Paris foi uma festa para Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa
O terceiro e último dia de Marcelo e Costa em Paris acabou debaixo de chuva intensa e com ambos imersos num banho de multidão proporcionado por dezenas de emigrantes que, apesar do mau tempo, foram, em Creteil, arredores da capital francesa, à festa popular da Rádio Alpha, a rádio dos portugueses de França.
Os dois, depois de percorrerem parte das barraquinhas de comes e bebes da festa sujeitos a apertões, beijos, abraços e amassos e pedidos para dezenas de "selfies", subiram ao palco onde ainda atuava um artista "pimba" para falar às centenas que os aguardavam no extenso relvado em frente.
A a chuva deu pretexto para, mais uma vez, o Presidente da República e o primeiro-ministro exibirem a qualidade da coabitação. Primeiro fala o chefe do Governo que anuncia que no próximo dia 18 estará de novo em Paris a inaugurar um "Espaço do Cidadão" com 60 serviços públicos e um objetivo: que seja "cada vez menos difícil ser português fora de Portugal".
Depois Marcelo discursa, os pingos transformam-se em chuva à séria - e Costa aproxima-se, de guarda-chuva aberto, protegendo Marcelo. E este não resistiu: "Estão a ver o que é a colaboração entre os dois poderes? Mas vejam bem, quem tem o guarda-chuva é o senhor primeiro-ministro de esquerda, quem é apoiado é o Presidente que veio da direita!"
Ri-se ele, ri-se Costa, ri-se o povo, e passado uns minutos já não chove. Marcelo volta ao discurso do discurso hiperbólico do "povo". "O melhor que nós temos é o povo!" Depois ressalva, olhando para o primeiro-ministro: "Não é que os políticos também não sejam bons..." E volta à carga: "Mas o povo é melhor do que os políticos."
Termina o costume a dialogar com a multidão que o ouvia:"Qual é o melhor país do mundo?" - e o povo responde "Portugal!". E assim sucessivamente: "Qual é o melhor país do mundo? Qual é a melhor seleção do mundo? Qual é a pátria que queremos para os nossos netos, para os nossos bisnetos? Viva Portugal!"
O dia de Marcelo foi ziguezagueando entre a alta cultura e o contacto direto com o povo emigrante. Começou na Fundação Gulbenkian, seguiu para a Rádio Alpha, voltou a Paris para uma exposição no Trocadero sobre 50 anos de arquitetura portuguesas e logo a seguir outra, no Grand Palais, com a obra do pintor Amadeo de Souza-Cardoso.
Aqui António Costa fez aos jornalistas o balanço da visita e falou da sintonia com o Presidente da República ("a relação que temos estabelecido com o atual Presidente da República é objetivamente muito saudável, muito sólida") e reconhecendo que "boas relações pessoais ajudam boas relações institucionais" - embora "como disse o senhor Presidente da República, as relações institucionais têm de superar essa dimensão pessoal".
A qualidade na coabitação "é um sinal de confiança para todos" e "é muito saudável que os órgãos de soberania em vez de criarem problemas uns aos outros se apoiem uns aos outros": "O Governo está totalmente empenhado em manter uma relação de excelência com o atual Presidente da República, como teve com o anterior", e é essa a vontade dos portugueses, "os dois puxarem em conjunto pelo país".
Quanto ao PSD, "é preciso dar tempo e respeitar as diferenças dos outros". "Temos que conseguir ir superando e vencendo essas diferenças. O país viveu momentos de alguma tensão, acho que hoje estão superados, e estou certo que também o PSD saberá juntar a esse movimento que é um movimento que o país deseja, de nos concentrarmos nos desafios do futuro".
Já Marcelo tinha pedido de manhã, quando deixava a Gulbenkian, que a sua "convergência" com o Governo "se alargasse a outros sectores e a outros partidos", e isto "para um maior número de domínios" como a segurança social, a saúde ou a educação - embora reconhecendo que "não é possível para já na educação e vai demorar tempo na segurança social".
Um vai à missa, o outro não
Sobre a qualidade da sua relação institucional com o primeiro-ministro explicou-a dizendo que "há prioridades que exigem grande estabilidade e grande convergência entre os órgãos de soberania". Divertido, assinalou que nem tudo é sintonia, há também há "diversidade": "Eu vou à missa, ele não vai à missa", disse - precisamente minutos de se dirigir a uma celebração religiosa com portugueses de Paris.
Nessa ocasião, o Presidente confirmou que um dos pontos importantes nos seus contactos com as autoridades francesas tem sido a promoção da candidatura de António Guterres a secretário-geral da ONU. Salientou, no entanto, um "handicap" do antigo primeiro-ministro português e ex-alto comissário das Nações Unidas para os Refugiados: "Às vezes, ser-se bom demais prejudica" e conhecem-se bem casos de candidaturas internacionais que vencem "à última hora na base de quem levanta o menor número de problemas". Neste aspeto, António Costa sublinharia depois que a França tem uma posição de "reserva" dado ser membro permanente do Conselho de Segurança - mas seja como for recebeu sinais de "encorajamento".
O primeiro-ministro fez "um balanço francamente positivo" das celebrações do Dia de Portugal em Paris e destacou o compromisso do Presidente francês sobre o ensino do português, considerando que é uma oportunidade para muitos professores. "Isto é obviamente muito importante para a difusão da nossa língua. É também uma oportunidade de trabalho para muitos professores de português que, por via das alterações demográficas, hoje não têm trabalho em Portugal e que podem encontrar aqui, mas é também um grande desafio para a nossa tecnologia e para a capacidade de fomentar o ensino à distância", afirmou, dizendo que em breve serão marcadas "as reuniões do grupo técnico que existe entre Portugal e França para o alargamento da presença do português" como língua de aprendizagem nas escolas francesas.
E o reforço deste ensino, disse ainda, não será apenas para estudantes originários da comunidade portuguesa mas sim para todos.