Os improváveis sucessores de Cavaco Silva em Belém

Dentro de cinco anos, pode haver uma aposta em figuras partidárias, embora a opção deva  ser antes em independentes.
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Se a história fosse previsível e a política tivesse lógica, então poderia afirmar-se, com grande probabilidade de acertar, que as próximas presidenciais seriam disputadas pelos estrangeirados António Guterres (então com 66 anos) e Durão Barroso (nessa época com 59 anos), que surgiriam como representantes naturais de uma outra geração na corrida para Belém.

A estratégia presidencial para esse novo ciclo protagonizada pelos socialistas e pelos sociais-democratas assentaria assim no currículo internacional dos dois políticos (um é alto-comissário das Nações Unidas para os Refugiados, o outro presidente da Comissão Europeia), com a vantagem de ambos disputarem o volátil eleitorado central e puderem polarizar os apoios à esquerda e à direita.

Mas, assim como ninguém sabe se o País, dentro de cinco anos, se terá radicalizado à esquerda ou se, pelo contrário, o eleitorado se tornou mais conservador, também é difícil prever se a sociedade estará disposta a continuar a apostar em nomes provenientes dos partidos - após três décadas de Soares, Sampaio e Cavaco - ou se, pelo contrário, estará mais aberta a figuras que, mesmo posicionando-se à esquerda ou à direita, não estão tão ligadas ao PS e ao PSD.

Num cenário desses poderiam avançar candidatos com o perfil do sindicalista Carvalho da Silva - que é militante comunista, mas mantém boas relações com bloquistas e soaristas - ou do sociólogo António Barreto - que foi ministro da Agricultura de Soares, deputado eleito pela AD e pelo PS e é agora um nome acarinhado por sectores conservadores -, em detrimento de um António Vitorino ou de um Ferro Rodrigues, de um Santana Lopes ou de um Rui Rio - ou, porque é estranho apenas Maria de Lurdes Pintasilgo ter sido candidata presidencial até agora, de uma Elisa Ferreira ou de uma Leonor Beleza.

Se a bipolarização não estiver tão bem definida como em 1996, quando só avançaram Sampaio e Cavaco, nada garante que a direita não surja, pela primeira vez desde 1980 (e, mesmo nessas presidenciais, quem podia retirar votos a Soares Carneiro eram Galvão de Melo e Pires Veloso), dividida por mais de uma candidatura. No entanto, se a tradição se mantiver, o mais natural é que a pluralidade de nomes continue a ser protagonizada à esquerda.

E, a menos que a situação esteja ideologicamente muito crispada, como ficou provado nas duas últimas eleições, haverá cada vez mais espaço para os candidatos sem apoios partidários. Se Fernando Nobre não se recandidatar, deverá surgir um outro vulto com um percurso idêntico e apoios semelhantes, proveniente das ONG, do mundo universitário ou da vida empresarial. Da mesma forma, parece haver espaço para os nomes anti-sistema. O resultado de José Manuel Coelho poderá incentivar um movimento de apoio mais consistente a Manuel João Vieira, mesmo se o vocalista dos Ena Pá 2000 e dos Irmãos Catita, por essa altura, tiver já 53 anos.

Convém ainda tentar perceber o tecido social de 2016, pois assim como é estranho não surgirem candidaturas de mulheres, também é bizarro que não apareça um negro português ou um descendente de asiático a assumir protagonismo na política e a entrar na disputa pelo palácio cor de rosa - ou, numa rejeição de um país que hoje é, de facto, plurirracial, uma candidatura racista e xenófoba.

Afinal, como escreve Adriano Moreira em Ciência Política (ed. Almedina), "o fenómeno do Poder [do PR] implica pouco com a leitura de preceitos legais, e tudo com a definição das expectativas que a sociedade civil tem em relação à função do Presidente e dos partidos e da acção que respectivamente desenvolvem a sociedade civil, o Presidente e os partidos, originados em concepções porventura em conflito". Assim, o mais provável é nenhum dos nomes aqui registados vir a figurar nos boletins de voto do futuro.

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