Os 7 melhores policiais para ler nas férias
A cada quatro minutos vende-se um livro do género policial nas livrarias portuguesas. Um número calculado por baixo, tendo em conta os principais sucessos deste último ano, já que a maioria das editoras recusa divulgar as vendas. Aquilo que não negam é estarem todas na corrida para contratar êxitos como o A Rapariga no Comboio, de Paula Hawkins, que já ultrapassou a fasquia do cem mil exemplares em Portugal. Ou de andarem todas à procura de autores nórdicos, os que estão mais na moda, para apresentar no catálogo.
No primeiro caso, a Planeta obteve os direitos de A Viúva, de Fiona Barton, e já fez três edições em pouco mais de um mês. No segundo caso, a D. Quixote "descobriu" um norueguês que é o suprassumo do policial, Jorn Lier Horst, e escolheu o sétimo dos seus livros já publicados para o apresentar aos leitores portugueses. E a Topseller, especialista em best-sellers do género, acaba de lançar As Raparigas Esquecidas, que contém a palavra mágica - Rapariga -, essencial num título desde que o Gone Girl (Em Parte Incerta), de Gillian Flynn, mostrou o caminho para o thriller psicológico bem sucedido.
Se até há pouco tempo não se podia ler este género sem incluir os autores norte-americanos especializados no policial, desde que Stieg Larsson se impôs com a saga Millenium o policial europeu foi descoberto. Afinal, já havia mestres no continente: Henning Mankell, por exemplo. Nessa leva de autores nórdicos que invadiram os restantes países europeus destaca-se Camilla Läckberg, que é dos autores estrangeiros mais vendidos em Portugal, logo seguida por Jo Nesbo.
Ao mesmo tempo, deu-se uma recuperação do género com a reimpressão dos clássicos da literatura policial europeia - Agatha Christie, John Le Carré, Simenon, alguns entre muitos nomes -, fazendo com que a importância de autores norte-americanos decaísse. Este género ganhou tanta importância no mercado português nos últimos tempos que nenhuma editora nacional escapa a ter o seu escritor de thillers, dando-se até a ressurreição da mais emblemática coleção de suspense que é a Vampiro. Onde, os grandes clássicos estão a ser reeditados à cadência de um por mês, com nomes como Dashiell Hammett, Raymond Chandler, Ellery Queen ou S.S. Van Dine.
É, no entanto, ao nível da criatividade europeia que vale a pena descobrir os novos talentos que estão a ser traduzidos para português. Como é o caso da maioria dos livros que a seguir se comentam. Que têm origem em todas as partes da Europa e já não apenas dos países do Norte. Sendo que alguns podem já ser considerados como quase clássicos devido à muito boa utilização do género.
De Espanha o mais inovador
O policial mais sedutor publicado recentemente intitula-se O Guardião Invisível e faz parte da Trilogia Baztán, nome de um rio junto ao qual aparece o cadáver de uma adolescente. A descoberta macabra faz entrar em cena a inspetora Amaia Salazar, que tem a particularidade de ter nascido na região e de há muito ter decidido afastar-se das suas memórias, indo viver para outra localidade. O mais interessante nesta leitura é que a autora, Dolores Redondo, reinventa o policial a que o leitor está habituado desde que a produção nórdica dominou este mercado pois introduz um novo espaço mental, o da convivência com as tradições esotéricas do País Basco.
O seu registo não escapa ao habitual ao nível da descrição que coloca o leitor a par da situação, mas a partir daí inova como poucos escritores conseguem num tempo tão saturado de livros policiais.
A sinopse de O Guardião Invisível pode ser esta: Amaia está perante uma corrida contra o tempo para encontrar o brutal assassino que invoca os antigos seres lendários da região de Navarra. Ao descobrir-se uma segunda vítima, vê que os crimes não seguem o esquema habitual, pois ao lado dos corpos das meninas encontram-se rastos que não são humanos e a posição em que estão faz pensar numa cerimónia de purificação.
