Peritos duvidam, mas mundo treme sob a ameaça da bomba H de Kim
"Um evento assustador para o mundo" e um "passo de gigante para o povo norte-coreano, que diariamente realiza milagres". Foi assim que a propaganda de Pyongyang anunciou o primeiro teste subterrâneo de uma bomba de hidrogénio, dez anos depois de ter feito o primeiro ensaio nuclear. Os peritos receberam estas declarações com ceticismo e a destruição do planeta - já assegurada caso EUA e Rússia usassem as suas 15 mil ogivas, como não o fizeram na Guerra Fria - pode não ter ficado mais perto, mas a Coreia do Norte voltou a provar que a proliferação nuclear parece imparável. Mesmo num país tão isolado como o de Kim Jong-un. E com esta posição de força, o líder norte-coreano deixou a região mais perto da escalada nuclear.
Eram 10:00 (1:30 em Lisboa) quando um forte abalo dava o primeiro sinal de que a Coreia do Norte testara uma bomba atómica no subsolo junto à central de Punggye-ri. A confirmação surgiu pouco depois através da televisão estatal. "O som da explosão devia ter sido dez vezes maior", caso se tratasse mesmo de uma bomba H, garantiu à BBC Bruce Bennet, analista da Rand Corporation. Um ceticismo partilhado pelo perito militar chinês Du Wenlong que, na CCTV, garantiu que "os dados não confirmam as sugestões de que a bomba fosse de hidrogénio". Apesar de Pequim ser um dos raros aliados - com a Rússia - de Pyongyang, desta vez parece não ter sido informado da nova provocação do regime dos Kim (Jong-un sucedeu ao pai, Kim Jong-il, em 2011, que por sua vez sucedera ao pai, Kim Il-sung, em 1994).
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Com os três ensaios nucleares que realizou desde 2006 e o teste da bomba H ontem, Pyongyang garantiu o lugar no restrito clube das potências nucleares. E provou que apesar dos tratados internacionais de não-proliferação, desde o fim da Guerra Fria Índia, Paquistão e Coreia do Norte juntaram-se a EUA, Rússia, Reino Unido, França, China e Israel (mesmo se este último não o reconhece) no grupo de países com capacidade nuclear.
Segundo os peritos internacionais, Pyongyang terá neste momento seis a dez ogivas nucleares. A dúvida reside na capacidade dos norte-coreanos em miniaturizar essas armas nucleares de forma a serem colocadas em mísseis de médio e longo alcance.
Mas o simples facto de ter testado uma bomba H, mesmo que a explosão tenha sido menor do que deveria, já constitui um avanço no programa nuclear de Pyongyang, depois de no início de 2015 ter reiniciado a central de Yongbyon.
Novas sanções
Reunido de emergência ontem à tarde, o Conselho de Segurança da ONU anunciou ter começado a trabalhar em novas medidas para reagir ao quarto ensaio nuclear norte-coreanos, que se deverão traduzir no reforço das sanções contra Pyongyang. O embaixador do Uruguai, Elbio Rosselli, que neste momento presidente ao Conselho, prometeu uma resposta "à medida da gravidade da violação" praticada pelos norte-coreanos. À entrada para o encontro, o secretário geral das Nações Unidas, o sul-coreano Ban Ki-moon, denunciou um testo "profundamente perturbador" e que ameaça "gravemente a segurança regional".
Se as condenações ao teste realizado por Pyongyang foram unânimes - da União Europeia à NATO, passando pela Rússia e Estados Unidos -, as críticas mais fortes vieram dos vizinhos. Sobretudo a Coreia do Sul, com a qual o Norte está ainda oficialmente em guerra, uma vez que apesar do armistício, a paz nunca foi assinada após o conflito de 1950-53. A presidente sul-coreana, Park Geun-hye, denunciou "uma provocação grave à nossa segurança nacional, mas também um ato que ameaça as nossas vidas e o nosso futuro. Além de ser um desafio direto à paz e à estabilidade mundial".
A Norte da fronteira, ontem terá sido com certeza um dia de festa, tal como foi em 2013, por ocasião do último teste nuclear, quando os funcionários públicos norte-coreanos celebraram com banquetes e cerveja, numa demonstração de orgulho coletivo. Desta vez a festa deverá prolongar-se até amanhã, 33.º aniversário de Kim Jong-un, que assim reforça o culto da imagem.
Preocupada está também a China. É que se Pequim não parece disposta a deixar cair o aliado norte-coreano, só pode ficar desagradada com um teste nuclear que irá dar pretexto aos países da região para reforçar as defesas. Seja o Japão a adquirir mais mísseis balísticos com apoio dos EUA ou a Coreia do Sul a comprar aos americanos um sistema de mísseis de grande altitude que até agora recusara. Num zona de equilíbrios frágeis e fortes rivalidades, qualquer movimentação militar pode tornar-se explosiva
Bolsas em queda
Um pouco por todo o mundo as bolsas fecharam ontem em queda, com o ensaio nuclear norte-coreano a juntar-se a uma longa lista de preocupações geopolíticas, entre as quais a tensão entre Arábia Saudita e Irão. A China, por exemplo, viu o yuan desvalorizar ainda mais.
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