O quinto homem mais rico do mundo, um antigo ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, um professor catedrático e empresários. A lista de testemunhas apresentadas por Henrique Granadeiro para serem ouvidas na fase de instrução do Processo Marquês envolve nomes de peso que vão tentar demonstrar que o antigo CEO e presidente do conselho de administração da Portugal Telecom não deve ir a julgamento..Os 15 nomes propostos pela defesa de Granadeiro - responde por crimes de corrupção passiva, branqueamento de capitais, peculato, abuso de confiança e fraude fiscal qualificada - começam a ser ouvidos hoje por Ivo Rosa, o magistrado que lidera esta fase do processo que tem no antigo primeiro-ministro José Sócrates o arguido mais mediático de uma acusação que envolve 28 arguidos (19 pessoas e nove empresas) e um total de 188 crimes..Henrique Granadeiro, que não deverá prestar declarações nesta fase do processo, é acusado de ter recebido 24 milhões de euros - destes, 20 milhões para si - alegadamente pagos por Ricardo Salgado (o ex-presidente do Banco Espírito Santo também arguido) para beneficiar o Grupo Espírito Santo em vários negócios quando liderava a Portugal Telecom. Entre essas decisões estará a forma como a administração da PT respondeu à oferta pública de aquisição que o Grupo Sonae apresentou em 2006 - chumbada em 2007 -, o negócio da venda da empresa brasileira de telecomunicações Vivo e a entrada no capital da também brasileira Oi..Além dessas suspeitas é ainda acusado de ter canalizado as verbas alegadamente pagas por Ricardo Salgado para contas de uma empresa que tinha em seu nome na Suíça - a Enterprises - e depois desta para outras contas no Banque Pictet (também suíço) evitando o pagamento de impostos em Portugal. Aliás, num depoimento que efetuou a 18 de janeiro de 2017 ao ser questionado sobre as movimentações bancárias nas contas em nome de Granadeiro, Ricardo Salgado disse - de forma genérica, defendem os advogados do antigo administrador da PT - que os pagamentos efetuados em 2007, 2010, 2011 e 2012, para as contas abertas junto do Banque Pictet, se tratavam de pagamentos a Granadeiro. Terá dito aos procuradores do MP: "Em relação ao Pictet, tem que ver com o Granadeiro.".No pedido de abertura de instrução a defesa do empresário frisa que, apesar desta frase, Ricardo Salgado "nunca concretizou os justificativos de cada transação em concreto nem precisou de forma concreta se cada uma das transações em causa se destinava ao requerente [Granadeiro]"..Dos nomes apresentados como testemunhas, além de António Mendonça (antigo ministro do governo de José Sócrates), destacam-se três que poderão prestar depoimento no dia 29 - e sem ser presencialmente: o mexicano Carlos Slim Helú (considerado em 2018 o quinto homem mais rico do mundo), Ricardo Knoepfelmacher (antigo administrador da Brasil Telecom) e Hélio Calixto Costa (deixou a Oi em março de 2018). As inquirições estão marcadas de hoje até dia 29, com três depoimentos por dia, alguns sem ser presencialmente..De que está acusado?.Henrique Granadeiro está acusado de oito crimes: um de corrupção passiva relativamente a negócios entre o Grupo Portugal Telecom e o Grupo Espírito Santo; dois de branqueamento de capitais em coautoria com Ricardo Salgado; um de peculato relativamente a pagamentos efetuados pela PT à empresa Lima Serra Fernandes; um de abuso de confiança em coautoria com Ricardo Salgado, e três de fraude fiscal qualificada..O que alega em sua defesa?.No requerimento de abertura de instrução a defesa de Henrique Granadeiro começa por defender que as provas apresentadas pelo Ministério Público foram obtidas de forma ilegal. A equipa liderada pelo advogado Nuno Líbano Monteiro alega que são nulas e que durante a fase de inquérito houve violação dos direitos de defesa pois não terão sido facultados ao arguido todos os factos que lhe diziam respeito..Lembram ainda que os dados bancários obtidos através de uma carta rogatória pelo procurador Rosário Teixeira foram entregues pelas autoridades suíças com a condicionante de não poderem ser utilizados em processos de tributários - o antigo CEO da Portugal Telecom está acusado de, entre outros crimes, três de fraude fiscal qualificada. A defesa frisa que Henrique Granadeiro nunca escondeu que era titular de contas no Banque Pictet (Suíça)..Quanto à acusação de que tinha participado numa estratégia delineada por Ricardo Salgado - acusado na Operação Marquês de um crime de corrupção ativa de titular de cargo político, dois de corrupção ativa, nove de branqueamento de capitais, três de abuso de confiança, três de falsificação de documento e três de fraude fiscal qualificada - para fazer fracassar a Oferta Publica de Aquisição que o Grupo Sonae apresentou em relação à Portugal Telecom em fevereiro de 2006 e que foi recusada numa assembleia geral da PT em março de 2007, Granadeiro alega que a administração da empresa considerava que a Sonae não tinha uma estratégia para a PT e que o preço oferecido era baixo. E que foi isso que levou ao chumbo da OPA..Também garante que nunca se encontrou com José Dirceu, até 2005 o chefe da casa civil do antigo presidente do Brasil Lula da Silva, com o objetivo