Perdidos em Óbidos

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Walter Benjamin escreveu que a melhor forma de conhecer uma cidade é perdendo-se por ela. Longe de mim querer emendar um filósofo, muito menos um alemão, mas eu diria que a melhor forma de conhecer uma cidade é perdendo-se do seu pai. Foi assim que caminhei duas horas por Óbidos, experimentei ginjinha e descobri as virtudes de uma bifana - come bifanas, pequena;/ Come bifanas!/ Olha que não há mais metafísica no mundo senão bifanas.

Em 1991 meu pai morou em Portugal e passei as férias aí neste país. Ou melhor, naquele outro país de então. CR7 ainda brincava na ilha da Madeira. Viúvas de preto desviavam de junkies sob janelas com anáguas ao vento e ninguém sonharia em arrumar um blind date entre a Time Out e o Mercado da Ribeira.

Quando fui chamado para a Folio, portanto, convidei meu pai. Tudo ia bem até que ele (um pai sem 4G, como convém) diz que vai procurar um banheiro e me encontra, em breve, ali na muralha. Só depois de duas horas de perambulação, quando ele foi resgatado do outro lado da cidade pela santa Catarina, editora na Tinta da China, percebemos que era como se, no Saara, houvéssemos marcado "perto da duna".

Procurando-o pelas ruelas de Óbidos, no entanto, entre hordas de japoneses e primaveras em flor, construções medievais e patrícios elegantes, entendi este Portugal do século XXI em que as viúvas de preto deram lugar às feministas e os junkies, aos turistas. O brilhante Ricardo Araújo Pereira, com quem horas mais tarde eu participaria de uma conversa, pauta o debate político. A geringonça funciona e CR7 acaba de ser eleito, pela quinta vez, o melhor do mundo. OK, uma ou outra anágua ainda balança na janela - felizmente -, mas deve ser coisa de hipsters ou norma da Autoridade Turística Nacional.

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