Paris e Bruxelas proíbem protestos inspirados no que bloqueia Otava
O protesto dos camionistas canadianos contra as restrições impostas para travar a covid-19, que mantém paralisado o centro de Otava, está a servir de inspiração noutros países. Perante a previsão de protestos em Paris e em Bruxelas, as autoridades de ambas as cidades já decretaram a proibição de ações do género, estando a empreender esforços para evitar os bloqueios de estradas e ameaçando com multas ou até penas de prisão aqueles que não cumprirem.
A dois meses das presidenciais francesas e tendo ainda presente o impacto dos protestos dos "coletes-amarelos" contra o governo de Emmanuel Macron, em 2018, a polícia parisiense avisou que haverá um destacamento especial para evitar bloqueios. O chefe da polícia, Didier Lallement, deu ordens para que os agentes sejam "firmes" com quem tentar violar a proibição do protesto, considerando que há "riscos de problemas para a ordem pública". Quem bloquear as estradas arrisca uma pena de até dois anos de prisão, uma multa de 4500 euros e três anos sem poder conduzir.
Na quarta-feira, vários veículos do "comboio da liberdade" francês partiram dos pontos mais afastados da capital, estando previsto que este fosse ganhando força à medida que atravessasse França. Ao contrário do que aconteceu no Canadá, não são os camionistas que estão por detrás desta caravana - do outro lado do Atlântico estes são trabalhadores independentes, enquanto que na Europa a maioria são trabalhadores de empresas de transportes. Os grupos, que recorrem às redes sociais para se organizar, são formados por elementos anti-vacinas, anti-passes sanitários e antigos "coletes amarelos", que contestam a perda de poder de compra ou o aumento dos combustíveis. A previsão é que cheguem a Paris esta sexta-feira ao final do dia, estando a proibição da polícia vigente até segunda-feira.
Em declarações à AFP, um dos manifestantes disse que pretendia continuar a avançar e que o objetivo do protesto era "fazer ouvir a sua voz" e não necessariamente "bloquear" Paris - apesar de ser isso que dizem as várias convocatórias nas redes sociais. "O objetivo declarado destes manifestantes será "bloquear a capital" ao travar a circulação rodoviária nas ruas de Paris para promover as suas reivindicações, antes de continuar o seu périplo em direção a Bruxelas no dia 14 de fevereiro", segundo o comunicado da polícia parisiense.
Tendo também em conta essa "convergência europeia" na capital belga, o presidente da câmara da cidade, Philippe Close, anunciou igualmente uma proibição deste tipo de protestos. Num comunicado em conjunto com a região de Bruxelas e o Ministério do Interior belga, Close disse que a polícia federal irá efetuar controlos fronteiriços para impedir os manifestantes de entrar no país. E que os participantes que já estejam na Bélgica seriam desviados para um grande parque de estacionamento junto ao estádio nacional, no norte da capital. O autarca lembrou ainda que não foi pedida qualquer autorização às autoridades para a realização de uma manifestação.
Também a polícia austríaca anunciou a proibição de um protesto semelhante, previsto para chegar a Viena esta sexta-feira. Centenas de veículos são esperados, temendo-se que queiram bloquear o centro da cidade.
Os protestos previstos para Paris, Bruxelas ou Viena não são contudo os primeiros que se inspiram em Otava. Na Nova Zelândia, manifestantes anti-vacinas acamparam frente ao Parlamento em Wellington durante três dias. Ontem, envolveram-se em confrontos com a polícia, que os procurava desalojar, tendo pelo menos 120 sido presos.
Nos EUA, as autoridades estão já em alerta. O departamento de Segurança Interna emitiu na terça-feira um aviso, citado pela CNN e a Yahoo News, que aponta para a possibilidade de um destes comboios poder começar na Califórnia e chegar a Washington o mais tardar em meados de março, "com um impacto potencial no Super Bowl [a final do futebol americano, este domingo, que se realiza a sul de Los Angeles] e o discurso do Estado da União [proferido pelo presidente Joe Biden no Congresso e] marcado para 1 de março".
Porque é que os camionistas canadianos estão em protesto?
Em novembro, o governo canadiano anunciou que, a partir de 15 de janeiro, todos os camionistas teriam que ser vacinados para cruzar a fronteira com os EUA ou teriam que fazer quarentena no regresso. Segundo as associações de camionistas, entre 85 e 90% serão vacinados. Com o tempo, os manifestantes passaram a exigir o fim de todas as restrições contra a covid-19.
O que é o freedom convoy, o "comboio da liberdade" ?
Milhares de camionistas percorreram o Canadá no chamado "comboio da liberdade" até chegar à capital a 28 de janeiro, mantendo desde então o centro de Otava bloqueado - o autarca já declarou o estado de emergência. Desde 7 de fevereiro que outro grupo bloqueia a ponte Ambassador, que liga Ontário a Detroit, nos EUA, tendo bloqueado já outras duas pontes, em Alberta e Manitoba.
Quem organizou o protesto?
A Canada Unity é o grupo por detrás do "comboio da liberdade". É liderado por James Bauder, adepto das teorias da conspiração e do movimento QAnon que apelidou a covid-19 de "o maior golpe político na história" e já tinha tentado organizar outros protestos contra o governo de Justin Trudeau. Outro nome que surge ligado aos protestos é o de Tamara Lich, que pertencia ao Partido Maverick, que defende a independência das três províncias ocidentais do país.
Quem apoia os protestos?
Os manifestantes têm recebido apoios de grupos anti-vacina e conservadoras dos EUA, incluindo o ex-presidente Donald Trump. E têm angariado fundos através de crowdfunding - tinham mais de dez milhões de dólares na GoFundMe, que decidiu entretanto que violava as suas regras e cancelou a conta. Mudaram entretanto para um site católico do mesmo género.
Como reagiu Trudeau?
O primeiro-ministro tem apelado ao fim do "cerco" a Otava e dos protestos nas pontes, que já estão a ter um impacto económico, com a necessidade de parar a produção em várias fábricas de carros dos dois lados da fronteira. A polícia ameaça entretanto deter os manifestantes.