Os dois colegas de faculdade que decidiram ser 'alfaiates'
Portugal é um país onde a mulher pode vestir quase tudo, mas onde o homem não pode arriscar. Um País onde as pessoas não são conservadoras, mas refugiam-se em roupas convencionais. Um País onde é difícil criar uma empresa e onde a universidade não dá importância ao empreendedorismo. Apesar de João Branco e Luís Sanchez, fundadores da marca Storytailors, apontarem todos estes defeitos, a verdade é que ambos preferiram focar-se nos aspectos positivos que o País tem para oferecer e deitar mãos à obra. Começaram por fazer o que ainda não tinha sido feito, uma marca com uma confecção irreverente e com filosofias de trabalho próprias. O nome inglês desta marca tão portuguesa não é uma contradição, mas sim uma porta aberta à expansão internacional.
"Ainda durante a faculdade, olhámos para cada um destes aspectos e tentámos simplificá-los. O facto de haver mais liberdade para a criação de moda feminina fez-nos decidir que o nosso início tinha de passar por essa vertente. Na altura, disseram-nos que os nossos objectivos eram elevados de mais, mas nós insistimos. Mais tarde sentimos também dificuldade em criar a empresa", explicou Luís Sanchez, venezuelano descendente de portugueses.
Desde o seu início, em 2003, num pequeno atelier em Sete Rios, que a empresa não pára de crescer. Hoje conta já com seis funcionários, e uma enorme loja na Calçada do Ferragial, perto do Chiado, local que sempre apreciaram. Com uma forma particular de confeccionar o vestuário, utilizando para isso moldes diferentes, uma linha de pronto-a-vestir e um atelier para roupa feita à medida e aconselhamento estético, a Storytailors é um projecto inovador que tem vindo a cativar muitos clientes... e amigos.
"A história mais curiosa que temos de todos estes anos foi a de um casal que nos viu num programa da RTP e decidiu ligar-nos para saber se poderíamos fazer o fato. Confesso que nos surpreendeu a hora do contacto, porque aconteceu assim que o programa acabou, cerca da meia-noite", lembrou João Branco, esclarecendo que foi dessa forma que nasceu o primeiro fato da empresa e uma grande amizade: "A partir desse momento criámos uma grande relação e eles até nos convidaram para ser padrinhos do primeiro filho deles."
Apesar de ter sido a situação que melhor recordam, esta não foi a única situação em que após o trabalho surge uma amizade. E esse é, talvez, um dos segredos para o rápido crescimento da Storytailors. "O feedback de quem nos visita tem sido muito positivo e achamos que é a isso que se deve o nosso sucesso", recorda João Branco.
Outro aspecto distintivo é o facto de toda a produção ser feita em Portugal. Sendo que, na maioria das vezes, são fábricas situadas no norte do País as responsáveis pela confecção. De resto, a única coisa que vem do exterior são algumas matérias-primas inexistentes cá: "Só importamos algumas matérias-primas que não encontramos em Portugal."
E, ainda que a grande aposta da Storytailors seja na moda feminina, para estes dois criadores, sempre atentos ao que se confecciona para homens, há uma explicação para a pouca ousadia masculina em Portugal. "Após a Segunda Guerra Mundial, os homens passaram a usar uma roupa uniformizada e actualmente sentem-se ameaçados pela vanguarda. Assim sendo, desde essa altura o glamour ficou reservado às mulheres e tudo aquilo que seja mais trabalhado ou tenha contornos um pouco diferentes é encarado pela sociedade portuguesa como algo feminino", concluiu João Branco, admitindo que "para um homem conseguir inovar na roupa precisa ter uma boa herança social e muita segurança pessoal".