Os Dias da Música no CCB para descobrir a música que há em Shakespeare

Os Dias da Música estão de volta e desta vez têm mais de 40 concertos "à volta" do dramaturgo britânico. De quinta a domingo no Centro Cultural de Belém.
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Todos os anos, os Dias da Música no Centro Cultural (CCB) incluem um Festival Jovem, onde as várias orquestras de jovens se apresentam separadamente, cada uma com o seu programa. Neste ano será diferente. O CCB lançou o desafio de juntar as três orquestras - a OJ.COM, que é a orquestra dos conservatórios, a APROARTE, das escolas profissionais, e a Ensemble, das escolas particulares - num único concerto. "Este é um concerto especial e que tem um significado muito importante porque mostra tudo o que de bom se tem feito no ensino da música", explica o diretor musical Cesário Costa. "Neste momento, está a fazer-se muita coisa boa, fruto de um investimento continuado e sustentado no ensino musical", diz.

São 70 os músicos selecionados das várias orquestras para tocar o Sonho de Uma Noite de Verão. O mais novo tem 14 anos mas a maioria tem 16 ou 17 anos, o que, "curiosamente", como sublinha o maestro, "é a idade com que Mendelssohn escreveu esta partitura". Trata-se, portanto, de música de Mendelssohn (1809-1847) inspirada na peça homónima de William Shakesperare (1564-1616). Será apresentada uma versão com narrador (Pedro Penim) e duas cantoras (Ana Maria Pinto e Patrícia Quinta). O texto e as canções são interpretados em português.

Também se decidiu que desta vez o Festival Jovem não iria ficar só em Lisboa. Então, o estágio da orquestra realizou-se em Vila Nova Gaia e o espetáculo estreou-se no Coliseu do Porto, no passado dia 18, tendo passado depois por Coimbra. Em cada cidade, junta-se um coro local. Em Lisboa, será o coro do Instituto Gregoriano. O primeiro ensaio que juntou o coro e a orquestra aconteceu ontem. Duas da tarde de uma quarta-feira de chuva em Lisboa. Filas de turistas com impermeáveis para entrar no Mosteiro dos Jerónimos. Filas de turistas já sem casaco para entrar no Museu Berardo. O palco do Grande Auditório do CCB também está lotado. Os músicos vão tomando o seu lugar e afinando os instrumentos, o coro instala-se ao fundo do palco. O maestro dá algumas instruções. O burburinho dá lugar ao silêncio e depois à música.

No total, o projeto juntou quase 400 pessoas. "Queria que, a nível pedagógico, esta fosse uma experiência enriquecedora para todos", diz Cesário Costa. O resultado, garante, é incrível: "Sente-se uma energia inacreditável no palco e acho que as pessoas têm saído felizes dos concertos." Para ver nesta quinta-feira, às 18.00, primeiro dia dos Dias da Música no CCB, que neste ano têm como tema Shakespeare. O Doce Poder da Música.

Shakespeare também fez música?

Ao longo de quatro dias serão apresentados mais de 40 concertos inspirados na obra do dramaturgo e poeta britânico William Shakespeare. Depois de, no ano passado, o festival ter voltado as suas atenções para um pintor, Hieronymus Bosch, já não é de todo surpreendente que desta vez se dedique a um escritor. Afinal, como escreve o programador André Cunha Leal na apresentação destes Dias da Música, Shakespeare não só escreveu sobre música como "fascinou e influenciou compositores de todas as épocas, dando origem a um vastíssimo repertório, da música de cena à ópera e ao ballet, do poema sinfónico à música para piano solo, da canção ao musical norte-americano".

Aconselha-se a consulta da programação completa, como é óbvio. Mas deixamos aqui duas sugestões, para que se perceba como há coisas muito diferentes para ver.

No sábado, às 15.00, no Pequeno Auditório, estreia-se Rei Lear, com música original de Alexandre Delgado e encenação de Sara Barros Leitão, a partir da tradução de Álvaro Cunha, fruto de uma encomenda do festival. Esta versão, segundo a encenadora, vai além dos motivos bélicos e da lógica patriarcal para se fixar nas relações de pais e filhos, de velhos e novos, na "solidão e na ambição sem coração". "Interessa-nos a lealdade ou o amor incondicional de um homem por outro", lê-se na apresentação da obra.

No foyer do Grande Auditório, Maria João propõe que encontremos Shakespeare na pop (sábado, 16.15) e no jazz (domingo, 16.15). Não será difícil, se pensarem um bocadinho. Desde I Am the Walrus, dos Beatles, a Romeo Is Bleeding, de Tom Waits, passando por temas de West Side Story, de Leonard Bernstein, há muitas referências a Shakespeare na música do século XX.

No colinho da rainha

Toc, toc, toc. Batem à porta. A rainha manda entrar. E nós entramos. A rainha é a cantora Teresa Duarte, que usa um vestido maravilhoso que se estende pelo chão e se transforma no tapete onde as crianças vão sentar-se a ver o espetáculo. É por isso que para entrar na Sala Glicínia Quartim e nos sentarmos n'O Colinho da Rainha é preciso tirar os sapatos. O vestido é uma obra de arte só por si: criado, estampado e costurado por Alice Albergaria Borges, que alguns conhecerão como atriz do filme Colo, de Teresa Villaverde, mas que aqui é responsável pelos figurinos e pela cenografia do espetáculo.

Além do vestido, Alice fez também as almofadas (com padrões estampados, uma a uma), as estrelas douradas que estão coladas nas paredes e os espanta-espíritos pendurados do teto. Tudo feito à mão por Alice, sentada no chão, num canto da sala, a recortar pratas de chocolate enquanto os músicos e os cantores marcam as entradas e saídas de cena. A ideia é criar um espaço de intimidade onde as crianças se sintam bem e possam desfrutar da música ao mesmo tempo que são apresentadas à rainha Isabel I, também conhecida como A Rainha Virgem, a monarca do tempo de Shakespeare. "Estamos todos no colinho da rainha, vão entrando músicos e vão acontecendo coisas", conta Joana Bagulho, que criou este espetáculo. Toc, toc, toc. Há mais pessoas a bater à porta. Trazem músicas de John Dowland e de William Byrd e prendas para a rainha.

Além d'O Colinho da Rainha (para bebés), a cravista e professora Joana Bagulho criou um outro espetáculo para a programação da Fábrica das Artes nestes Dias da Música: E Comparar-te a Um Dia de Verão - Música no Tempo de Shakespeare (para crianças), que junta a música de Thomas Morley, John Dowland, William Byrd, John Wilbye e Anthony Holborne, com excertos de textos de Shakespeare sobre a música e sobre a arte. Ambos os projetos contam com a colaboração dos alunos da Escola Superior de Música e da turma de alaúde do Conservatório Nacional e ainda da Douda Correria Associação Cultural.

Dias da Música
Centro Cultural de Belém, Lisboa
dias 25, 26, 27 e 28 (de quinta a domingo)
Bilhetes a partir de 4 euros (para o recinto)

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