatido outro Mirage F1, a mensagem estava acompanhada por várias imagens: da cadeira em que o piloto se ejetara, do paraquedas, da 'chapa' com o nome do piloto (Borys Reys, equatoriano).
Um piloto de F-16, que conhece "todos os pilotos dos F-16" portugueses e de outros países, disse mesmo ao DN que "duvidava muito que [o homem em causa] seja de F-16" - dado o conhecimento mútuo existente entre o relativamente reduzido número desses militares de elite e os anos de formação exigidos para chegar àquele patamar de exigência.
Este oficial superior da Força Aérea, ouvido sob anonimato por não estar autorizado a falar, manifestou ainda muitas reservas sobre a possibilidade um piloto de ultraligeiros ou avionetas ser capaz de operar um caça militar.
Ao contrário de quem tira a carta de condução de ligeiros e fica habilitado a guiar qualquer automóvel, na aviação exigem-se qualificações específicas para operar um modelo específico porque "cada um tem especificidades" - monomotor ou multimotores? Grande, pequeno? De carga ou passageiros, muitos ou poucos? Civil ou militar? Jatos ou a hélice? Airbus ou Boeing?
Acresce, no caso dos caças militares, que não se pilotam como se fossem meros aviões. Os caças militares operam-se "enquanto sistema de armas", onde é preciso "largar bombas, fazer missões a sério, correr riscos, saber reagir às ameaças.... isso exige muito treino, é preciso ter muitas aptidões e está no outro extremo" de voar um ultraligeiro, explicou aquele piloto de F-16.
A própria ausência de uma história pessoal minimamente elaborada, face ao que se sabe ter sido dito pelo alegado piloto português aquando da sua captura, levanta reservas aos pilotos militares profissionais ouvidos pelo DN.
Em causa o facto de os pilotos militares fazerem obrigatoriamente cursos de fuga e evasão, em que a elaboração de uma história pessoal fictícia para transmitirem ao inimigo que os captura - como forma de sobrevivência e para dar tempo a que seja lançada uma operação de resgate.