Papagaios, araras, periquitos, pardais, corujas, avestruzes, cada ave mais exótica do que a outra, mas também cobras pítons, macacos, pumas, meixão e orquídeas fazem parte da lista de apreensões da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora Selvagens (CITES), do Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (SEPNA), o braço ambiental da GNR. Ou, dito de outra forma, a polícia do ambiente..É uma lista de espécies selvagens em vias de extinção e proibidas de importar/comercializar em todo o mundo sem que haja uma autorização prévia. Esse certificado, que em Portugal é da responsabilidade do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), é dado a título excecional, explica o tenente-coronel Vaz Alves, da direção do SEPNA..Ainda nesta sexta-feira um belga foi detido no aeroporto de Lima, no Peru, quando transportava 20 pássaros de espécies protegidas fechados em caixas de cartão no interior de uma mala de viagem. Em Portugal, é a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) que fiscaliza as bagagens nos postos fronteiriços, seja nos aeroportos seja nos portos ou nas fronteiras terrestres..A GNR apreendeu em 2017 (os últimos dados disponíveis) 394 espécies protegidas, sendo 40,3 % (159) aves. Entre estas, contabilizaram-se 53 inseparáveis-de-fischeri (papagaio pequeno), 23 roselas (periquitos), 16 pardais-java e 14 papagaios-cinzentos. E no ano anterior, entre 234 animais intercetados, 221 eram aves. Os répteis totalizaram 40 apreensões em 2017 e sete em 2016. São sobretudo pítons (25) e serpentes..As apreensões, que haviam descido em 2015, subiram em 2016 e em 2017. Neste último ano, o SEPNA detetou ainda um puma, 34 dentes de cachalote, um babuíno, um chimpanzé, 117 espécies de bivalves e 24 plantas, entre estas 17 orquídeas..Mas, sublinha, Vaz Alves, "a sociedade está mais sensibilizada para a proteção das espécies. E não só temos mais pessoas a denunciar a existência de animais selvagens em determinado local ou de maus-tratos, como elas próprias se recusam a ter um destes animais em sua casa"..Além do SEPNA, do ICNF e da AT, fiscalizam este comércio ilegal a ASAE, a PSP, o Corpo de Vigilantes da Natureza da Madeira e também pode intervir a PJ. Nem o ICNF nem a AT disponibilizaram informação em tempo útil sobre a sua ação. Daí que os dados divulgados pelo DN digam apenas respeito à atividade da GNR, o que significa que a totalidade das espécies protegidas ilegais detetadas em Portugal será em número superior, embora o SEPNA seja a primeira a intervir no terreno..Muitas vezes, os animais são importados em ovos, sendo Portugal a plataforma para os vender para outros países europeus e para outros continentes. É que este é um mercado de luxo ao qual, muitas vezes, não chegam as bolsas portuguesas.."Não podemos dizer que somos um país recetor porque estas espécies são muito caras, Portugal não tem poder de compra para estas espécies", justifica aquele dirigente..Uma arara-jacinto (originária da Amazónia) pode chegar aos 30 mil euros. O meixão (enguia bebé), cuja captura está proibida, chega a ser vendido na Ásia a 6500 euros o quilo..A GNR apreendeu 143,91 quilos de meixão em 2017, sendo esta a altura do ano em que se pratica esse tráfico. A enguia vem desovar no mar dos Sargaços, entre os Açores e os EUA, e esses peixes minúsculos são arrastados pelas correntes até à Europa, onde são capturados ilegalmente. Estas redes de tráfico incluem o pescador, que vende cada quilo entre 300 e 500 euros a um recetor que o revende ao armazenista que, por sua vez, tem ligações ao mercado asiático, o destino final..O que acontece às apreensões?.A intervenção do SEPNA pode desenvolver-se a partir de uma denúncia, numa ação de fiscalização ou numa investigação, algumas vezes em colaboração com a PSP, Lei n.