Para quem gostar deste primeiro volume de Dolores Redondo, ao terminar a leitura não fica entregue ao vazio, pois a editora já imprimiu o segundo tomo da trilogia. É só continuar a descobrir esta alta intriga com uma boa matriz basca.
Grande surpresa da Noruega
A fotografia da capa do primeiro livro do autor norueguês Jorn Lier Horst publicado em Portugal é fundamental para se perceber o cenário de partida de uma perfeita intriga policial que também consegue fazer alguma diferença em relação que é escrito nos países do Norte da Europa. Mostra uma pequena casa de férias junto ao litoral da costa da Noruega, rodeada pela neblina. A imagem real reflete-se na água com muito mais nitidez do que o objeto da fotografia, como uma metáfora daquilo que está escondido além de uma série de assaltos semelhantes a residências, e que não será encontrado sem ultrapassar trezentas das 341 páginas deste volume.
O livro tem uma introdução à edição portuguesa muito providencial, pois faz o histórico do protagonista, o inspetor-chefe William Wisting. Assim fica o leitor informado do passado desta série escrita por Jorn Lier Horst, o que é oportuno pois este é o sétimo romance que já escreveu. Curiosamente, tal como o protagonista, o autor reside na cidade de Larvik, onde um foi inspetor-chefe de profissão e outro o é no livro. Portanto, o autor é perfeitamente conhecedor da realidade policial e o que perpassa neste livro não é apenas fruto da imaginação de um escritor dedicado ao género. Este Fechada para o Inverno foi premiado aquando do seu lançamento (2011), um entre os vários que Horst tem recebido desde que em 2004 se iniciou com Testemunha-Chave.
O inspetor Wisting surge como um polícia desgastado por três décadas a perseguir criminosos e a recuperar de um esgotamento nervoso. Algo inesperado para um herói como se deseja olhar o protagonista, mas isso torna-se um fator importante no desenvolvimento da ação. Que começa com uma descrição perfeita da paisagem do lugar do crime e nunca mais para no entrelaçar de situações que tornam este autor uma sugestão bem interessante para ler nas férias.
Da Suécia após vender 18 milhões
O nome Camilla Läckberg não passa despercebido aos leitores portugueses desde que a descobriram no romance A Princesa de Gelo. Esse seu primeiro livro data de 2003 - só foi traduzido em 2010 -, e surgiu de uma experiência de escrita criativa em que Läckberg se meteu. Gostou e não mais parou, tornando-se numa das mais populares escritoras suecas com as obras que se seguiram, sempre a recriar um universo localizado na povoação de Fjällbacka, onde hoje até se pode fazer um percurso identificador de vários locais onde a ação dos seus livros nunca se deixou de manter.
Tal como a maioria dos seus romances, também este é espesso e com muitas reviravoltas. Inicia-se em janeiro, com Fjällbacka coberta de neve. Uma jovem sai do meio do mato e é atropelada por um automóvel. Aí entra em ação um dos principais protagonistas de Läckberg, Patrik Hedström, que descobre que a adolescente estava dada como desaparecida há quatro meses. Quando a outra protagonista surge na intriga, Erica Falk, já se conhecem as violentas humilhações a que a jovem tinha sido submetida.
Tal como o título faz depreender, há um circo que se intromete no romance e que, como em grande parte dos livros desta escritora sueca, nem tudo se explicará com a voz do presente, antes com uma grande investigação que se desenrola apoiada em factos acontecidos num passado distante.
O Domador de Leões possui a receita habitual de Läckberg, permitindo ao leitor muito fiel - é das escritoras com mais sucesso no nosso país - reencontrar-se com a dupla de protagonistas que vem desde há mais de uma década a ser apurada pela criatividade da autora.
O crime sob a versão da Dinamarca
A Publishers Weekly disse sobre As Raparigas Esquecidas isto: "Arrepiante! Um enredo fabuloso, pleno de personagens realistas!" Da primeira parte não há dúvida, é mesmo arrepiante no seu início, com descrições sobre uma marca no rosto de uma mulher encontrada morta que deixa o leitor mais sensível com vontade de vomitar. Ou seja, dá razão à segunda parte da frase da publicação.
