O segredo para acalmar os miúdos e aumentar a concentração? A meditação
Pernas cruzadas, mãos em cima dos joelhos, costas direitas, olhos fechados. Um silêncio pouco comum para uma sala com dez crianças dos seis aos oito anos que só é interrompido pelo som mágico de uma taça tibetana. "Cada um vai perguntar ao seu coração como está hoje. Se está agitado ou calmo, triste ou feliz". A voz doce de Sílvia Fernandes Gomes conduz a sessão de Crisom Meditare, uma técnica de "meditação com som cristalino", que este ano foi introduzida na E.B. 1 de Vigia, no concelho de Vagos, e que também é praticada em outras escolas do distrito de Aveiro.
Quando os olhos se abrem, há sorrisos envergonhados pela presença do DN. "Vamos encher a barriga de ar e deitar o ar para fora". Repetidas vezes. Agora mais "tranquilas e relaxadas", as crianças deitam-se em silêncio, de olhos fechados, com as mãos em cima da barriga. "Vamos abrir os nossos ouvidos e ouvir este som mágico, que vai ajudar o nosso corpo a relaxar". Durante vários minutos, mantêm-se assim: imóveis e em silêncio. "As nossas pernas vão ficar muito relaxadas". Depois a barriga, as costas, as mãos, o coração, a cabeça, os pensamentos. Espreguiçam-se e voltam a sentar-se. Para terminar, o momento mais aguardado: o sino de vento (shanti) passa delicadamente de mão em mão.
De norte a sul do País, há cada vez mais escolas a oferecer aos alunos a possibilidade de praticar meditação, mas o número ainda é residual. Crisom Meditare é uma técnica que foi desenvolvida durante oito anos por Sílvia Gomes, professora com formação em música e investigação na área desta prática. Chegou às escolas no ano passado, mais concretamente à E.B.1 da Glória, em Aveiro, onde já faz parte do currículo, abrangendo atualmente cerca de 200 crianças. Na Vigia, é uma atividade paga e promovida pelo ATL.
Juliana Gonçalves, 10 anos, faz parte da segunda turma que tem sessões de meditação - de 30 minutos cada - à terça-feira na Vigia. "Andava sempre muito nervosa e a minha mãe inscreveu-me para me acalmar", conta ao DN. Quando sai da aula diz que se sente "mais relaxada" e "às vezes" até pratica em casa. Laura Bernardes, 9 anos, também: "Em casa, cruzo as pernas à chinês, fecho os olhos e tento relaxar. Fico menos nervosa, mais serena e tranquila."
Quando questionamos os alunos sobre o que mais gostam, dizem prontamente: fechar os olhos e tocar "os instrumentos da professora". Além da taça de som e do sino, Sílvia costuma levar tambores, maracas e outros instrumentos de percussão. A música, "tendo uma estrutura predefinida", ajuda crianças e adultos a chegar a um estado meditativo "muito mais rápido e intenso, gerando transformações psico-fisiológicas". Aquele som é depois levado para outras situações do dia a dia. "A meditação não faz milagres, mas consegue mudar comportamentos", destaca a formadora.
As crianças têm energia para dar e vender. "Acham que estar quietas é uma seca", pelo que é um grande desafio fazê-las parar. "São o nosso futuro. Se as conseguirmos tranquilizar, vamos mudar a nossa sociedade daqui a 20 ou 30 anos". Sílvia quer "ajudar as crianças a crescer fora do stresse dos pais". A meditação permite-lhes "controlar as emoções para que sintam, ajam e vivam de maneira diferente". Por outro lado, estas práticas "auxiliam a memória e a concentração", o que leva a uma "maior eficácia ao nível da aprendizagem".
Uma prática em crescimento
Ao início da manhã, depois de almoço e ao final da tarde, os alunos do primeiro ciclo de um agrupamento de escolas da Marinha Grande, em Leiria, ficam em silêncio durante 30 segundos a três minutos - consoante a experiência - enquanto praticam mindfulness, a arte da atenção plena. São cerca de 500. O coordenador do projeto, Fernando Emídio, explicou ao DN que este é o quarto ano em que a atividade se realiza no âmbito da "Oferta Complementar, que faz parte do currículo". Mas, além disso, é praticada diariamente. "Temos verificado que há uma melhor gestão de conflitos e uma melhoria da atenção e concentração na sala de aula, uma vez que os alunos conseguem manter o foco nas tarefas durante mais tempo, o que se reflete nos resultados".
Vítor Bertocchini, psicólogo e presidente da Sociedade Portuguesa de Meditação e Bem-Estar, diz ao DN que estas práticas "estão a começar a ser introduzida nas escolas", mas "ainda é residual" o número de instituições que as oferece. O próximo passo, prossegue, "é os professores integrarem a prática regular no seu quotidiano e a sua aplicação nas salas, o que tem um efeito muito mais forte".