"Os enfermeiros vão ser dos mais beneficiados na remuneração com o descongelamento das carreiras"

PM garante OE2018 fiscalmente mais justo e sublinha que o principal compromisso do governo é com as metas do défice e da dívida
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Regressando ao Orçamento, já nos disse que não está previsto que haja nenhum aumento no IRS, nas taxas dos escalões mais altos, admite outro tipo de impostos sobre o património para taxar as grandes fortunas, como pedem o Bloco e o PC?

Em 2016 e 2017 a carga fiscal baixou...

...mas houve o aumento de alguns impostos indiretos.

O conjunto de impostos que os portugueses pagam é hoje inferior ao que pagavam anteriormente. Isso significa que todos estamos a pagar menos. Em segundo lugar, houve também uma redistribuição dessa carga fiscal, que hoje incide menos sobre os rendimentos do trabalho; não teve o mesmo desagravamento nos rendimentos sobre o capital e teve uma redistribuição em matéria de impostos sobre o consumo.

É um aumento em muitos casos.

Houve um aumento, se quiser, claro que houve um aumento de alguns impostos indiretos. Tivemos o cuidado de que o imposto indireto que todos pagam, o IVA - e que tinha sido brutalmente agravado pelo anterior governo, não através das taxas, mas através das transferências de um conjunto de bens e serviços de uma taxa intermédia para a taxa máxima -, fosse reduzido relativamente à restauração.

Está satisfeito com os resultados?

Os resultados provam o sucesso desta medida, não só salvámos milhares de empresas, como a restauração criou milhares de postos de trabalho ao longo do último ano. O estudo que foi feito demonstra isso.

Não terá sido mais pelo aumento de turistas do que pela redução da taxa?

Não. A melhor demonstração de que não é assim é que essa melhoria tem acontecido não só nas zonas onde o turismo tem crescido, mas também nas zonas onde o turismo não tem crescido. Os impostos indiretos são os impostos que cada um paga - enquanto os impostos sobre os rendimentos do trabalho tributam todos aqueles que trabalham - em função do que consome, e temo-lo feito sobretudo nos impostos especiais que são aqueles que permitem uma melhor gestão pelo próprio da decisão de comprar ou não comprar; é o caso do tabaco, é o caso dos impostos sobre os produtos que têm um maior grau de gordura, de salinidade, de açúcar e, portanto é também uma forma de induzir também por essa via a promoção da qualidade alimentar e de um país mais saudável.

Vê o Governo a avançar este ano para a alteração de outros impostos, já falámos do IRS, podemos esperar alterações no Imposto Automóvel, no IRC?

Podemos repetir a pergunta imposto a imposto, mas como lhe digo não haverá um aumento global da carga fiscal, haverá maior justiça fiscal, a composição concreta só poderemos dizer no final, porque só depois de todas as negociações devidamente concluídas teremos um matching otimizado dos diferentes impostos.

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O PS chegou a ter também com o anterior governo um acordo assinado para a redução do IRC. António Saraiva disse há dias que era necessária uma redução da taxação dos lucros das empresas. Há margem para esse estímulo à economia?

Como sabe esse acordo foi rompido pelo anterior governo e já teve tradução no voto contra do Partido Socialista aquando a última redução do IRC ainda na anterior legislatura e não temos previsto prosseguir essa trajetória. O incentivo ao investimento das empresas tem vindo a manifestar-se por outras vias que nos parecem essenciais: na aceleração da execução dos fundos comunitários, na criação do programa Capitalizar que vai permitir reforçar os capitais próprios das empresas, diminuir a sua necessidade de recurso ao sistema bancário, na gestão que temos feito que tem permitido uma redução da taxa de juro do financiamento às empresas; iremos agora poder iniciar, com o fim deste ciclo dos CMECs da eletricidade, um programa contratualizado de redução dos custos da energia para as empresas; e toda a política económica que tem conduzido ao crescimento tem dado confiança e aquilo que nós verificamos é que o investimento privado em Portugal ultrapassou recordes dos últimos 18 anos.

Portanto, creio que a economia não está a necessitar desse estímulo e essa não é de facto uma prioridade da nossa política fiscal. O programa Capitalizar, o programa da Startup Portugal, o programa de financiamento de novas empresas, aí sim, aí há um conjunto fiscal muito forte para reforçar as empresas com targets bem definidos e que não passa pela redução geral da taxa de IRC.