º 95/2017. E há situações em que a Polícia Judiciária é chamada a intervir..Em março de 2015, a PJ, no âmbito de um inquérito dirigido pelo Ministério Público (DIAP de Lisboa), deteve um estrangeiro e um português, de 53 e 46 anos, respetivamente, pelos crimes de contrabando e e danos contra a natureza. .Contrabandeavam ovos de arara-azul-de-lear do Brasil e, quando as crias se libertavam do ovo (eclosão), vendiam as aves a intermediários que as revendiam em vários países europeus. Nessa operação, apreenderam duas araras azuis-de-lear, com um valor de mercado de 75 mil euros, e quatro aves de outras espécies protegida, no valor de 12 mil euros, divulgou a PJ..Em fevereiro do ano passado, o Comando Territorial de Leiria, através do Núcleo de Proteção Ambiental de Caldas da Rainha, identificou um homem de 51 anos por detenção de seis aves exóticas, em cativeiro, da família Psittacidae. As aves estavam no anexo de uma residência no concelho das Caldas da Rainha e não foi apresentada a declaração CITES. A não apresentação desta declaração é punível com uma coima que pode ir até aos 20 mil euros..Em ambos os casos, as aves foram levadas para centros de acolhimento especializados, como acontece com todos os animais detetados com vida e que têm por finalidade o comércio ilegal. Podem, entre outros, ser acolhidos pelo Jardim Zoológico de Lisboa, Parque Biológico de Gaia, o Zoomarine e os Centros de Recuperação de Animais da Quercus, dependendo da espécie..Se é um animal isolado e "está em perfeito estado de convivência com o dono, não há animosidade ou maus-tratos, por norma é contactado o ICNF, que, caso entenda que o proprietário tem condições para continuar a ser o detentor do animal, fica na sua posse enquanto aguarda uma decisão", explica o tenente-coronel Vaz Aves. Posteriormente, tenta-se devolver os animais ao país de origem..Apreensões de madeira, dentes de tubarão ou peles, por exemplo, são levados para incineração, "eliminando a possibilidade de voltar ao mercado ilegal"..Convenção reúne 183 países.A CITES, também designada por Convenção Washington, nasceu em 1975 e é assinada por 183 países. Não proíbe mas regulamenta o comércio de 35 mil espécies de animais e plantas, incluindo os seus produtos e derivados, como a madeira e o marfim. Regras que a Comissão Europeia tornou mais restritivas através do Regulamento 338/97.."Este regulamento serve para orientar o comércio mas não o proíbe totalmente. Se eu quiser uma espécie de arara ou um papagaio-cinzento, posso estabelecer contacto com um vendedor de outro país, mas preciso de autorização para fazer essa importação", esclarece Vaz Alves, para concluir: "Pode importar-se qualquer animal caso a autoridade valide a transação, contudo, não estou a ver o ICNF a autorizar a compra de um leão, tartarugas, papagaios, araras, etc.".São espécies protegidas e há animais que não estando em vias de extinção também estão regulamentados por serem muito parecidos com os que correm esse perigo. É o caso do lince-americano, que está na lista por ser semelhante ao nosso lince-ibérico, que é um animal protegido..O SEPNA é a autoridade policial portuguesa com mais competências em matéria de comércio de espécies selvagens, ao qual compete fazer cumprir as leis e os regulamentos de conservação e proteção da natureza e do meio ambiente, dos recursos hídricos, dos solos e da riqueza cinegética, piscícola, florestal ou outra, previstas na legislação ambiental, bem como investigar e reprimir práticas ilícitas. E está em estreita colaboração com o ICNF..Portugal, devido às suas relações e às comunicações aéreas com as comunidades de países de língua portuguesa (África e Brasil), importa espécies exóticas preferencialmente destas zonas..As redes estabelecem rotas de acordo com a espécie traficada e o mercado. O tenente-coronel Vaz Alves identifica três rotas que utilizam Portugal como plataforma para a Europa: rota de África - sobretudo marfim e alguns mamíferos; da América Latina, nomeadamente o Brasil - importação de aves da bacia amazónica; da Ásia e também de África - répteis, que têm como destino final não só a Europa mas também a Ásia.