A escritora Sara Blaedel é considerada a "rainha dinamarquesa do thriller" mas é desconhecida dos leitores portugueses. Não que lhe falte obra porque desde 2004 que começou a publicar, só não tinha sido ainda pescada nesta busca incessante por autores nórdicos do policial. Foi votada Autora Mais Popular por quatro vezes no seu país, já recebeu vários prémios respeitantes ao género onde se destaca e está traduzida em mais de 30 países. A intriga não foge ao do registo nórdico, mas a protagonista Louise Rick tem algumas particularidades que a tornam interessante. Mesmo que o leitor fique por momentos a suspeitar da direção para onde se orienta a narrativa logo nas páginas iniciais.
A sucessora dos clássicos britânicos
Sophie Hannah tem um grande prestígio em Inglaterra, onde foi escolhida pelos herdeiros de Agatha Christie para fazer a continuação das histórias do famoso detetive Hercule Poirot, intitulado Os Crimes do Monograma - Um Mistério de Poirot. A Portugal chega agora o seu terceiro livro, após Um Erro Fatal, chamado A Vida dos Outros, uma história que deixa o leitor sempre em dúvida sobre o que se passa realmente na narrativa. Hannah tem um estilo em que usa muito dos utensílios da contemporaneidade ao nível do cenário mas num registo um pouco à moda do policial americano - que se estranha -, esticando a corda até ao máximo possível no enredo. O tema deste policial é convidativo, lembra um pouco alguma temática hitchcockiana, mesmo que fique tudo exposto no primeiro capítulo. Em seguida, baralha o leitor até este desconfiar de tudo o que pensava, em volte-faces constantes através de personagens bem estruturados.
A Escócia como parte do problema
O escocês Peter May começa A Ilha de Entrada com um bom truque: um interrogatório a alguém que nega ser quem é. Só que o detetive já se cruzou com a suspeita, acusada do assassinato do marido e fica a remoer a sua dúvida.
É um policial que não partilha do registo que neste terceiro milénio caracteriza este género literário na sua mais vulgar apresentação, sendo mais um thriller à americana que utiliza cenários bucólicos, da Escócia e do Canadá. Dever-se-á ao seu passado como guionista para mais de mil episódios de séries de TV inglesas, utilizando frequentemente recursos linguísticos a que o leitor não está habituado no policial mais duro. No entanto, Peter May mantém uma ação vigorosa e recupera a trama do crime passional, em que a mulher, ou o marido, é a principal suspeita - um dos motivos mais batidos no policial clássico -, e a utilização da também clássica situação de um protagonista obcecado na intenção de fazer provas da verdade em que crê. Rápido e ágil na leitura, para descansar da morbidez nórdica.
Investigação à portuguesa
A tradição do policial escrito por autores portugueses não é muita e, tirando alguns pseudónimos que tiveram bastante sucesso - até na Coleção Vampiro e similares -, poucos livros existem que mereçam a classificação de policial. Recentemente, a moda do thriller psicológico levou autores nacionais a experimentarem o filão. No meio dos lançamentos mais recentes surgiu um romance de João Felgar, Síndrome de Antuérpia, que não sendo um policial típico se pode ler sob esse ângulo. Bem escrito, apropriando-se de muita terminologia do vocabulário da língua portuguesa que é pouco habitual ler nos romances atuais, o autor conta duas histórias: a de uma mulher que já fora homem e a da prisão do alegado suspeito da morte desta outra personagem.
A narrativa alterna passado e presente e vai fazendo a reconstituição do que aconteceu até ao crime e das investigações posteriores. João Felgar consegue surpreender com o final.
É interessante ler a recuperação da vida do interior e de muita da mentalidade que constrói essas pessoas, notando-se o conhecimento profundo de situações locais. Há vários momentos épicos no desenrolar do livro, como é o caso da identificação do sexo da morta. Ou do momento em que engana o leitor sobre o criminoso.