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Os parceiros que suportam o seu governo no Parlamento em conjunto com os sindicatos pedem quase uma quadratura do círculo em matéria de função pública e de aumentos para a função pública, defendendo ao mesmo tempo aumentos salariais e também o descongelamento das carreiras. Há margem para tudo isso?

A margem está identificada e estamos a negociar cumprir aquilo que consta do programa do Governo, no calendário definido nesse programa e sem derrapagens na nossa margem orçamental. A primeira prioridade que tivemos, e foi cumprida, foi repor os vencimentos a que as pessoas tinham direito e que lhes tinham sido cortados. Fizemo-lo progressivamente ao longo do ano de 2016, e 2017 foi o primeiro ano em que todos os funcionários públicos receberam 14 meses de ordenado por inteiro. Tínhamos depois previsto que concluída esta fase, 2018 seria o ano do descongelamento das carreiras e vai ser o ano em que vamos arrancar com o descongelamento das carreiras.

Arrancar... não são todas as carreiras portanto?

Não, nós temos aliás definido quais são as prioridades. Como sabe há carreiras que não sofreram congelamentos ou que tiveram congelamentos limitados. Vamos começar por onde é justo, que são aqueles que tiveram congelamento total das carreiras e há mais tempo e isso vai ter um impacto muito significativo porque vai permitir, nuns casos que tenha efeitos imediatos, noutros casos que tenha de ter também efeitos faseados. Por exemplo, no caso dos enfermeiros, que têm estado esta semana nesta luta, vão ser das carreiras que mais vão beneficiar em termos remuneratórios do descongelamento das carreiras, porque o seu sistema de pontuação necessária para a progressão é majorado relativamente ao conjunto da administração pública e, portanto, neste momento, já há um conjunto de enfermeiros com uma pontuação acumulada que lhes vai permitir progredir mais do que outras carreiras da função pública onde o sistema de pontuação é diferente. Nos enfermeiros é de 1,5 por cada ano enquanto nas carreiras comuns é de um ponto por cada ano, o que significa que a progressão vai ser mais rápida, os pontos acumulados são maiores e portanto a reposição é maior.

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Mas eles mesmo sabendo isso não chegaram a acordo na conversa que tiveram com o ministro da Saúde e continuam em greve, sente que vai ser preciso ir mais longe na cedência em relação aos enfermeiros?

A greve é algo normal na vida democrática, como são as eleições, como é a imprensa livre, como é a liberdade de expressão, a greve é um direito normal. Acho aliás curioso que a direita que andou um ano a queixar-se e a protestar por os sindicatos não fazerem greves, agora condena o Governo por haver greves. Mas isso faz parte da vida democrática, é legítimo que as pessoas tenham aspirações para a sua vida, que queiram mais e melhor; é sobretudo normal quando depois de tantos anos de tantos sacrifícios há uma certa panela de pressão que se foi acumulando e que temos de ir sabendo libertar. Há aquela velha canção do Sérgio Godinho em que ele diz que a sede de uma espera só se estanca na torrente e houve de facto uma grande sede acumulada e, portanto, há aqui uma grande torrente. O Governo, o que deve saber fazer é ter sempre uma atitude positiva, construtiva, dialogante, mas ser firme naquilo em que tem de ser firme que é na execução do seu programa de governo.

Na saúde quais são as prioridades que nós temos definidas? Prioridade número um: aumentar e melhorar os cuidados de saúde primária com um programa de 25 novas unidades de saúde familiar tipo B por ano e chegar ao final da legislatura com todos os portugueses com acesso ao médico de família. Segunda prioridade: generalizar os cuidados continuados, 680 novas camas no primeiro ano, 700 novas camas este ano e assim progressivamente até ao final da legislatura. Arrancar com os investimentos há muito adiados em três hospitais fundamentais, o Hospital Oriental de Lisboa, o Hospital do Seixal, o Hospital Central do Alentejo. Concluir os estudos com o Governo Regional da Madeira sobre o Hospital do Funchal. No final da legislatura abrir os estudos de avaliação sobre o Hospital Central do Algarve e o reforço dos recursos humanos do Serviço Nacional de Saúde que foram muito depauperados ao longo destes anos. Desde o início da legislatura, nós já temos mais 4000 profissionais no SNS do que tínhamos então, entre médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico, etc., é este o balanço.

