Prever aquilo que o comité de seleção do maior festival de cinema vai escolher não é um exercício de palpite solto nem uma ciência de escala. Manda a regra olhar para o calendário, para aquilo que o coração cinéfilo anseia e, neste ano, para todos os filmes que hibernaram do ano passado até aqui à espera da chamada..Trata-se de um ano que pode dar a Cannes a sua mais forte seleção dos últimos tempos, com consagrados prontos a serem julgados por Spike Lee e os seus jurados. Consagrados como Leos Carax, Nanni Moretti, Terrence Malick ou Wes Anderson mas também autores de prestígio como Ildikó Enyedi, Ruben Ostlund ou Tom McCarthy. Poderão ser estes os filmes fundamentais para voltarmos a falar de cinema a sério nas salas...Talvez por isso, a cartada tem um peso decisivo para ajudar a sobrevivência do cinema de autor pós-confinamento..de Wes Anderson, com Benicio del Toro.Sabe-se que estaria com toda a certeza na seleção do ano passado mas também se sabe que a Disney terá esperado um ano para voltar a colocar este novo bibelot de Wes Anderson na competição do festival. The French Dispatch tem tudo que ver com a cultura francesa, sobretudo por se passar na redação de um boletim jornalístico numa cidade francesa inventada. Pelas primeiras imagens divulgadas há um certo otimismo em podermos pensar em obra-prima da comédia burlesca..Trata-se de uma ode ao labor do jornalismo e tem atores como Bill Murray, Tilda Swinton, Timothée Chalamet, Frances McDormand e os franceses Léa Seydoux e Matthieu Amalric..de Claire Denis, com Juliette Binoche.Os rumores cannoises produzem efeitos de ânsia cinéfila. Ainda em fase de montagem mas já indicado para a passadeira vermelha de julho está Feu!, o novo filme de Claire Denis filmado de emergência e em estado de emergência mal a realizadora francesa viu o seu projeto anterior cancelado graças aos atrasos nas filmagens de The Batman, onde a sua estrela, Robert Pattinson, interpretava o Homem-Morcego. Sem Pattinson, mas com Juliette Binoche e Vincent Lindon, Feu! é um conto de reencontros passado nos bastidores do jornalismo radiofónico. Promete mundos e fundos....de Paul Schrader, com Willem Dafoe.A pandemia quase foi fatal para o novo filme de Paul Schrader. O cineasta estava a montar este conto de crime e redenção quando percebeu que precisava de incluir mais algumas cenas, o problema era filmar durante o recolhimento... Só graças à ajuda de Martin Scorsese, amigo e produtor, é que foi possível terminar este thriller ambientado em casinos de póquer. Para muitos, pode estar aqui o grande filme do ano, sucessor aguardado de No Coração da Escuridão. E espera-se também a glória para o seu protagonista, Oscar Isaac..de Paul Verhoeven, com Virginie Efira.Um dos habitués da Croisette poderá marcar de novo presença: o holandês Paul Verhoeven, desta feita com Benedetta, outro dos títulos que estariam pensados para a edição do ano passado do festival..Baseado no livro de Judith C. Brown, sabe-se que o filme é uma visão erótica de uma freira italiana do século XVII assaltada por visões eróticas e religiosas. A estrela de A Fabulosa Caprice dá corpo a esta mulher confinada..Poderá estar aqui um dos perfumes de escândalo de uma seleção que deverá continuar a fazer reverência aos consagrados..de e com Nanni Moretti.Se se confirmar o regresso de Moretti a Cannes, este Tre Piani fica logo à partida carimbado como um dos favoritos à Palma de Ouro. Moretti a adaptar o romance israelita de Eshkol Nevo no qual se narra um grupo de pessoas distintas confinadas no mesmo prédio. Um filme coral para abordar a miséria humana ou o estado da sociedade italiana..Sabe-se ainda que, além de Moretti, o filme inclui a fina-flor do acting italiano, de Riccardo Scarmacio a Alba Rohrwacher..de M. Night Shyamalan, com Gael Garcia Bernal.O mestre do novo horror não tem tradição de festivais mas este seu novo Old tem tudo o que um festival pode pedir para uma sessão não competitiva. Um thriller feito durante a pandemia sobre as angústias da passagem de tempo. Tudo se passa numa praia onde uma série de pessoas começam a envelhecer subitamente. Pode ser uma carta com um trunfo muito largo, mas Old tem a seu favor a sua data de estreia global, logo a seguir ao timing do festival. Se Cannes quiser um flirt com um estúdio de Hollywood, o prestígio de uma aposta numa obra de Shyamalan parece tiro certeiro. Annette, de Leos Carax, com Marion Cotillard.Tem tudo para estar em Cannes. Duas estrelas que o festival bem conhece: Adam Driver e Marion Cotillard e um dos realizadores franceses de maior culto, Leos Carax, cujo o anterior Holy Motors, de 2012, tinha encantado o festival..Agora, Carax ataca o musical, neste caso através das canções da dupla Sparks, para uma história de um casal composto entre um comediante e uma cantora de ópera cuja criança demonstra um dom fora do vulgar. Será eventualmente um dos filmes mais mediáticos deste cartaz..de Terrence Malick, com Matthias Schoenaerts.O problema com Malick é nunca se saber quando o mítico realizador dá por confirmado o último corte dos seus filmes. É bem provável que este seu último filme ainda possa estar na mesa de montagem, embora muito boa gente esteja já a vaticinar a seleção oficial em Cannes. Mesmo numa altura em que o cineasta de A Árvore da Vida divide cada vez mais os críticos, não existe nenhum grande festival que não o queira na seleção, ainda para mais com este tema: a vida de Jesus segundo vários episódios... Filmado na Itália, reúne um elenco eminentemente europeu, em que se destacam Ben Kingsley, Douglas Booth e o húngaro Géza Gohrig, como Cristo..dnot@dn.pt