de mover influências para conseguir apoios com vista a potenciar os investimentos que a Portugal Telecom estaria a pensar fazer no Brasil..Alegando que a equipa do Ministério Público não percebeu o papel de Henrique Granadeiro na PT os advogados pedem que o antigo CEO da PT não seja pronunciado pelos três crimes de fraude fiscal qualificada (prova deve ser declarada nula pois foi obtida, dizem, de forma ilegal); que seja despronunciado pelos crimes de corrupção passiva e branqueamento pois não foi confrontado com todos os factos da acusação..Defendem ainda que como não reúne, na sua opinião, a qualidade de funcionário em funções públicas (definidas no artigo 386 do Código Penal) não pode ser levado a julgamento pelos crimes de corrupção passiva, peculato e branqueamento de capitais..A que pena pode ser condenado?.Para os crimes de que Henrique Granadeiro está acusado o Código Penal prevê penas de prisão de um a oito anos para a corrupção passiva; de seis meses a 12 anos para o branqueamento de capitais; de um a oito anos no que diz respeito à acusação de peculato e até três anos de prisão ou multa no caso da acusação de abuso de confiança. Quanto aos crimes de fraude fiscal qualificada que lhe são imputados o Regime Geral das Infrações Tributárias prevê a possibilidade de ser punido com prisão até três anos ou multa até 365 dias..Quem já foi ouvido pelo juiz Ivo Rosa e o que disse?.Dos 19 arguidos (em 28) que pediram a abertura da fase de instrução, foram ouvidos pelo juiz Ivo Rosa três: Bárbara Vara, Armando Vara e Sofia Fava. .A primeira está acusada de dois crimes de branqueamento de capitais. No depoimento que fez garantiu que nada sabia sobre os movimentos efetuados pelo seu pai numa conta de um banco suíço em seu nome nem sobre a origem desse dinheiro. Já Armando Vara - que está acusado de crimes de branqueamento de capitais (2), corrupção passiva de titular de cargo político (1) e fraude fiscal qualificada (2) - disse ao juiz Ivo Rosa que o milhão de euros referidos pela acusação como sendo uma comissão paga por Vale do Lobo por ter tomado decisões favoráveis a este grupo eram rendimentos provenientes da sua atividade liberal, "como consultor" e que foram auferidos antes de o antigo governante ser nomeado para a administração da CGD. Como já tinha sublinhado na fase de inquérito, Vara defendeu que a filha nada teve que ver com a movimentação do dinheiro depositado na Suíça, e admitiu problemas fiscais. "Ele já assumiu que há um problema fiscal e admite pagar o que tem a pagar em termos de impostos", explicou o advogado..De acordo com o advogado Tiago Rodrigues Bastos, o antigo ministro (entre 1999 e 2000) e administrador da Caixa Geral de Depósitos e Banco Comercial Português, e que agora cumpre em Évora uma pena de cinco anos de prisão devido ao processo Face Oculta, explicou ao juiz Ivo Rosa a origem dos seus rendimentos, nomeadamente o valor de um milhão de euros que foram transferidos para uma conta bancária na Suíça titulada pela filha. E as decisões relacionadas com a concessão de créditos por parte da CGD ao empreendimento de Vale do Lobo - num valor perto de 30 milhões de euros..A terceira pessoa acusada neste processo a apresentar-se no Tribunal Central de Instrução Criminal foi Sofia Fava. A ex-mulher de José Sócrates esteve cerca de três horas a responder às perguntas colocadas pelo juiz Ivo Rosa e terá tido dificuldade em recordar "factos que aconteceram há oito ou nove anos", como explicou o seu advogado Paulo Sá e Cunha..Acusada de um crime de branqueamento de capitais e de outro de falsificação de documentos em coautoria com o ex-governante e Carlos Santos Silva, deixou o tribunal com a convicção de que "está tudo esclarecido há muito tempo, desde a fase anterior" [investigação e inquérito], como frisou o advogado, já que Sofia Fava não prestou declarações..Paulo Sá e Cunha lembrou que este processo "ainda está no início" e que "ainda há muita prova para produzir" e que a estratégia de defesa passa por convencer o juiz a anular toda a acusação por falta de fundamentação, não levar Sofia Fava a julgamento ou decidir-se pela suspensão provisória do processo pois a sua cliente não tem antecedentes criminais e colaborou com as autoridades na fase de inquérito. Além disso, o grau de culpa, "a existir, sempre se deveria ter por leve ou mesmo muito diminuto"..Quem vai ser ouvido a seguir?.Entre 23 e 29 de abril será a vez de o arguido Rui Mão de Ferro, sócio administrador e gerente de diversas empresas de que é proprietário Carlos Santos Silva, prestar declarações no Tribunal Central de Instrução Criminal. Na tarde do dia 23 vai tentar convencer o juiz Ivo Rosa de que a acusação dos crimes de corrupção passiva para ato ilícito em coautoria com o ex-primeiro-ministro José Sócrates, tráfico de influência, fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais não tem fundamento..No despacho do magistrado que dirige a fase de instrução é explicado que Rui Mão de Ferro apresentou como testemunhas o antigo primeiro-ministro José Sócrates e o empresário Carlos Santos Silva. No entanto, ao contrário das outras 11 testemunhas, a inquirições a estes dois arguidos do processo não têm data marcada.