Estas são as prioridades e é no contexto de todas estas prioridades que temos de ver qual é a margem para podermos acompanhar outro tipo de reivindicações. Para além daquelas melhorias que já resultam naturalmente, quer da reposição dos rendimentos, quer do descongelamento das carreiras, sendo certo uma coisa: nós iremos tão longe quanto possível, mas há um limite que não passamos, não podemos passar e que os portugueses nunca nos perdoariam se passássemos, que é o limite a partir do qual a trajetória de redução do défice e de redução da dívida ficasse comprometida.

Quando saímos do procedimento por défice excessivo, eu recordei que era a segunda vez que acontecia e que tinha de ser a última vez, porque nós não podemos voltar a entrar alguma vez num procedimento por défice excessivo e a maior derrota histórica que esta solução governativa teria, seria a direita demonstrar que era impossível combinar a viragem da página da austeridade com uma boa gestão das finanças públicas. O sucesso desta solução governativa passa por demonstrar as duas coisas: que vivemos melhor sem austeridade e que sem austeridade podemos continuar a ter uma trajetória de consolidação das finanças públicas e, em particular, da redução da dívida.

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Mas não tem os seus parceiros a lembra-lhe que entre o 1,5 que está previsto para este ano e ultrapassar o limite do défice há uma margem grande?

Nós temos uma trajetória acordada quanto à redução do défice com a União Europeia. Como é sabido, entre o PS e os parceiros parlamentares não existe a mesma visão sobre a União Europeia. O PCP diz que o PS assume uma restrição que é dele e que eles não partilham, mas de facto é a nossa, é a que consta do programa do Governo, e os acordos que assinámos com o PEV, com o Bloco de Esquerda e com o PCP não puseram em causa esse outro compromisso e têm esse pressuposto. Todos nós sabemos quais são as regras do jogo e tal como temos conseguido fazer, iremos certamente continuar a fazer, que dá mais trabalho, isso claro que dá (risos), agora, nós não temos de nos queixar do trabalho, temos é que nos empenhar construtivamente, como todos temos feito, para conseguir alcançar estes resultados.

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Esse descongelamento faseado das carreiras de que falava permitirá em 2018 chegar ao final do ano, como fez com a reposição dos salários na função pública ou o fim da sobretaxa de IRS, e ter as carreiras todas descongeladas ou também isso é uma ambição excessiva em termos financeiros?

Manda o bom senso que estando em curso as negociações com os sindicatos essas negociações decorram no local próprio, que é a mesa de negociações e não através da comunicação social.

O bom senso leva a que os jornalistas façam perguntas quando têm o primeiro-ministro à frente...

... Sim, e isso aliás é o que distingue o entrevistador do entrevistado. O entrevistador pergunta tudo, o entrevistado só responde aquilo que deve.

Se estivéssemos a falar de um descongelamento transversal de todas as carreiras, não há margem para tal?

É conhecida a margem que temos, mas as negociações têm estado a correr bem e com bom espírito e com a compreensão de todos para alcançar os resultados pretendidos. Não me recordo até agora de nada que tenha ficado por fazer por não termos conseguido encontrar ou uma forma compensatória ou um mecanismo de faseamento que permitisse acomodar aquilo que é necessário fazer.

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A CGTP pede aumentos de 4% com um mínimo de 40 euros por mês para cada trabalhador. Vamos ter aumentos, vão ficar acima da taxa de inflação?

Isso é um exercício que decorre na concertação social, entre os parceiros sociais e nesta fase não compete ao Governo estar a intrometer-se. Aquilo que o Governo fez, e que devia fazer, era desbloquear os processos de contratação coletiva. Depois de termos chegado a uma fase em que havia uma parte ínfima de trabalhadores cobertos por contratação coletiva, hoje, felizmente, a contratação coletiva tem estado a ser desbloqueada e o diálogo social tem estado a correr bem e é isso que nós queremos que aconteça e que continue a acontecer.

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